Impostos verdes só permitem reduzir sobretaxa de IRS para 3,25%

Proposta para a fiscalidade verde inova em incentivos aos transportes públicos e cria taxas sobre plásticos, aviões e CO2. Mas o alívio de impostos sobre o trabalho é mínimo: apenas um euro para um salário médio.

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O alívio de impostos sobre o trabalho é mínimo: apenas um euro para um salário médio Luís Efigénio

Se a proposta para a reforma da fiscalidade verde que o Governo tem em mãos for integralmente adiante já em 2015, os portugueses terão duas surpresas no final de Janeiro. No seu recibo de vencimentos, verão uma redução da sobretaxa de IRS de 3,5% para 3,25%, o que na prática dará para pagar em média doze sacos de supermercado. E receberão, junto com os “tickets” de refeição, vales para os transportes públicos.

O contraste entre o que os cidadãos vão pagar ou vão poupar e os inovadores incentivos à utilização dos transportes colectivos são os traços mais marcantes do projecto apresentado nesta terça-feira pela Comissão para Reforma da Fiscalidade Verde, nomeada em Fevereiro pelo Governo.

A comissão sugere medidas concretas para reciclar as receitas adicionais que serão geradas por impostos sobre o carbono, sacos plásticos, viagens de avião e automóveis. Uma parte desta compensação será feita através de uma redução de 0,25 pontos percentuais na sobretaxa de IRS.

Para quem ganha 1200 euros mensais – a média nacional – a diferença será de um euro ao final do mês. Este valor será suficiente para levar para casa doze sacos de plástico, que a proposta sugere que sejam taxados em oito cêntimos a unidade.

Para as empresas haverá dois tipos de compensação. Uma delas também é modesta: uma redução de 0,1 pontos percentuais nas contribuições para a segurança social, a TSU, que desce de 23,75% para 23,65%. A outra consiste na dedução, no IRC de micro e pequenas empresas, de 7,5% das despesas com a promoção de eficiência energética.

A descrição de como, exactamente, as 59 medidas fiscais propostas na área do ambiente serão “recicladas” com a redução de outros impostos é um ponto de honra do projecto entregue ao Governo. O passo a seguir é o executivo enviar uma proposta à Assembleia da República. “Se o Parlamento aprovasse a nossa proposta amanhã, a neutralidade fiscal estaria absolutamente garantida”, assegurou Jorge Vasconcelos, presidente da Comissão para a Reforma da Fiscalidade Verde, à margem da apresentação do relatório final da comissão, em Lisboa.

Vasconcelos diz que o projecto encomendado pelo Governo tinha um objectivo claro: “Em primeiro lugar, era o de corrigir distorções no sistema fiscal”. A utilização abusiva e ineficiente de recursos, argumenta, hoje é paga por quem não teve nela qualquer responsabilidade. “Há muitas distorções”, completa.

Muitas das medidas não são impostos, mas sim incentivos a comportamentos mais sustentáveis. E, neste sentido, as da área dos transportes são as mais salientes. A proposta prevê a possibilidade de as empresas atribuírem “vales de transportes públicos” aos seus funcionários, como uma parcela da remuneração isenta de IRS. E reintroduz o sistema de incentivo ao abate dos veículos em fim de vida, com uma novidade inusitada: quem quiser desfazer-se de um automóvel mas não pretender comprar outro, poderá ter direito a dois mil euros de crédito nos transportes colectivos.

As medidas nos transportes e a taxa sobre os sacos plásticos serão a face mais visível da reforma da fiscalidade verde para os cidadãos, no dia-a-dia. Já a taxa de carbono, a principal medida do projecto, praticamente não será sentida, representando no imediato uma redução de pouco mais de um cêntimo no preço do gasóleo e da gasolina.

“Não é este sinal que vai alterar alguma coisa. É quase imperceptível face à volatilidade dos preços do petróleo”, reconhece Jorge Vasconcelos. Mas os valores podem subir se o preço do CO2 no mercado europeu de carbono aumentar e, diz Vasconcelos, é preciso olhar para todas as medidas em conjunto.

“O que este trabalho mostra é que determinadas percepções de que haveria uma oposição radical entre economia e ecologia estão erradas. Uma reforma da fiscalidade verde promove ao mesmo tempo as duas coisas”, afirma o presidente da comissão. “Não é um conjunto de medidas voluntaristas para defender o ambiente a qualquer custo”.

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