Crédito em mínimos de oito anos mas empréstimos ao consumo recuperam

Cerca de um terço do dinheiro emprestado pelos bancos em Junho destinou-se à compra de carros.

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Imposto de selo vai subir 50% nas operações de crédito ao consumo Nelson Garrido

O crédito ao consumo tem vindo a recuperar, apesar de o total de empréstimos dos bancos a particulares estar no nível mais baixo desde 2007.

No final de Junho, segundo dados do Banco de Portugal, o stock do crédito a particulares era de 121,663 mil milhões de euros, o valor mais baixo desde Agosto de 2007. Face a Maio, a queda foi de 513 milhões de euros.

De acordo com Rui Bárbara, economista do Banco Carregosa, é natural que haja uma recuperação dos empréstimos concedidos agora que a economia começa a dinamizar, uma vez que nas economias modernas os ciclos de crédito estão muito ligados aos económicos. 

“Passámos da fase da contracção do crédito (que vem com as recessões) para a fase de maior concessão de crédito, típica do fim da recessão e que alimenta a própria recuperação do PIB. A própria disponibilidade da banca para emprestar mais, tal como desejava o BCE [Banco Central Europeu], é um indicador da proximidade da mudança de ciclo", resumiu o analista. "Portanto, a prazo não estou particularmente optimista", conclui.

Por sector, o crédito à habitação fixou-se em 99,984 mil milhões de euros, também o valor mais baixo em oito anos, e os 9817 milhões de euros dos empréstimos para outros fins representaram mínimos desde 2004.

O único sector que contrariou esta tendência foi o crédito ao consumo, que, desde o mínimo registado em Maio de 2014, tem estado a recuperar, ainda que com altos e baixos. Em Junho, totalizava 11.962 milhões de euros. Nesse mês, foram celebrados mais de 106 mil créditos ao consumo, num total de 409,382 milhões de euros emprestados. Este valor significa um aumento homólogo de 21,5% e mais 3% face a Maio.

Filipe Garcia, da Informação de Mercados Financeiros (IMF), justifica este aumento do crédito concedido aos particulares com o facto de as famílias, que "adiaram o consumo" durante os anos mais graves da crise, "voltarem agora a querer consumir, nomeadamente bens duradouros, e estarem mais confiantes em relação ao futuro". No entanto, considera que, apesar de haver ainda "mais prudência dos bancos" na concessão de empréstimos às famílias, "é uma mera questão de tempo até se voltar a algum laxismo no crédito ao consumo". 

Cerca de um terço do dinheiro emprestado em Junho foi destinado à compra de carro, no total de 150,484 milhões de euros, uns expressivos 42% acima do registado no mesmo mês de 2014.

A maior parte do financiamento ao consumo foi, no entanto, para o chamado crédito pessoal – para despesas de educação, saúde, electrodoméstico ou viagens – com 175,962 milhões de euros, mais 14,8% em termos homólogos.

Analisando todo o primeiro semestre deste ano, os bancos a operar em Portugal concederam 2,3 mil milhões de euros em crédito ao consumo, sendo que 810 milhões foram destinados à compra de carro, o equivalente a 35% do total.

Para os economistas, contudo, o problema é saber qual o efeito deste aumento do consumo nas contas externas, uma vez que a história económica recente mostra que quando os portugueses têm mais dinheiro no bolso (mesmo que através do crédito) aumentam o consumo, o que tem impacto sobretudo nas importações. Isto pode fazer com que a balança comercial, que passou a ser positiva em 2013, volte a apresentar défices, com as importações a superarem as exportações.

Filipe Garcia explica que, "sempre que o consumo privado ou o investimento aceleram, o mesmo acontece com as importações, tornando a balança comercial deficitária". Para Rui Bárbara, "o verdadeiro problema" é mesmo garantir que mais consumo não vai voltar a penalizar as contas externas: "Será que reequilibrámos e fortalecemos a estrutura económica nos últimos anos? Tenho sérias dúvidas. E é por isso não ter acontecido que se pode voltar ao mesmo ciclo vicioso: aumento do crédito e do consumo com o proporcional aumento das importações, o que voltará a agravar o desequilíbrio a balança externa".

 

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