Governo obrigado a recuar na recondução de gestores do supervisor da aviação

Estatutos da ANAC já não permitem que administração seja reconduzida, embora esta mantenha a mesma pretensão. Presidente ainda em funções e chefias processam regulador para receberem isenção de horário.

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Secretário de Estado tinha confirmado, em Novembro, que iria haver excepção Vasco Neves

O Governo deixou cair a excepção que tinha decidido dar aos administradores do regulador da aviação para que pudessem ser reconduzidos no cargo. A decisão do Ministério da Economia foi tomada depois de um esclarecimento da Presidência do Conselho de Ministros (PCM) ter concluído que não havia fundamento para a excepção, que contrariava a lei-quadro dos supervisores. Mas a equipa de gestão da Autoridade Nacional de Aviação Civil (ANAC) ainda não desistiu de ser renomeada – uma pretensão que nunca escondeu.

O PÚBLICO apurou que os estatutos da ANAC aprovados em Conselho de Ministros a 23 de Dezembro já não incluem a possibilidade de a actual administração ser novamente designada. A manter-se esta opção, seria caso único de entre os nove reguladores que tiveram de se adaptar à lei-quadro que o Governo criou em Agosto de 2013. Mas, dentro do executivo, a decisão não era consensual.

Já desde há vários meses que o Ministério da Economia defendia que a ANAC fosse isentada das regras da lei-quadro, no que diz respeito à proibição de renovação de mandatos dos gestores. O secretário de Estado dos Transportes chegou a afirmar em Novembro que essa excepção iria estar plasmada nos estatutos. Na altura, Sérgio Monteiro justificou a decisão com o facto de ser um “regulador diferente, com competências e uma estrutura de financiamento diferente”.

A dúvida que permanecia era se a ANAC poderia ser considerada um caso excepcional, visto que foi sujeita a uma reestruturação, passando de instituto público de regime especial para entidade reguladora. Mas o Ministério da Economia já não usou essa justificação para a Autoridade da Mobilidade e dos Transportes, à qual sucedeu precisamente o mesmo. O que a tutela argumentava ainda, porém, era o reforço de competências do regulador da aviação.

No entanto, a PCM não teve o mesmo entendimento e, num esclarecimento sobre o tema, considerou que a possibilidade de recondução estava vedada pela lei-quadro. Uma interpretação que fez com que a excepção caísse, ao contrário do que pretendia a actual administração da ANAC.

Mas a equipa de gestão, liderada por Luís Trindade dos Santos, ainda não desistiu desta pretensão. O mandato do conselho terminou em Novembro e, se os estatutos forem respeitados, terão de ser nomeados novos responsáveis por seis anos. Porém, o diploma ainda não foi publicado em Diário da República. Só nessa altura se confirmará se houve realmente um recuo na excepção.

Uma das pessoas que está na administração é uma antiga técnica do Ministério da Economia, Lígia Fonseca, que foi nomeada em Agosto sem parecer prévio da Comissão de Recrutamento e Selecção para a Administração Pública. A escolha foi polémica, mas o Governo argumentou que não era obrigado a pedir a avaliação da comissão porque ainda estava em causa um instituto e não um regulador. A justificação foi contestada, porém, pela entidade liderada por João Bilhim.

À semelhança da ANAC, também falta ainda publicar em Diário da República os estatutos da Autoridade Nacional de Comunicações. Os diplomas dos restantes sete reguladores abrangidos pela lei-quadro já foram oficializados. Tal como o PÚBLICO noticiou na segunda-feira, no caso da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, foi concedida uma excepção pelo Ministério das Finanças, que permitiu que os salários dos administradores fossem equiparados ao Banco de Portugal (ao qual a lei-quadro não é aplicada).

Presidente processa ANAC
O actual presidente da ANAC processou o regulador em 2012, por causa do não pagamento da Isenção de Horário de Trabalho (IHT). O processo, interposto ainda contra o anterior Instituto da Aviação Civil, tem um valor associado superior a 37.500 euros, não tendo sido possível confirmar se já houve sentença e se foi favorável a Luís Trindade dos Santos. A acção diz respeito ao período em que foi director da entidade, embora tenha sido nomeado pelo actual Governo em Novembro de 2011.

O processo faz parte de uma extensa lista movida por actuais e antigos trabalhadores com cargos de chefia. Num relatório financeiro a que o PÚBLICO teve acesso, contabiliza-se quase 30 acções do mesmo tipo, havendo casos em que o valor reclamado supera os 100 mil euros. A comissão de trabalhadores do supervisor explicou que “houve chefias que tiveram de recorrer para tribunal para receberem valores relativos à IHT, que não tinham sido pagos”, acrescentando que estes casos remontam “a 2004 e 2005”.

O regime da IHT, que tem de basear-se num acordo escrito e acontece em algumas situações específicas, prevê que os trabalhadores sejam recompensados financeiramente pela não sujeição ao horário normal de trabalho ou pelo alargamento das horas de serviço.

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