Empresas estão a recorrer mais à redução de horário de trabalho

O corte nas horas de trabalho, uma das modalidades do layoff, está a subir em termos homólogos desde Março, embora haja menos empresas a recorrer a estes processos.

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Os números do layoff estão longe dos anos de pico da crise económica. Em Junho deste ano, havia 95 empresas neste mecanismo Nelson Garrido

As empresas que recorrem ao layoff estão a apostar mais no corte das horas de trabalho para tentar responder a quebras no negócio. Olhando para os dados do primeiro semestre, verifica-se que, a partir de Março (inclusive), houve um crescimento do número de trabalhadores com menos horas de trabalho, enquadrado no layoff, face aos mesmos meses do ano passado.

Por outro lado, e de acordo com os dados da Segurança Social disponibilizados através do Gabinete de Estratégia e Estudos do Ministério da Economia, o total de funcionários alvo de layoff (incluindo os que sofreram uma suspensão temporária de contratos) também superou, nos meses do último trimestre, os números de idêntico período de 2014.

Há um menor número de empresas a recorrer a esta medida, mas a diferença em termos homólogos tem vindo a esbater-se desde o início de 2015. Em Janeiro, havia 99 empresas a recorrer ao layoff, menos 59 do que no mesmo mês do ano passado. Em Abril e Maio, a diferença era de menos 29 e menos 30, respectivamente.  E, de acordo com os dados do Gabinete de Estratégia e Estudos (GEE), havia 95 empresas envolvidas em processos de layoff em Junho, apenas menos nove do que o registado no mesmo mês de 2014.

Em contrapartida, havia mais 262 trabalhadores envolvidos nestes processos, num total de 1089, que se repartiam entre 235 com suspensão temporária e 854 com redução de horário (uma subida de 85% face aos números registados há um ano). “Não é a primeira vez que se verifica esta situação em que há mais trabalhadores com redução de horário”, afirma a secretária-geral da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), Ana Vieira. Para algumas empresas, diz, “não faz sentido que se suspenda a actividade, mas sim que se reduza o número de horas trabalhadas”. Ao mesmo tempo, defende que o que é notório é “estarmos sempre a falar de um número reduzido de empresas que recorre a este mecanismo”.

Por isso, embora reconheça que os números do layoff estão longe dos anos de pico da crise económica (em 2009 houve 423 empresas a recorrer a este mecanismo, abrangendo um total de 19.278 trabalhadores), na prática esta “é sempre uma figura a que poucas empresas recorrem”, diz Ana Vieira. “Faz sentido que exista, mas valia a pena que se avaliasse o que pode ser melhorado e quais são os requisitos que desincentivam as empresas na sua utilização”, adianta a responsável da CCP. O facto de haver situações em que “o subsídio de Natal é pago, mas o de férias não”, é um deles, exemplifica.

Ainda que o universo de empresas seja restrito, e que no conjunto do ano passado se tenham registado diminuições homólogas de 37% no número de empresas em layoff (344) e de 40% no número de trabalhadores que se viram confrontados com situações de pagamento com prestações de layoff (4460), os números parecem indicar que este ano o panorama poderá ser menos positivo.

Se a tendência de queda do layoff que se notou particularmente na segunda metade de 2014 “foi atribuída” às alterações à legislação do trabalho, “que aumentaram outras formas de precariedade e facilitaram os despedimentos”, a tendência de maior recurso a este mecanismo a partir de Dezembro “indicia que algo de grave se passa com a economia”, defende Armando Faria, dirigente da CGTP. Mesmo havendo alternativas que “podiam atenuar o efeito do layoff”, se este voltou a crescer, então é porque “há problemas graves em relação à economia”, acrescenta.

O facto de haver uma grande diferença entre os trabalhadores em regime de redução de horário e aqueles com suspensão de contrato na primeira metade do ano também mostra que as empresas “têm de trabalhar a menor ritmo e por isso algo está mal”, reforça Armando Faria. A diferença entre as duas modalidades de layoff foi particularmente acentuada em Maio, quando havia 1145 trabalhadores com horários reduzidos e 383 com contratos suspensos.

Os dados disponibilizados pelo GEE não identificam, no entanto, os sectores que recorrem mais a esta estratégia de gestão, e que ajuda a ultrapassar um determinado momento conjuntural de falta de procura (e não um problema mais estrutural). Assim, não é possível perceber os problemas com que se defrontam, nomeadamente se estão a sofrer impactos da queda das exportações para Angola (que desceram 25% este ano).

Em 2009, ano recorde do recurso ao layoff, a indústria dos componentes automóveis foi particularmente afectada,  e várias acabaram por recorrer a despedimentos colectivos. A Faurecia, a Sodecia e a Tyco foram apenas alguns dos casos que nesse ano saltaram para as páginas dos jornais. Actualmente, o cenário actual é outro, garante o presidente da Associação de Fabricantes para a Indústria Automóvel (AFIA), Tomás Moreira.

Neste momento, em que a AFIA estima que as exportações de componentes tenham alcançado “um novo recorde, de 3400 milhões de euros, um aumento de 9,2%” face a Junho do ano passado, os números indicam que “a indústria está a trabalhar com boas taxas de ocupação e a recrutar”. E não há conhecimento de “alguma empresa que tenha recorrido ao layoff recentemente”, afirma Tomás Moreira.

O presidente da AFIA explica que, uma vez que “a indústria automóvel trabalha sem stocks de produto acabado que permitam atenuar as variações na procura”, a redução de horário de trabalho será uma modalidade mais frequente quando as empresas necessitam adaptar o seu ciclo de produção às encomendas. É uma opção mais adequada para lidar com “variações de cadências de curto prazo dos seus clientes”, enquanto “a suspensão temporária será mais adequada a períodos prolongados de quebras muito fortes e generalizadas de mercado”. com Luís Villalobos

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