Financial Times confirma recurso ao ES Panamá para financiar GES

Em Junho e Julho o PÚBLICO revelou inspecções à actividade do BES nos EUA para apurar se recorria, nomeadamente, aos seus bancos no Panamá e na Venezuela para financiar as suas empresas.

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Instituição do GES no Panamá está em processo de liquidação por parte das autoridades locais REUTERS/Henry Romero

Documentos consultados pelo Financial Times confirmam que o Banco Espírito Santo (BES) usou uma subsidiária, o ES Bank Panamá, para financiar a Espírito Santo International (ESI) num período crítico para o grupo empresarial, sem acesso aos mercados para se financiar (e pagar as suas dívidas).

A 23 de Julho a ESI, a holding que domina a área financeira da família Espírito Santo (e possui 25% do BES por via da ESFG), entregou no Tribunal do Comércio do Luxemburgo um pedido de gestão controlada.

O Financial Times teve acesso a documentos que revelam que entre 2012 e 2014 o Grupo Espírito Santo (GES) recorreu a operações de financiamentos não declarados, com o objectivo de ir levantar fundos ao ES Bank Panamá, subsidiária da ESFG, a accionista de controlo directo do BES. As transacções destinavam-se a comprar dívida da ESI e das restantes sociedades familiares, todas elas insolventes, o que lhes permitiu continuar a desenvolver a actividade. Em Dezembro de 2013, o Banco de Portugal (BdP) já tinha apurado que o passivo do GES alcançava os 7 mil milhões de euros.

Segundo escreve o diário britânico, a situação levanta “novas” dúvidas "sobre o papel do BdP” enquanto supervisor e, em particular, sobre a sua acção de fiscalização a um grupo “que protagonizou uma das maiores derrocadas financeiras da Europa”.  A notícia aparece na página principal do site do FT ilustrada com uma imagem de Ricardo Salgado com máscara de vilão, retirada dos cartazes espalhados pelas ruas de Lisboa (um montagem fotográfica a fazer lembrar os Irmãos Metralha a assaltar o Tio Patinhas).

"O banco do Panamá ligado aos Espírito Santo existia quase exclusivamente para adquirir dívida emitida pela ESI e as suas subsidiárias Rioforte e Espírito Santo Irmãos, de acordo com um relatório dos administradores do ES Bank”, refere o Financial Times.

A 21 de Junho deste ano já o PÚBLICO revelara que o BdP procedia a averiguações sobre a actividade do BES nos EUA, em Nova Iorque e em Miami, com o objectivo, entre várias matérias, de aferir se a instituição actuou de modo diligente perante suspeitas de branqueamento de capitais ou de outras ilicitudes, em transacções envolvendo contas na América Latina, onde o BES detinha dois bancos: o ES Venezuela e o ES Panamá. Nas inspecções o supervisor procurava suporte informático associado a operações suspeitas e ainda garantir que o GES não recorria aos seus veículos latino-americanos para financiar as  empresas do seu universo.

Dias depois, a 3 de Julho o PÚBLICO revelou que as autoridades financeiras de Miami, onde o BES possui uma subsidiária, o ES Bank Miami, estavam também a investigar a operação bancária da Florida por associação a movimentos relacionados com a actividade do grupo na Venezuela e Panamá.

O GES possuía gestores comuns às várias entidades, como Jorge Espírito Santo. Outro nome que surge associado às várias instituições é o de Machado da Cruz, para quem Ricardo Salgado remeteu as culpas da ocultação de 1,3 mil milhões de euros nas contas da ES Internacional, com sede na Suíça.

Na véspera da detenção de Ricardo Salgado para prestar declarações, que culminou na sua constituição como arguido, o PÚBLICO noticiou que os supervisores financeiros norte-americanos tinham regressado ao BES Miami para investigar operações com as subsidiárias do BES do Panamá e da Venezuela.

A 17 de Julho a autoridade financeira central do Panamá assumiu o controlo da instituição e demitiu o conselho de administração do ES Panamá, decretando um prazo de 30 dias, extensível em mais 30 para a instituição resolver a situação “com alguns grandes clientes”, mas nunca revelou os termos do seu pedido.  As averiguações que as autoridades portuguesas desenvolvem terão ainda versado sobre as contas offshore abertas no Panamá que permitiram, supostamente, ao construtor José Guilherme pagar a Ricardo Salgado os 8,5 milhões de euros a título de honorários, por serviços de consultadoria e assessoria aos seus negócios em Angola.  

Sublinhe-se que vários fundos de investimento anglo-saxónicos que compraram acções do BES no período que antecedeu a intervenção já deram indicações públicas de que estão a equacionar avançar com processos contra as autoridades portuguesas. O Governo, através de Pedro Passos Coelho, primeiro-ministro, de Maria Luiz Albuquerque, ministra das Finanças, e do porta-voz do executivo, Marques Guedes, assim como o governador do BdP, Carlos Costa, e o Presidente da República, Cavaco Silva, surgiram nas vésperas da intervenção a garantir a solidez da instituição, que acabaria por colapsar no primeiro fim-de-semana de Agosto.

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