Estado com mais dívida, holdings da CGD e da TAP obrigadas a cumprir novas regras orçamentais

Inclusão de mais entidades no cálculo das contas públicas fez subir a dívida pública em mais de 6000 milhões de euros. A revisão em simultâneo do PIB em alta impede contudo que o rácio da dívida dispare.

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Das 13 holdings reclassificadas, sete pertencem ao universo da CGD PÚBLICO/Arquivo

E de repente, virtualmente de um dia para o outro, o Estado português passou a ter nas suas contas mais 6000 milhões de euros de dívida. O problema não está na descoberta de algum buraco financeiro escondido ou na falência inesperada de mais um banco. O que aconteceu foi somente uma alteração na metodologia usada pelas autoridades estatísticas no registo das contas públicas. Mas a verdade é que, por causa dessa alteração, mais 268 entidades passaram a estar incluídas no universo das Administrações Públicas, com consequências imediatas no valor da dívida pública oficial e nas regras de reporte de informação que têm de ser cumpridas pelas entidades visadas.

As mudanças já há muito que vinham sendo antecipadas, não constituindo surpresa a inclusão de empresas como a CP, pelo facto de não cobrir com as suas receitas próprias mais de 50% dos custos operacionais. A dívida da CP passa agora a ser registada como dívida pública. No entanto, a novidade agora conhecida foi a inclusão das holdings - grupos que servem de chapéu a um universo de empresas­ - da TAP, da Caixa Geral de Depósitos e do BPN na lista das entidades que passam a contar para o cálculo da dívida e do défice.

O INE levou em conta a nova regra que obriga a incluir nas contas do défice e da dívida as holdings detidas por entidades públicas com um reduzido número de pessoas ao serviço e que não tenham actividades de gestão corrente das subsidiárias.

No que diz respeito ao banco público são reclassificadas sete entidades: a Caixa-Gestão de Activos SGPS (que agrega as empresas gestoras de fundos de investimento Caixagest, CGD Pensões e Fundger), a Caixa Desenvolvimento SGPS (vocacionada para o parqueamento de participações de carácter estratégico) e a Caixa Seguros e Saúde SGPS (dedicada ao sector segurador e dona de 20% da Fidelidade). As restantes quatro são a Gerbanca (que opera na área do venture capital), a Parbanca (gestora de participações instalada na Zona Franca da Madeira), a Parcaixa (cujo capital é repartido pela CGD e pela Parpública, com 49%) e, finalmente, a Wolfpart, holding para o sector imobiliário.

Há ainda duas holdings do BPN que passam a estar abrangidas nas contas públicas: a Parparticipadas e a BPN – Participações Financeiras. A primeira, uma das entidades criadas para ligar com os activos problemáticos do BPN que ficaram nas mãos do Estado (para tentar recuperar parte do dinheiro perdido com a nacionalização), engloba o Banco Efisa, que tarda em ser vendido. Em 2013, esta instituição tinha capitais próprios negativos em 36,3 milhões de euros. Nesse ano, segundo o relatório e contas, teve um prejuízo de 7,8 milhões de euros.

Não foi dada informação sobre o impacto da dívida decorrente da inclusão destas holdings. Para o total das 268 entidades reclassificadas o impacto foi um agravamento de 6076,5 milhões de euros em 2013.

Mas para além deste efeito numérico, a alteração muda também a forma como as empresas têm de actuar. Como explicou esta terça-feira em conferência de imprensa o secretário de Estado do Orçamento, as entidades reclassificadas ficam obrigadas a cumprir regras de apresentação de informação e de pedidos de autorização de despesa iguais às das outras entidades públicas, tal como está previsto na Lei de Enquadramento Orçamental.

O PÚBLICO sabe que a reclassificação das holdings da CGD e da TAP causou mal-estar nestas empresas, que contestam a decisão. Aliás, as duas enviaram a sua posição ao INE quando se aperceberam que a inclusão estava iminente, na qual expunham argumentos para que tal não se concretizasse.

Além de considerarem que não faz sentido reclassificar as holdings quando as empresas se mantêm fora da esfera do Estado, entendem que esta transferência pode ter implicações negativas na sua actividade. A reclassificação obriga as entidades a cumprirem um conjunto de novas regras, sujeitando-as a autorizações do Ministério das Finanças quando ocorre, por exemplo, uma alteração ao orçamento ou uma despesa extraordinária.

Além disso, passam a estar obrigadas a usar a contabilidade seguida na administração pública, quando, até aqui, se regiam pelas regras das empresas privadas. Tanto a CGD como a TAP pretendem continuar a batalhar para inverter esta situação.

Dívida de 2014
Se a dívida pública se agrava em termos absolutos, em percentagem do PIB ou cresce de forma moderada ou regista mesmo uma descida. Entre 2010 e 2012, o rácio da dívida aumenta ligeiramente, mas em 2013 baixa de um valor de 128,9% com as regras antigas para 128% com as novas regras.

Em 2014, apesar de um aumento muito significativo do valor da dívida em termos absolutos, em percentagem do PIB a subida é de apenas um ponto percentual face ao que estava previsto em Março.

Isto acontece porque as alterações metodológicas provocadas pelo novo sistema europeu de contas também conduziram a uma subida do valor do PIB.

Em relação a 2014, o agravamento da dívida pública prevista pelo Governo face aos valores reportados em Março ao Eurostat não parece ser contudo explicada apenas pelas mudanças metodológicas. A dívida chegará aos 224.148 milhões de euros, mais 8919 milhões do que era antes previsto.

O Governo não revelou esta terça-feira quanto é que deste valor se deve à inclusão de mais empresas no universo das Administrações Públicas. No entanto, tendo em conta que esse impacto em 2013 foi de 6076,4 milhões de euros e, assumindo que não se registou um agravamento muito grave da dívida das entidades reclassificadas, chega-se à conclusão que há outras razões para o aumento previsto no indicador. Face ao orçamento rectificativo, há contudo uma revisão em baixa da dívida em percentagem do PIB de 130,9% para 127,8%, explicada pela revisão em alta do valor do PIB.

Em termos de défice, o INE calcula um impacto negativo de 787,3 milhões de euros em 2013, mas este efeito acaba por ser compensado pelos reflexos positivos de outras alterações metodológicas, como a transferência de fundos de pensões e a redução dos encargos com swaps (derivados de cobertura de risco da variação das taxas de juro associadas aos empréstimos).

Já em 2011 e 2012, o impacto é positivo porque, com a reclassificação, há operações financeiras feitas no passado que deixam de ser contabilizadas, como, por exemplo, o aumento de capital de 750 milhões de euros que a Parpública realizou junto da participada Sagestamo, que tem vindo a absorver património público.

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