Concorrência multa Associação Nacional de Farmácias em dez milhões de euros

Associação foi condenada por abuso de posição dominante no mercado de estudos para laboratórios através da Farminveste e da Health Market Research.

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A ANF, presidida por Paulo Duarte, vai contestar a condenação em tribunal Daniel Rocha

A Autoridade da Concorrência (AdC) condenou a Associação Nacional de Farmácias (ANF) ao pagamento de uma coima global de 10,34 milhões de euros por abuso de posição dominante no sector dos estudos de mercado sobre dados comerciais das farmácias.

Além da ANF foram condenadas outras sociedades do grupo: a Farminveste SGPS, a Farminveste – Investimentos, Participações e Gestão e a consultora HMR – Health Market Research.

Segundo informações recolhidas pelo PÚBLICO, a entidade reguladora presidida por António Ferreira Gomes concluiu que estas sociedades actuaram de maneira a impedir que outras empresas pudessem concorrer na produção de estudos de mercado para a indústria farmacêutica, no qual a associação actua através da HMR. A ANF confirmou a condenação ao PÚBLICO, assegurando que vai recorrer de uma decisão que diz carecer de “suporte jurídico”. Assim, o processo deverá dar entrada no Tribunal da Concorrência, em Santarém.

Para realizar os estudos destinados a clientes como os laboratórios farmacêuticos, as consultoras recorrem à Farminveste (da ANF), que é a única fornecedora em Portugal de dados comerciais (de fora ficam os dados dos clientes) de uma amostra representativa de farmácias. Trata-se de um sector que vale, anualmente, mais de 20 milhões de euros por ano, segundo referiu uma fonte conhecedora do processo.

Pelo que o PÚBLICO apurou, a decisão condenatória da AdC (que nasceu de uma investigação desencadeada pelas denúncias de duas entidades) baseia-se no abuso de posição dominante da Farminveste a partir de 2009, quando criou a sua própria produtora de estudos (a HMR). A empresa agravou de tal modo os preços de venda dos dados comerciais das farmácias (fazendo com que mais que duplicassem entre 2010 e 2013, para valores próximos de 250 euros por mês, por farmácia) que impediu os concorrentes de obter a margem necessária para cobrir os custos de produção dos seus estudos, quando comparados com os preços de venda dos estudos da HMR.

Quando a maior concorrente da HMR, a IMS Health, quis garantir a compra da informação comercial directamente com as farmácias, a Farminveste, que é dona da rede informática das associadas da ANF, impediu o seu acesso aos dados. O PÚBLICO sabe que a IMS Health e a HMR representam quase 90% da oferta no sector dos estudos de mercado com base nos dados comerciais das farmácias (o que vendem, quanto vendem, a existência de stocks, etc.), que são depois utilizados pelos laboratórios para definir estratégias relacionadas com marketing, logística e apoio ao cliente. Quanto menos empresas de estudos existirem no sector, mais limitados na escolha estarão os laboratórios farmacêuticos na hora de encomendarem as suas análises de mercado.

“A decisão da Autoridade da Concorrência, de 22 de Dezembro, tomada na sequência de uma denúncia da IMS contra a Farminveste/HMR, não tem, em nossa opinião, suporte jurídico e vai ser contestada perante as autoridades judiciais competentes”, disse ao PÚBLICO fonte oficial da ANF, associação liderada por Paulo Cleto Duarte.

A mesma fonte lembrou que na semana passada o regulador da concorrência espanhol, a Comisión Nacional de los Mercados y la Competencia (CNMC), “abriu um procedimento de infracção contra a multinacional americana IMS Health, S.A. (IMS), por indícios sólidos de que a IMS terá abusado da sua posição dominante no mercado de informação de vendas de medicamentos à indústria farmacêutica”.

A ANF frisou que esta prática, “a confirmar-se, constitui uma violação grave do direito comunitário e do direito espanhol da concorrência”. Segundo a informação disponibilizada no site da CNMC, o processo de infracção, que nasceu de uma denúncia, tem agora o prazo de 18 meses para ficar concluído.

Não é a primeira vez que a AdC condena a ANF. Em Agosto de 2014 a entidade reguladora aplicou uma coima de quase 119 mil euros ao grupo por falta de notificação da aquisição da ParaRede/Glintt. Nesse caso tratou-se de uma “proposta de transacção”, um mecanismo introduzido na Lei da Concorrência que permitiu às sociedades da ANF confessarem e assumirem responsabilidade pelas infracções, conseguindo, com isso, a redução do valor da coima. Nestas situações, os processos não são passíveis de recurso para o Tribunal da Concorrência, ao contrário do que sucede com a condenação actual.

Esta trata-se da sexta condenação da AdC por abuso de posição dominante (um rol em que se incluem a PT – com três condenações – a Zon, a Roche e a Sport TV) e a quinta maior coima aplicada pelo regulador (retirando esta posição à multa de 9,29 milhões aplicada à Galp em Fevereiro por práticas concorrenciais no mercado do gás de botija).

A maior coima de sempre coube à PT em 2009, quando a empresa foi condenada a pagar mais de 45 milhões de euros por abuso de posição dominante no mercado de banda larga. Em simultâneo, a Zon (actual Nos) que ainda pertencia ao grupo PT à data dos factos (2002/2003) foi condenada a pagar oito milhões (as empresas recorreram da decisão).

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