Despesa do Estado com benefícios fiscais subavaliada por falhas no controlo da informação

Tribunal de Contas rejeita justificações do Fisco sobre omissão de mil milhões em benefícios fiscais, prática já corrigida pela AT.

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Guilherme d’Oliveira Martins, presidente do Tribunal de Contas Rui Gaudêncio

O Tribunal de Contas (TdC) identificou “insuficiências e deficiências” nos sistemas de informação e controlo da despesa fiscal do Estado, o que faz com que haja uma subavaliação da receita que o Estado deixa de encaixar por causa dos benefícios e dos desagravamentos fiscais nos vários impostos. A falha que o TdC identifica é visível sobretudo no caso do IRC, IVA e Imposto do Selo, não havendo igualmente dados da despesa fiscal associada ao Imposto Único de Circulação (IUC).

No relatório Auditoria à Quantificação da Despesa Fiscal, divulgado nesta quinta-feira, o Tribunal de Contas procura responder à pergunta: “A despesa fiscal é devidamente quantificada pela administração tributária e relevada na Conta Geral do Estado?”. A avaliação incide sobre o período de 2012. E a resposta da entidade presidida por Guilherme d’Oliveira Martins é que ainda há falhas a corrigir.

Esta entidade fiscalizadora diz que os sistemas de informação da Autoridade Tributária e Aduaneira “não contêm dados completos sobre todos os benefícios fiscais”, nem é feita a distinção entre benefícios e desagravamentos.

No caso do IRC, por exemplo, o TdC concluiu que a despesa associada a benefícios fiscais está “concentrada num número reduzido de benefícios e de beneficiários” e que “subsistem benefícios fiscais que operam por dedução à matéria colectável, com prejuízo para a equidade do sistema fiscal”. Ao todo, foram concedidos em 2012 (relativos ao período de tributação de 2011) 448 milhões de euros em benefícios fiscais em sede de IRS. Os dez maiores beneficiários absorveram uma fatia de 158 milhões de euros em benefícios fiscais, ou seja, 35% do total.

A entidade de fiscalização liderada por Guilherme d’Oliveira Martins retoma um tema para o qual já tinha chamado a atenção no seu parecer sobre a Conta Geral do Estado (CGE) de 2012: o facto de o Governo ter omitido nesse documento 1045 milhões de euros de benefícios em IRS atribuídos a sociedades gestoras de participações sociais (SGPS), um montante que é mais do dobro da despesa fiscal ali divulgada.

No exercício do contraditório, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) apresentou as suas justificações ao Tribunal de Contas, mas o supervisor rejeita os argumentos invocados. A administração fiscal alega que aquela omissão tem a ver com “razões de comparabilidade” dos números e que a despesa já estava quantificada. Um motivo que o TdC não considera aceitável, porque a CGE tem de conter todos os elementos “adequados a uma prestação clara e completa das contas públicas”, tal como se prevê na Lei de Enquadramento Orçamental (LEO).

O Tribunal de Contas diz ainda que os benefícios a SGPS (do período de tributação de 2011) também não foram divulgados no Portal das Finanças até ao final de Setembro de 2012, “ individualizando o tipo e o montante do benefício utilizado”, tal como obriga a lei.

O erro foi corrigido pela AT no ano seguinte (benefícios fiscais declarados em 2013 referentes à tributação de 2012). No entanto, essa despesa fiscal (223 milhões de euros) só vai ser fiscalizada pelo TdC na apreciação sobre a CGE de 2013.

O TdC dá outro exemplo das “deficiências verificadas nos sistemas de informação” e nos erros detectados: lembra que a estimativa da despesa fiscal inscrita no relatório do Orçamento do Estado para 2013 (documento que o actual Governo apresentou há dois anos, em Outubro de 2012) era diferente da projecção inscrita no próprio OE. Uma “inconsistência” que se deve ao facto de, no relatório, o executivo registar indevidamente perdas de receita.

O TdC recomenda que o Fisco faça uma inventariação de todos os benefícios fiscais por imposto, apresentando a “justificação económica e social” de cada um. Ao Ministério das Finanças é ainda sugerido que faça uma revisão do regime dos benefícios fiscais dos impostos sobre o rendimento, para que os incentivos que “operam por deduções à matéria colectável” passem a deduções à colecta.

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