FMI antecipa recaída da economia a seguir a 2015

Desiludidos com as reformas estruturais implementadas até agora no país, técnicos do Fundo dizem que depois da ajuda do BCE este ano, a economia pode voltar a revelar o seu baixo potencial.

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Subir Lall (ao centro) é o representante do FMI.
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Subir Lall (ao centro) é o chefe de missão do FMI em Portugal Rui Gaudêncio

Ao contrário do que tinha feito em Janeiro, quando publicou o primeiro relatório de avaliação de Portugal depois do fim do programa da troika, o Fundo Monetário Internacional (FMI) desta vez fez um esforço para ser moderado nas palavras: não repetiu que o Governo tinha deixado de se esforçar a seguir à saída da troika, nem previu que as eleições irão travar ainda mais o ímpeto reformista do Executivo. No entanto, para compensar, na hora de deixar recados às autoridades portuguesas, o Fundo decidiu falar com os números .

Para mostrar de forma clara que está preocupado com a falta de medidas para aumentar o potencial de crescimento da economia, o FMI reviu em baixa as suas previsões de crescimento de médio prazo para Portugal, que tinham sido apresentadas pela última vez há pouco mais de dois meses atrás, em Janeiro, e antecipa agora que, depois de um pico de crescimento já este ano, a economia portuguesa volte a abrandar nos anos seguintes.

Da avaliação avaliação feita a Portugal durante as últimas duas semanas ao abrigo do artigo 4º da instituição, o Fundo saiu com uma previsão de crescimento de 1,5% em 2015, mais do que os 1,2% que esperava no início do ano quando apresentou o relatório de avaliação pós-programa da troika.

No entanto, em sentido contrário, as previsões de crescimento económico em 2018 e 2019, que estavam situadas em 1,6% para os dois anos, caíram agora para valores próximos de 1,25%. Isto é dito na declaração final da avaliação publicada esta terça-feira e consta da apresentação feita no mesmo dia pelo chefe da missão do FMI em Portugal na Ordem dos Economistas em Lisboa.

A explicação de Subir Lall para este maior pessimismo em relação ao médio prazo está no que diz serem os reduzidos sinais de que as reformas estruturais já postas em prática sejam suficientes para aumentar o potencial de crescimento da economia. "Melhorámos as nossas previsões para 2015 e 2016, mas isto é conjuntural. Para o futuro baixámos as previsões, porque aí o que interessa é o potencial de crescimento da economia e o que é importante é fazer as reformas estruturais", afirmou.

Na declaração feita pelo FMI no final da avaliação a Portugal, a principal mensagem deixada aos responsáveis políticos portugueses foi a de que Portugal deve aproveitar a janela de oportunidade que está a ser oferecida pelas medidas tomadas pelo Banco Central Europeu (BCE) e pela descida dos preços do petróleo para realizar as reformas estruturais de que o país precisa para se tornar mais competitivo e reduzir o desemprego.

A declaração, com três páginas, é mais suave do que os últimos relatórios publicados pelo FMI em relação ao que o Governo tem feito desde a saída datroika. Não é dito explicitamente que se assistiu a um abrandamento do esforço de reformas, nem se faz referência ao impacto que o ciclo eleitoral pode estar a ter na vontade do Governo em adoptar mais medidas com custos de curto prazo, dois comentários que mereceram uma reacção muito negativa do Executivo português no passado mês de Janeiro.

O que o FMI faz é tentar incentivar as autoridades portuguesas a actuar rapidamente dizendo que dificilmente se encontrará melhor momento para o fazer do que agora. “Uma confluência de factores externos positivos – uma taxa de câmbio mais favorável do euro, um ambiente de política monetária altamente acomodatício e a descida dos preços do petróleo – proporciona uma excelente janela de oportunidade para a realização de tais reformas”, afirma Subir Lall, o chefe da missão do FMI a Portugal.

Elogiando o esforço feito durante o programa da troika (que o FMI ajudou a desenhar), defende-se que agora “será preciso rever as reformas que não produziram os resultados almejados, concluir a execução das reformas já iniciadas e abordar os constrangimentos remanescentes por meio de reformas complementares”.

Que reformas estruturais?
As áreas para as quais o FMI pede um renovado esforço de reforma não constituem surpresas. O mercado de trabalho volta a estar em foco, pedindo-se  “novas ideias e iniciativas”, embora sem se “recorrer a políticas que prejudiquem a criação de empregos”. O aumento do salário mínimo continua a ser considerado como um potencial factor negativo para a criação de empregos.

O FMI continua a repetir as críticas ao Governo por não terem ainda sido adoptadas todas as medidas relativas à redução dos custos da energia e dos custos das infra-estruturas de transportes (especialmente nos portos). E mostra já alguma resignação em relação aos resultados finais nestas áreas. “Embora seja difícil reverter totalmente os custos legados de erros de políticas do passado em áreas como energia e infra-estruturas rodoviárias, será especialmente importante evitar derrapagens nas reformas nessas áreas”, afirma o documento.

Outra área a que o fundo volta a dar muita importância é a do endividamento das empresas, com o FMI a alertar que as medidas já tomadas pelo Governo não resolveram alguns dos problemas mais importantes (ver texto ao lado).

Como é hábito, um documento do FMI em relação a Portugal não podia acabar sem um apelo à consolidação orçamental. A regra que os técnicos do fundo querem ver cumprida é a da realização todos os anos de um ajustamento estrutural primário de pelo menos 0,5% do PIB. E para que tal aconteça, serão precisos “novos esforços assentes nas reformas estruturais nos regimes de salários e pensões”.

Subir Lall, na sua intervenção na Ordem dos Economistas, apesar de apresentar de apresentar previsões de crescimento a médio prazo que pouco ultrapassam 1%, tento manter algum optimismo no discurso, dizendo que as projecções podem melhorar caso surjam os sinais de um esforço continuado de reforma. "As reformas têm de passar a fazer parte do estilo de vida português. É um processo contínuo", disse, preferindo não falar no impacto que as eleições podem vir a ter nesse esforço. "Independentemente do ciclo eleitoral, as reformas têm de continuar. Isto é um  debate que não é apenas político, mas também social", disse Subir Lall.

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