Impacto das reformas estruturais em Portugal não é monitorizado, afirma a Comissão Europeia

Bruxelas volta a defender que há margem para Portugal ir mais longe em áreas como a flexibilização dos salários.

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A União Europeia começou a nascer depois da II Guerra Mundial Reuters

Não é feita em Portugal uma avaliação e monitorização sistemática do impacto económico das reformas estruturais realizadas, afirma a Comissão Europeia, que ainda assim defende que o país deve ir mais longe nas mudanças que já realizou no mercado de trabalho e em sectores como a energia.

No relatório de avaliação ao programa da troika aplicado em Portugal publicado nesta terça-feira, Bruxelas começa por dizer que o Governo adoptou durante os últimos três anos diversas reformas estruturais em áreas muito diversas, como o mercado de trabalho, nas indústrias de rede ou as profissões reguladas.

A Comissão diz que “os primeiros sinais dos efeitos destas reformas são já visíveis”, mas não concretiza como. Pelo contrário, o que diz é que “a falta de uma abordagem sistemática e abrangente na monitorização e avaliação torna difícil aferir o impacto total [que as reformas estruturais tiveram] no funcionamento da economia”.

Ainda assim, seguindo a linha defendida desde há vários anos, a Comissão Europeia arrisca: “Existe um espaço de manobra significativo para mais reformas estruturais em áreas-chave.”

Em particular, a Comissão Europeia continua a defender a realização de novas mudanças no funcionamento do mercado de trabalho, nomeadamente para tornar os salários “mais flexíveis e reactivos às condições da economia e de cada uma das empresas”.

Ao mesmo tempo que pede mais medidas na área laboral, Bruxelas critica as medidas tomadas recentemente pelo Governo português, já depois da saída da troika. Em causa estão a possibilidade de suspender os contratos colectivos por acordo, em situações de crise empresarial, e a flexibilização dos critérios que permitem alargar a todo um sector os efeitos dos contratos colectivos (as chamadas portarias de extensão).

No primeiro caso, os técnicos da CE garantem que a alteração “não contribui para aumentar a capacidade de resposta dos salários às condições económicas ao nível da empresa". No segundo, trata-se de “um grande revés” na reforma que vinha sendo feita pelo Governo e que, de cerca forma, promovia a moderação salarial, porque não permitia que se alargasse a todas as empresas de um mesmo sector as condições salariais e laborais negociadas apenas por algumas.

Bruxelas pede também mais reformas no sector dos transportes, com uma redução de custos nos portes e mais concorrência nos transportes ferroviários e das áreas metropolitanas.

A incerteza do Constitucional

No relatório, a CE não esconde a sua preocupação com as reformas que têm de ser feitas no futuro, nomeadamente na Segurança Social ou na factura salarial do Estado. E aqui, alertam os técnicos, o problema poderá ser o Tribunal Constitucional (TC).

Bruxelas entende que o TC tem baseado o seu raciocínio jurídico em “princípios constitucionais muito gerais”, que podem ser alvo de interpretações diversas, deixando o actual e um futuro governo numa incerteza em relação à sua margem de manobra para tomar medidas de consolidação orçamental.

Numa análise aos acórdãos proferidos ao longo dos últimos três anos, Bruxelas conclui que “as decisões do TC não dão uma orientação clara sobre esse enquadramento”, colocando os decisores políticos numa encruzilhada sobre o caminho a seguir.

A incerteza quanto às decisões futuras será uma constante e um risco com que os governos terão de contar. “O actual e o futuro governos, que terão de garantir a manutenção da consolidação orçamental e do ajustamento estrutural, continuarão a ser confrontados com as incertezas relacionadas com a forma como o Tribunal Constitucional irá interpretar estas margens e os princípios constitucionais que lhes estão subjacentes”, lê-se no documento.

Entre as medidas chumbadas recentemente pelo TC constam os cortes nos salários da função pública acima de 675 euros, definidos no Orçamento do Estado para 2014, e a nova contribuição de sustentabilidade, que implicava um corte definitivo, a partir de 2015. Mas o TC deu também cartão vermelho à convergência das pensões (que implicava cortes definitivos nas reformas pagas pela Caixa Geral de Aposentações) ou aos cortes nos subsídios de férias e de Natal.

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