Donos da TAP avançam com empréstimo e revisão de rotas apesar dos bloqueios da ANAC

David Neeleman, um dos accionistas da Atlantic Gateway, diz que os chineses da HNA entram já está semana no capital da transportadora aérea.

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Neeleman referiu que foram as maiores perdas “dos últimos 15 anos” no ano passado Rui Gaudêncio

Três dias depois de a Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC) ter imposto restrições à gestão da TAP, impedindo que fossem tomadas decisões de relevo durante três meses, um dos donos da companhia, David Neeleman, vem garantir que tudo irá avançar como planeado: seja o empréstimo obrigacionista de 120 milhões de euros, seja a revisão de rotas.

A partir de Nova Iorque, onde nesta segunda-feira a transportadora aérea anunciou voos diários para Nova Iorque e Boston, David Neeleman afirmou que “tudo vai ser resolvido” com o regulador da aviação.

Em Lisboa, o presidente da TAP entrava nessa mesma altura numa reunião com a administração da ANAC, que ficou agendada depois de, na sexta-feira ao final do dia, ter sido divulgada a decisão do supervisor, que levantou dúvidas sobre se o consórcio que venceu a privatização respeita as regras comunitárias (a exigência de que as companhias de aviação sejam controladas por investidores europeus).

“Não vai haver dúvidas sobre quem está a controlar esta empresa”, disse Neeleman, adiantando que a ANAC receberá hoje “mais evidências disso”. Questionado sobre que provas serão apresentadas ao regulador, o empresário respondem que a ANAC quer “mais esclarecimentos sobre quem está a tomar as decisões no dia-a-dia”, por exemplo através de actas de reuniões do conselho.

“Não tomamos nenhuma decisão sem a concordância dos nossos sócios portugueses. Temos evidências de que todo o dia são os europeus que têm decisão final”, garantiu Neeleman. O empresário é minoritário no consórcio Atlantic Gateway, mas, pela sua experiência, é o estratega da operação da TAP. Além disso, o acordo parassocial que celebrou com Humberto Pedrosa, o sócio português, confere-lhe mais direitos económicos.

“Tudo vai ser resolvido”, assegurou Neeleman, usando como argumentos a importância que a companhia tem para o país. “Temos quase dez mil pessoas cuja vida depende da TAP e, em Portugal, a economia depende em 10% do turismo. Não tenho dúvida nenhuma de que todo o mundo vai trabalhar junto para a melhoria da TAP”, disse.

Mesmo com as restrições impostas pelo regulador, Neeleman não parece disposto a colocar a TAP em stand by. Prova disso são os anúncios feitos nesta segunda-feira, tanto nos Estados Unidos, como em Marrocos. Questionado sobre se não tinham equacionado adiar estes anúncios, o empresário explicou que “a ANAC foi informada das rotas e falou ‘tudo bem’”. “Eles sabem que e importante para a companhia e para Portugal”.

Chineses entram “esta semana”
Mas há outra decisão de relevo, que o parecer da ANAC parecia deixar em suspenso: a entrada de dinheiro fresco na empresa, através de um financiamento de 120 milhões em obrigações convertíveis em acções. “Vamos colocar o dinheiro”, frisou o empresário, sublinhando que “a TAP precisa de investimento”.

A operação de financiamento está intimamente ligada à entrada do grupo chinês HNA no capital da TAP, através da companhia de aviação brasileira Azul, que Neeleman fundou. Ao PÚBLICO, Neeleman explicou que os investidores chineses deverão formalizar a entrada na transportadora aérea portuguesa “esta semana”.

“Os chineses investiram na Azul e a Azul vai fazer investimento na TAP. Eles [grupo HNA] estão muito animados com isto. Já têm conectividade entre a China e o Brasil e levar chineses para Portugal vai ser óptimo para eles. É uma questão estratégica”, referiu.

A injecção de dinheiro fresco na TAP continua a ser uma emergência, já que a companhia voltou a ter prejuízos avultados no ano passado. Embora não tenha revelado os números finais, Neeleman referiu que foram as maiores perdas “dos últimos 15 anos”. “O nosso foco é fortalecer a TAP para que fique aqui décadas”, frisou.

Note-se que a decisão da ANAC surgiu já depois de o Governo ter anunciado um novo acordo com a Atlantic Gateway, em que a posição do Estado (hoje de 39%) subirá para 50%. E, por isso, acredita-se que o novo modelo não levantará dúvidas ao regulador. 

Triplicar visitantes dos EUA
Logo depois de ter anunciado o aumento de voos diários para os Estados Unidos, o empresário garantiu que a decisão “vai até poder triplicar o número de visitantes” em Portugal vindos daquele país. Nesta segunda-feira, também foi reforçada a operação em Marrocos.

Já sobre o Porto, onde a companhia decidiu suprimir frequências e rotas, Neeleman disse que se trata de “uma cidade muito importante para a TAP”, ao ponto de decidirem “fazer uma ponte área” com a capital, a partir de 27 de Março.

As decisões no aeroporto Francisco Sá Carneiro têm causado muita polémica, com forte contestação por parte do presidente da Câmara Municipal do Porto, Rui Moreira. “Vamos mostrar os números e fazer o que é melhor para a TAP”, disse, referindo-se aos prejuízos de oito milhões de euros que a empresa diz ter com as rotas e frequências canceladas.

“O desafio que temos no Porto é grande. Temos um concorrente lá que está a receber subsídios. É uma luta que não somos capazes de ganhar”, afirmou, numa referência à Ryanair. Quanto à possibilidade de novos cancelamentos, respondeu que "estão a analisar isso todos os meses".

Entusiamo com participação dos trabalhadores
O accionista da TAP mostrou-se entusiasmado com o interesse dos trabalhadores na compra dos 5% que lhes estão reservados, como manda a lei-quadro das privatizações “Os trabalhadores são muito dedicados. Podem ser nossos sócios, ter um pedaço da terra. Eles merecem” afirmou.

Há a expectativa de que os funcionários adiram em força à compra das acções, ao contrário do que aconteceu com outras empresas públicas. Como o PÚBLICO noticiou na semana passada, os pilotos estão a analisar a possibilidade de criar uma estrutura que agregue todos os trabalhadores que queiram investir na transportadora aérea.

A jornalista viajou a convite da TAP

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