Há margem para cobrir desvios na receita e na despesa, insiste a UTAO

Governo tem margem para cumprir execução do orçamento. Mas perspectiva de redução do défice do ponto de vista estrutural é “adversa”.

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O Governo prevê um crédito fiscal da sobretaxa de IRS seja de 9,7%, caso o crescimento da receita se mantenha Daniel Rocha

Apesar dos desvios na receita e na despesa nos nove primeiros meses do ano, o Orçamento do Estado continua a ter margem suficiente para acomodar a derrapagem na execução orçamental, calcula a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), mantendo a projecção feita há um mês.

Numa análise aos dados da execução orçamental até Setembro, a que o PÚBLICO teve acesso, os técnicos que prestam apoio aos deputados em matéria orçamental sublinham que houve um “aumento da receita e uma estabilização da despesa”, embora nos dois casos se registem “desvios face ao orçamentado para o conjunto do ano”.

Do lado da receita, o desempenho abaixo do esperado está condicionado pelo “contributo desfavorável das contribuições sociais e da receita de capital”. Já do lado da despesa, a compra de bens e serviços contrasta com “a redução prevista para o total do ano”, ao mesmo tempo em que a redução da despesa com pessoal está abaixo do previsto, o que só em parte foi compensado por uma “menor execução das despesas de investimento”.

O défice acumulado até Setembro pelo universo das administrações públicas – de 3070 milhões de euros, em termos não ajustados – continua, ainda assim, abaixo do registado no mesmo período de 2014. As almofadas previstas pelo primeiro Governo de Pedro Passos Coelho (uma dotação provisional e a reserva orçamental) permitem, segundo a UTAO, “acomodar alguns dos desvios”.

Esta já era a perspectiva da UTAO face aos números conhecidos até Agosto, previsão que a unidade técnica da Assembleia da República mantém depois de divulgado mais um mês de execução do orçamento.

“Adversa” é a perspectiva em relação à redução ao défice do ponto de vista estrutural (quando se deixa de fora o efeito das medidas extraordinárias e se mede o saldo orçamental ajustando-o do ciclo económico, como se ele ocorresse numa fase económica neutra). A execução orçamental também “corre o risco de vir a revelar-se insuficiente”.

Tendo em conta que há um contexto em que “se regista uma evolução favorável do ciclo económico, com o PIB a aproximar-se do seu potencial, e em que se verifica a dificuldade em conter parte da despesa corrente primária”, a perspectiva de correcção do défice estrutural torna-se “adversa”, tanto este ano como em 2016. Se assim for, lembra a UTAO, a evolução do défice estrutural estará “em divergência com as recomendações da Comissão Europeia”.

São precisos mais 660 milhões na receita
Ainda sobre a execução orçamental até Setembro, a UTAO sublinha que a receita arrecada pelo Estado com os impostos abrandou em Setembro e, apesar de ser superior ao valor arrecadado nos nove primeiros meses de 2014, a taxa de crescimento continua “ligeiramente aquém” do projectado para este ano. A UTAO chega a esta conclusão fazendo um ajustamento da receita tendo em conta a “evolução assimétrica dos reembolsos dos impostos indirectos”, já que, sem isso, os números divulgados pela Direcção-Geral do Orçamento mostram que a receita está a crescer acima do previsto.

De acordo com a análise da UTAO, para que o objectivo da receita fiscal seja atingido é preciso que a receita cresça 5,9% no último trimestre do ano, “o equivalente a mais cerca de 660 milhões de euros que o total de receita obtida no mesmo trimestre de 2014”. O esforço exigido contrasta com o crescimento de 3,8% verificado até Setembro (considerando a evolução ajustada do efeito dos reembolsos dos impostos indirectos).

A UTAO faz questão de sublinhar que o eventual reembolso, em 2016, de uma parte da sobretaxa de IRS paga ao longo deste ano só depende do crescimento das receitas de IRS e IVA “e não do crescimento da receita fiscal da administração pública como um todo”.

“Ainda que não seja atingido o objectivo para a receita fiscal total, o crédito fiscal da sobretaxa de IRS poderá vir a ocorrer em 2016”, caso a evolução da receita continue acima do previsto (até Setembro a cobrança dos dois impostos cresceu 4%, acima dos 3,7% previstos para o conjunto do ano).

De Agosto para Setembro, a previsão do reembolso da sobretaxa baixou de forma significativa, por causa da queda das receitas do IRS. Enquanto até Agosto o Governo acenava com a possibilidade de reembolsar os contribuintes no próximo ano com 35,3% da sobretaxa paga ao longo deste ano, depois de serem divulgados a execução orçamental de Setembro, a previsão caiu para 9,7%.

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