Governo volta a falhar prazo para revelar quem recebeu benefícios fiscais de IRC

É a terceira vez que o executivo viola a data prevista na lei. Observatório lamenta falta de transparência para um Governo que diz que quer combater a fraude.

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Maria Luís Albuquerque com o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio Daniel Rocha

O Ministério das Finanças está obrigado a divulgar até 30 de Setembro de cada ano a lista dos contribuintes que recebem benefícios fiscais em sede de IRC. Já passaram mais de 20 dias da data-limite, mas o nome dos beneficiários (relativos ao ano de 2013) continuava por revelar até ao meio dia desta quinta-feira.

É a terceira vez que o actual Governo falha o prazo inscrito na Lei do Orçamento do Estado. O Observatório de Economia e Gestão de Fraude (OBEGEF) veio denunciar o facto de a lista ainda não ter sido publicada. À ministra das Finanças, o observatório associado à Faculdade de Economia da Universidade do Porto pediu esclarecimentos a 15 de Outubro, tendo esta quinta-feira vindo alertar para a falta de transparência.

“A publicação desta lista deveria ter ocorrido até 30 de Setembro de 2014, mas tal não aconteceu até à presente data”, denuncia o observatório, considerando que o mesmo Governo que diz estar a combater a fraude e a evasão fiscais não pode deixar de cumprir as regras de transparência em matéria fiscal a que está obrigado por lei.

“O OBEGEF considera que a transparência fiscal é um instrumento fundamental na Democracia. É um direito dos contribuintes, eleitores e cidadãos. Mas a transparência fiscal neste domínio preciso é também um dever do Estado, previsto no art.º 120.º da Lei do Orçamento do Estado para 2011”, que veio introduzir um aditamento ao Estatuto dos Benefícios Fiscais em que o ministério fica obrigado a divulgar estes dados.

Na lista em causa estão incluídas, por exemplo, “as empresas com benefícios contratuais ao investimento, as empresas instaladas na Zona Franca da Madeira, as empresas com benefícios à criação de emprego, as empresas com taxas reduzidas de IRC para a interioridade, as empresas com incentivos à investigação e desenvolvimento, as cooperativas com taxa reduzida de IRC, as instituições de ensino particular com taxa reduzida de IRC e as empresas com benefícios de ISV”, lembra o observatório presidido por Carlos José Gomes Pimenta, professor da Faculdade de Economia do Porto.

O OBEGEF aponta para uma contradição no discurso do executivo: “O Governo, que, em nome da austeridade, tem aumentado fortemente a carga fiscal sobre os cidadãos nos últimos anos e que tem garantido que será implacável no combate à fraude e evasão fiscais, não pode continuar a não cumprir uma das regras de transparência previstas no próprio Orçamento do Estado”.

“Não sabemos, por exemplo, como deveríamos ter sabido até 30 de Setembro, o montante que as empresas instaladas na Zona Franca da Madeira têm poupado com o regime de bonificação fiscal, que na prática, constitui uma discricionariedade para com os restantes contribuintes que exemplarmente pagam os seus impostos. Não sabemos mas, de acordo com a Lei do Orçamento do Estado, deveríamos saber, já que são os impostos dos cidadãos individuais e das restantes entidades que financiam estes benefícios”.

Depois do alerta dado pelo OBEGEF, o PÚBLICO aguarda esclarecimentos do Ministério das Finanças sobre o atraso e sobre a data em que prevê divulgar esta lista.

Na semana passada, o Tribunal de Contas (TdC) voltou a chamar a atenção para o facto de o Governo ter omitido 1045 milhões de euros de benefícios fiscais atribuídos em sede de IRS a sociedades gestoras de participações sociais (SGPS), um montante que é mais do dobro da despesa fiscal que fora divulgada na Conta Geral do Estado (CGE) de 2012.

A prática foi corrigida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, que justificou a omissão com “razões de comparabilidade” dos números. Os argumentos apresentados pela administração fiscal foram rejeitados pela entidade fiscalizadora, que considerou que a Conta Geral do Estado teria de conter todos os elementos “adequados a uma prestação clara e completa das contas públicas”, tal como se prevê na Lei de Enquadramento Orçamental (LEO).

Economia paralela continua a crescer
Até ao final do ano, o OBEGEF divulgará o índice da economia não registada, também designada por economia paralela, relativo ao ano de 2013, e que vai manter a trajectória de subida dos anos anteriores. Recorde-se que, em 2012, o índice subiu 1,25 pontos percentuais, para 26,74% do produto interno bruto (PIB), um recorde da série iniciada em 2008, mas recalculada até 1970.

Em termos absolutos, o aumento da economia paralela ascendeu a 44,1 milhões de euros, em 2012. A forte subida da produção não declarada é explicada pelo aumento da carga fiscal e da taxa de desemprego, mas também pela falha no combate à grande evasão fiscal.

O impacto do programa de e-factura, apesar de incidir sobre os sectores de maior fuga fiscal, como o comércio e serviços, ainda não será visível no índice, uma vez que reportará a 2013.

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