Fiscalidade verde vai ser paga pelos automobilistas

Aumento dos combustíveis e do ISV representam três quartos das receitas da nova tributação ambiental.

Foto
Nos primeiros oito meses do ano foram vendidos em Portugal 146928 automóveis. Manuel Roberto

A maior parte da factura da reforma da fiscalidade verde vai ser paga por quem tem e conduz um automóvel. Cerca de três quartos dos 166 milhões de euros de novas receitas previstas no projecto de lei da fiscalidade verde aprovado esta quinta-feira em Conselho de Ministros resultam de duas medidas – a taxa de carbono e um aumento no Imposto sobre Veículos – com impacto directo sobre o sector automóvel.

O resto da receita será assegurada sobretudo por uma taxa de oito cêntimos sobre os sacos de plástico para compras.

Os ministérios das Finanças e do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia levaram para o Conselho de Ministros um projecto de lei que mantinha a maior parte das 59 medidas propostas pela comissão para a reforma da fiscalidade verde, nomeada em Fevereiro e que apresentou o seu relatório final há um mês. Mas alguns pontos já tinham sido eliminados previamente.

O texto já não tinha a ideia de um imposto de três euros sobre as viagens aéreas dentro de Portugal e de 15 euros para viagens para fora da Europa. De acordo com o ministro do Ambiente, Jorge Moreira da Silva, entendeu-se que seria melhor esperar pelas negociações internacionais sobre as emissões dos aviões que estão em curso no âmbito da Organização Internacional para a Aviação Civil e que deverão estar concluídas em 2016. “Deixei cair esta ideia há já algumas semanas”, disse o ministro ao PÚBLICO.

Sem a taxa dos aviões, a nova tributação ambiental perdeu 33 milhões de euros. Em compensação, o Governo reviu em alta o montante que poderá ser arrecadado com a taxa sobre os sacos de plástico – de 34,4 milhões para 40 milhões de euros. Serão os estabelecimentos comerciais, como as grandes superfícies, quem pagará o imposto ao Estado. Mas o valor deverá necessariamente repercutir sobre o consumidor final, sob a forma de preço. Ou seja, o saco será vendido e, por isto, sujeito a IVA. Na prática, cada saco sairá por cerca de dez cêntimos.

“Esperamos que tal como aconteceu na Irlanda, haja uma redução no consumo de sacos de plástico logo no primeiro ano”, disse Moreira da Silva, na apresentação dos projectos da fiscalidade verde e do IRS, em Lisboa.

O imposto – que na proposta que foi a Conselho de Ministros é apresentada como uma “contribuição” – é vivamente contestado pela indústria. “Não é mais do que uma imposição de eventual ‘fecho’ das empresas envolvidas, desde as empresas que comercializam as matérias-primas, às indústrias que fabricam os sacos, às empresas que os comercializam, às superfícies comerciais que os utilizam, às unidades de recolha e selecção de resíduos plásticos e aos organismos que reciclam esses resíduos”, argumenta a Associação Portuguesa da Indústria de Plásticos, num comunicado divulgado quarta-feira.

O ministro do Ambiente entende que não e diz que a indústria poderá beneficiar da comercialização de outros produtos com mais valor, como sacos reutilizáveis.

Se a taxa de facto levar ao desaparecimento da maior parte dos sacos, também a receita minguará. Com isso, as medidas relacionadas com os automóveis, que no projecto de lei já são preponderantes, a prazo serão as únicas com forte impacto na receita da nova fiscalidade verde.

A medida mais importante da reforma é uma taxa sobre o carbono, sob a forma de um adicional sobre o Imposto sobre Produtos Petrolíferos e Energéticos, o ISP. O valor estará indexado ao preço do CO2 no mercado europeu de licenças de emissões – que hoje é baixo, em torno dos cinco euros por tonelada.

Estima-se que no primeiro ano, a medida gere 95 milhões de euros de receitas. Se o preço do CO2 subir, o valor aumentará. Números apresentados pelo Governo sugerem 153 milhões de euros em 2020 e 510 milhões em 2050.

Para o consumidor final, a taxa de carbono significará, para já, uma subida de pouco mais de um cêntimo no preço da gasolina e do gasóleo, que se somam aos dois cêntimos de aumento devido à elevação das taxas rodoviárias prevista no Orçamento do Estado para 2015, entregue na quarta-feira pelo Governo à Assembleia da República. A taxa também se aplica a combustíveis utilizados por indústrias que não estejam abrangidas pelo comércio europeu de licenças de emissões.

Outros 28 milhões de euros vão resultar de um agravamento de 3% nas taxas do Imposto sobre Veículos (ISV), que serão suportados por quem compra um carro novo.

Haverá, no entanto, incentivos fiscais para carros eléctricos ou movidos a combustíveis alternativos. As empresas terão maior espaço para deduzir o custo com tais viaturas no IRC.

Será também reintroduzido o sistema de incentivo ao abate de veículos em fim de vida, mas apenas parcialmente – um abatimento de 4500 euros para quem troque um carro com mais de dez anos por um veículo eléctrico ou 3250 para os híbridos plug-in.

A proposta que deu entrada no Conselho de Ministros pretendia um sistema mais alargado, tal como existiu até 2011, e também a possibilidade de haver um subsídio na forma de vales para transportes públicos para quem se quisesse desfazer do seu automóvel mas sem adquirir um novo. Havia dúvidas, no entanto, do impacto de um incentivo generalizado sobre a importação de automóveis e o consequente desequilíbrio da balança externa, e apenas parte do incentivo avançou,

Outras medidas da fiscalidade verde incluem aumentos na taxa de gestão de resíduos, paga sobretudo pelas autarquias, e na taxa de recursos hídricos. Do lado dos incentivos, há medidas, por exemplo, para a compra de frotas de bicicletas por empresas, reduções no IMI nalgumas situações e benefícios para algumas actividades florestais.

O projecto de lei será agora submetido à Assembleia da República e, se aprovado, vigorará a partir de 1 de Janeiro. O Governo diz-se aberto a alterações. Estamos disponíveis e interessados em integrar a chave de leitura de outros partidos”, disse o ministro do Ambiente.

Sugerir correcção
Ler 6 comentários