E depois do incumprimento, em que posição fica o FMI a gerir a crise na Europa?

FMI confirmou que não aceita um prolongamento do prazo do reembolso da Grécia, já vencido.

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Lagarde prepara-se para a recandidatura à liderança do FMI ERIC VIDAL/REUTERS

Não houve, na Europa, um dia menos agitado do que o anterior desde o anúncio do referendo grego. Esta terça-feira não foi diferente em Bruxelas e em Atenas, onde os avisos de parte a parte remeteram para um aparente segundo plano o facto de um país do euro ter falhado, pela primeira vez, um pagamento ao Fundo Monetário Internacional (FMI).

No dia seguinte ao “atraso” na amortização dos 1544 milhões de euros, o FMI deixou os responsáveis europeus sozinhos a falar sobre as negociações com a Grécia. A instituição liderada por Christine Lagarde limitou-se a publicar um “perguntas e respostas” relativamente às implicações do incumprimento grego. Aí ficou confirmado que o FMI não vai aceitar um prolongamento do prazo do reembolso, já vencido, ainda que as regras do Fundo permitam que um Estado-membro possa pedir esse adiamento (o que Atenas fez).

Mais significativa, porque traduz uma posição para registo futuro em relação ao papel que o FMI quer assumir a partir de agora na gestão da crise grega, é a reposta à pergunta: “O que é que o FMI gostaria que acontecesse para resolver a situação?”. O diagnóstico já é conhecido. A vontade do Fundo é que sejam os parceiros europeus a garantir os empréstimos futuros à Grécia. A posição já tinha sido assumida pelo economista-chefe do FMI, o francês Olivier Blanchard, e é algo que o FMI agora reafirma num contexto de grande incerteza sobre o que se vai passar na Grécia dentro de dias e semanas.

Embora mantendo a porta aberta ao seu envolvimento nas discussões com Atenas e a zona euro, o FMI insiste que cabe aos “parceiros europeus providenciar financiamento adicional e um alívio da dívida”. A expressão “alívio da dívida” é a mesma que Washington usou há dias para falar da Grécia e isso quer dizer alguma coisa, não fosse o peso dos EUA na instituição determinante nas posições do FMI.

O facto de um país do euro (e até agora a única economia desenvolvida) ter violado o prazo de reembolso de uma parte do empréstimo colocou a Grécia numa situação só idêntica ao que aconteceu com o Sudão, Camboja, Zimbabwe, Honduras e Cuba. A leitura dada pelo Financial Times é a de que o FMI acaba de entrar em “águas desconhecidas”. Será nesse novo território que terá de gerir a crise grega. Uma situação que, reforça o El País, veio reavivar as críticas ao papel do Fundo na gestão da crise.

Quando a UE chamou o FMI a colaborar no resgate em Maio de 2010, o Fundo partilhou as práticas nos resgates internacionais. A definição do programa e as revisões que lhe sucederam, assim como o corte parcial da dívida grega detida por privados, passou a ser feitas a três, com a Comissão Europeia e o BCE. O próprio tratado que em 2012 viria a criar o fundo definitivo de socorro do euro, o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE), refere-se explicitamente ao envolvimento do FMI, de quem a zona euro passava a contar com “participação activa” no “plano técnico como financeiro”.

A corrida de Lagarde
No que se decidir na Europa em relação à Grécia, o FMI terá uma palavra a dizer. Isto numa altura que a directora-geral, Christine Lagarde, se prepara para tentar a reeleição para a liderança do Fundo, onde um dos seus desafios, para além da crise grega, continua a ser o mesmo de quando foi eleita em 2011: lidar com os países emergentes, que reclamam um maior protagonismo na instituição.

Para já, a falha no pagamento tem consequências imediatas para a Grécia. Atenas tem por saldar ao Fundo 21.200 milhões dos 58.000 milhões emprestados. O país só pode receber novos empréstimos do FMI quando amortizar a dívida que está em falta.

O Fundo clarificou que “as implicações de a Grécia acumular pagamentos em atraso têm de ser determinadas pelos outros credores”, o que no caso do MEE abre três cenários. Segundo o mecanismo, o fundo de resgate europeu pode: exigir que Atenas reembolse imediatamente todo empréstimo garantido pelo Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (um dos fundos de resgate do euro que o MEE veio substituir); ignorar que houve uma falha de pagamento da Grécia a outro credor oficial (o FMI); ou reservar-se no direito de apenas tomar uma decisão mais tarde.

Em relação ao FMI, já é certo que “não estende os termos do pagamento” em falta, “por uma questão de política de longo prazo”. “Há mais de 30 anos, o FMI concedeu a alguns países de baixos recursos um prolongamento a seu pedido, mas, em qualquer caso, o adiamento não permitiu ajudar as necessidades de financiamento imediatas ou os problemas económicos fundamentais”, justificou a instituição.

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