Lawrence Summers avisa que declarações de vitória na zona euro “são muito prematuras”

O economista que lançou a ideia de que o Globo atravessa um período de estagnação secular não acredita que a periferia da zona euro esteja já fora de perigo. E antecipa “tensões e desafios substanciais” na Europa durante o resto da década.

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Lawrence Summers, ex-secretário do Tesouro dos EUA, esteve no evento do BCE em Sintra Sérgio Garcia

Não tenham ilusões, avisa Lawrence Summers, a zona euro ainda “vai enfrentar tensões e desafios substanciais durante o resto da década”, sendo perigoso estar agora a fazer “declarações de vitória prematuras” em países da periferia como Portugal.

Presente no Fórum do BCE sobre política monetária que decorreu entre quinta e sábado em Sintra, o economista norte-americano revelou, numa conversa que manteve com quarto jornalistas à margem do evento, estar preocupado com a possibilidade de se começar a pensar que as economias da periferia da zona euro já não precisam de ajudas ao crescimento.

“O grande perigo de períodos de estagnação prolongada são as declarações de vitória prematuras. Vimos isso nos Estados Unidos em 1937, vimos isso no Japão inúmeras vezes ao longo das últimas duas décadas, vimos nos últimos anos várias declarações de que os Estados Unidos já tinham recuperado, sem que isso se tivesse concretizado. E agora, acho que há um risco muito significativo de complacência e declaração prematura de vitória na periferia da Europa. Não me parece que a periferia da zona euro esteja já fora de perigo”, afirma.

O que se deve fazer então? Summers defende que reconhecer que a situação ainda não está resolvida “tem como implicação que as reformas estruturais são importantes e na periferia também tem como implicação que é importante que haja apoio da política macroeconómica da totalidade da zona euro. Por exemplo, definindo que tipos de política orçamental são permitidos ou que caminho é seguido pela política monetária”.

Para o ex-secretário do Tesouro dos Estados Unidos, “não há dúvida que há um problema de escassez de procura e também não há dúvida de que existe espaço de manobra, nomeadamente na Alemanha, para expandir a procura agregada”.

E o facto de haver um problema de procura, também determina quais os tipos de reformas estruturais que podem ser mais adequadas. “São menos questões como as pensões, mas mais barreiras à contratação, ao investimento, ao uso da terra, às entradas de novos actores nos mercados. Algumas mas não todas as reformas estruturais são consistentes com aumentos da procura agregada. E essas áreas em que os aumentos da procura agregada são possíveis devem ser o foco dos esforços de reforma estrutural”.

Apesar de dizer que o problema actual é de escassez da procura, Lawrence Summers não arrisca recomendar uma política orçamental expansionista em todos os países periféricos. “É preciso decidir caso a caso aquilo que se deve fazer. Nos países onde haja dúvidas sérias sobre se a dívida pode ser paga e onde a confiança possa aumentar com um rumo orçamental mais positivo, pode haver argumentos para que se façam ajustamentos no sector público, mas em geral o problema da zona euro é que tem falta e não um excesso de procura, e a austeridade normalmente reduz a procura, não a aumenta”, afirma.

A solução para os desequilíbrios acumulados nas finanças públicas dos países da periferia, diz, está numa combinação “de vários tipos de ajustamento a nível do euro, e vários tipos de ajustamento a nível nacional”. Uma receita geral para a periferia da zona euro, que aplica também a Portugal, país sobre o qual diz não estar familiarizado com a situação.

De qualquer forma, qualquer solução demorará tempo a produzir efeitos completos. “A zona euro vai enfrentar tensões e desafios substanciais durante o resto da década”, prevê.

Summers é um dos mais conhecidos economistas norte-americanos da actualidade. Foi secretário do Tesouro na Administração Clinton, presidente da Universidade de Harvard e há dois anos era dado como o principal favorito para suceder a Ben Bernanke na Reserva Federal, acabando no entanto por ser ultrapassado por Janet Yellen.

Em Fevereiro de 2014 lançou para o debate económico internacional a hipótese do Mundo estar a passar por uma “estagnação secular”, algo que se tornou um dos principais temas de discussão entre os economistas. Summers está cada vez mais convencido de que tem razão e que o Globo se arrisca a passar por um período longo de crescimento baixo, com taxas de juro muito reduzidas.

E apresenta provas: “As taxas de juro reais das obrigações caíram substancialmente e o crescimento tem sido fraco, como se espera no caso de estagnação secular. O facto de termos terminado a expansão quantitativa nos EUA e as taxas de juro terem continuado a cair substancialmente é também uma evidência a favor. Se já se tivesse verificado um crescimento significativo dos juros, tal teria sido uma evidência forte contra a estagnação secular, e isso não aconteceu”, afirma.

Confirmando-se a estagnação secular, isso, para Summers, tem consequências para a política económica que deve ser seguida, por exemplo, na Europa. Um dos casos tem a ver com as regras orçamentais na zona euro. “Quaisquer que sejam os critérios que se considerou serem adequados numa era de altas taxas de juro reais, deve agora ser mais tolerante à dívida num contexto de baixas taxas de juro reais”, afirma.

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