Conflito com Angola afunda empresa estatal portuguesa em prejuízos

A SPE tem recorrido às vias judiciais para resolver o diferendo que a opõe ao Estado angolano na exploração de diamantes neste país, mas sem sucesso, e vai somando cada vez mais perdas.

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A relação entre Portugal e Angola na questão dos diamantes dificilmente será lapidada Stefan Wermuth/Reuters

Em apenas três anos, os prejuízos da Sociedade Portuguesa de Empreendimentos (SPE), que detém uma participação numa empresa de exploração de diamantes em Angola, chegaram aos 17 milhões de euros. Aliás, a SPE (controlada a 81% pelo Estado português) só sobrevive graças aos apoios financeiros da Parpública, a holding que congrega os activos empresariais estatais.

De acordo com o Relatório e Contas da empresa referente a 2013, aprovado no dia 14 de Abril, os prejuízos nesse ano foram de 2,6 milhões de euros, a que somam 1,6 milhões de 2012 e 13,3 milhões de 2011. Esse ano foi, de facto, o pior para as contas da empresa, já que foi nesse período que a SPE teve de reconhecer nas suas contas uma imparidade (perda potencial) de 12,3 nilhões de euros.

Em Outubro, o Ministério da Geologia e Minas de Angola publicara um decreto executivo onde revogou, de forma unilateral e vista pela SPE como “ilegal e inamistoso”, a licença de exploração de diamantes à Sociedade Mineira do Lucapa (SML), onde a empresa portuguesa detém 49%. A questão tornou-se fulcral, uma vez que a SML é a razão de ser da existência da SPE.

É certo que, mesmo antes disso, o negócio de diamantes que ligou a estatal angolana Endiama (dona de 51%) à SPE, por via da SML, já não estava a correr bem, com várias greves e problemas técnicos, mas em Portugal acreditava-se numa solução. A partir do momento que a Angola  obrigou à saída da SPE, a situação da empresa agravou-se. A imparidade de 12,3 milhões até pode ser reversível, mas para isso o litígio que opõe os dois países tem de ser resolvido, e há poucos indícios positivos.

No relatório e contas de 2013, a que o PÚBLICO teve acesso, a administração da SPE, liderada por Hélder Oliveira, constata que o seu papel tem sido, “cada vez mais”, o de gerir “o conflito que separa as partes portuguesas e angolanas”. Este processo, lê-se no documento, tem sido sempre conduzido “em estreita articulação com o seu accionista de referência, a Parpública”.

Do lado angolano, não só se tem ignorado várias tentativas de resolução do diferendo como tem existido, afirma a SPE, um ataque por parte da Endiama. Após ter recorrido a dois tribunais arbitrais (num processo contra a Endiama e outro contra o Estado angolano), a SPE pensava ter dado passos em frente. No entanto, em Outubro do ano passado, e após, segundo a empresa, o tribunal ter julgado abitrável o conflito com a Endiama, esta “entendeu encetar um processo, recorrendo ilegítima, ilegal e inconstitucionalmente aos tribunais ordinários”. Ou seja, o conflito mantém-se particularmente acesso e o processo deu um passo atrás.

Quanto ao litígio que envolve o Estado angolano, diz a SPE que este “tem-se revelado particularmente moroso”. Há, no entanto, a esperança que “após decisão da autoridade nomeadora sobre a recusa do árbitro presidente apresentada pelo Estado angolano, sejam criadas condições que permitam que o tribunal fique, a curto prazo, constituído”.  De acordo com a SPE, tem havido “várias situações em que a justiça ordinária tentou interferir ilegalmente no funcionamento destes tribunais”.

Com o seu activo a milhares de quilómetros de distância e envolvido num processo complexo, a SPE  tem já um capital próprio negativo de 9,6 milhões de euros. Se a empresa ainda existe, é porque o Governo português assim o entende, dando  apoio à SPE por via da Parpública. Toda a sua actividade tem sido paga com suprimentos financeiros fornecidos pela holding estatal, incluindo a assessoria jurídica.

Dos 19,7 milhões de euros que a SPE tinha por pagar no final do ano passado, devido a financiamento obtidos, 12,7 milhões estão nas mãos da Parpública, que chegou a entrar com 8,2 milhões em 2011, ajudando a liquidar uma linha de crédito do BCP. Os outros sete milhões de euros de crédito à SPE estão repartidos por três instituições financeiras, com destaque para a Caixa Geral de Depósitos (CGD). O banco público está exposto em 4,1 milhões de euros, seguindo-se o Banco Espírito Santo (BES), com 2,4 milhões de euros.

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