Corte nas pensões de sobrevivência só atingirá quem acumula com outras pensões

Governo garante que a medida visa sobretudo quem tem rendimentos mais elevados e que o objectivo é poupar 100 milhões de euros.

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O número de beneficiários tem vindo a aumentar nos anos mais recentes Paulo Pimenta

A redução nas pensões de sobrevivência que o Governo está a preparar vai afectar apenas as situações em que há acumulação de pensões com esta prestação. A garantia foi dada no domingo à noite pelo ministro do Emprego e da Segurança Social, Pedro Mota Soares, em declarações à SIC.

A partir do próximo ano, alguns dos 800 mil beneficiários de pensões de sobrevivência verão a prestação reduzir-se. O corte será progressivo, vai atingir, sobretudo, quem tem rendimentos mais elevados e haverá um patamar mínimo que ficará salvaguardado. A medida, avançada pela TSF e confirmada pelo Governo, foi um balde de água fria para os partidos da oposição e para as associações de reformados, depois de o vice-primeiro-ministro, Paulo Portas, ter garantido o afastamento da taxa social única (TSU) sobre todas as pensões.

“Só estamos a falar de situações em que há uma acumulação de pensões. Em que as pessoas recebem duas pensões”, garantiu o ministro.

“Hoje o que acontece é que a segunda pensão é atribuída de forma automática. O que o Governo está a discutir é olhar para o rendimento da primeira pensão e ponderar se faz sentido, nomeadamente nos casos em que as pensões têm pensões elevadas, e que recebem também uma pensão [de sobrevivência] elevada”, precisou Mota Soares.

A redução incidirá sobre as pensões de sobrevivência pagas pelo regime geral da Segurança Social e pela Caixa Geral de Aposentações (CGA) e tem como objectivo poupar 100 milhões de euros na despesa do Estado, um valor que, segundo o ministro, representa 3,5% do valor total das pensões de sobrevivência.

Fonte governamental lembrou que a pensão de sobrevivência “é atribuída automaticamente, independentemente, de qualquer condição de recursos”. E dá um exemplo extremo: “Uma pessoa que receba hoje uma pensão de 5000 euros pode somar a essa pensão o valor de uma pensão de sobrevivência, sem qualquer limite e sem qualquer condição de recursos”.

O PÚBLICO confirmou junto de várias fontes de Governo que o corte será retroactivo e, além das pensões futuras, irá atingir as pensões de sobrevivência que já estão a ser atribuídas. Haverá também, a salvaguarda de um valor mínimo abaixo do qual não haverá qualquer corte. Mas o valor em concreto ainda está em aberto, uma vez que depende da forma como será aplicada a chamada “condição de recursos” e os rendimentos a considerar. O ministro Pedro Mota Soares também não adiantou o valor mínimo em causa, remetendo o desenho da medida para o Orçamento do Estado para 2014.

A TSF avança que o sistema será automático e que o Estado vai somar a pensão de reforma a de sobrevivência, e definir um valor a partir do qual a segunda pensão será diminuída. Um regime muito diferente da condição de recursos exigida para a atribuição de outras prestações sociais como o rendimento social de inserção, que conta com os rendimentos do trabalho e de capital, incluindo bens como veículos, entre outros. No caso da redução da pensão de sobrevivência, ainda não é certo quais os rendimentos a considerar, se apenas o rendimento de outras pensões, se também serão considerados rendimentos de trabalho, capital e bens.

Corte não afectará todos os pensionistas
Ao todo, o universo de pensionistas que actualmente está a receber pensão de sobrevivência ultrapassa os 800 mil e as despesas do Estado ascendem a 2700 milhões de euros. Mas como o corte será progressivo e terá em conta os rendimentos não afectará a totalidade do universo. O PÚBLICO tentou confirmar junto do Ministério da Segurança Social quantos dos actuais pensionistas serão afectados, mas não foi possível obter resposta.

Porém, nas declarações à SIC, Pedro Mota Soares deixou claro que a medida deixará de fora ”a grande maioria” dos beneficiários que recebem pensões pelo regime geral da Segurança Social

No caso da CGA, em causa estarão perto de 132 mil pessoas que em 2012 estavam a receber este tipo de pensão, que tem com objectivo compensar os familiares (cônjuge, filhos e, em alguns casos, ascendentes) da perda de rendimento resultante da morte do titular de uma pensão de velhice. A maior parte, 65%, recebe até 500 euros por mês e a pensão média era de 451,57 euros.

Já no regime geral da Segurança Social, a base de dados da Pordata dá conta de 713.340 beneficiários no ano passado e de uma pensão média de 178 euros mensais.

A média do valor pago em pensões de sobrevivência dos dois universos juntos (Caixa Geral de Aposentações e Segurança Social) é de cerca de 216 euros, adiantou fonte governamental. Adianta ainda que, por ano, são pagos cerca de 50 milhões de euros de pensões de sobrevivência de valor superior a 2000 euros.

Tanto num caso como no outro, o número de beneficiários tem vindo a aumentar nos anos mais recentes. A pensão de sobrevivência é uma prestação em dinheiro atribuída aos familiares para os compensar da perda de rendimentos de trabalho resultante da morte do beneficiário de pensões da CGA ou da Segurança Social. Podem beneficiar desta prestação os cônjuges, filhos e, em alguns casos os pais do beneficiário que morreu. O valor da pensão pode chegar a 70% do valor da pensão do beneficiário que morreu e no caso do cônjuge com mais de 35 anos não tem limite de tempo. Já no caso dos filhos terá como limite os 18 anos ou os 27, caso se prove que está a frequentar mestrado.

Desde Janeiro de 2013, a pensões de sobrevivência acima de 1350 euros já estão a sofrer um corte entre 3,5% e 10% por via da contribuição extraordinária de solidariedade (CES).

A oposição exigiu explicações do Governo. Pedro Marques, deputado do PS e ex-secretário de Estado da Segurança Social, considera a medida “inaceitável” e “de enorme indignidade”. “Há uma necessidade de explicação por parte do Governo, porque o primeiro-ministro nada referiu sobre esta matéria no debate quinzenal e o vice primeiro-ministro, na conferência de imprensa da passada quinta-feira, até disse que não havia novas medidas de austeridade e falou no fim da TSU dos pensionistas”, disse à Lusa.

Por seu lado, o PCP, citado pela TSF, diz que a perseguição aos reformados continua para além da morte e que nem no luto os pensionistas estão a salvo. Já Mariana Aiveca, do BE, reitera que os cortes são inaceitáveis e só vão parar se a contestação for levada para a rua.

Notícia actualizada às 12h30: inclui declarações do ministro do Emprego e da Segurança Social, Pedro Mota Soares.

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