Bruxelas quer aproximação regulatória com os EUA nos automóveis, têxteis e farmacêuticos

Negociação de acordo comercial entre Europa e Estados Unidos procura acabar com regulamentações contraditórias entre os dois blocos económicos.

Foto
Bruxelas quer que acordo dê respostas a problemas concretos, nomeadamente no sector automóvel Daniel Rocha

Além da eliminação das tarifas alfandegárias, está em cima da mesa, na negociação da parceria transatlântica entre a Europa e os Estados Unidos, uma aproximação regulatória entre os dois blocos. Porém, enquanto os Estados Unidos põem a ênfase num entendimento futuro entre reguladores, que anule a possibilidade de virem a aparecer regulamentações contraditórias e incompatíveis, Bruxelas exige que o acordo dê, de início, “resposta a problemas concretos” em sectores como o automóvel, os têxteis, o equipamento médico e as indústrias farmacêutica, química e cosmética, explicou o director-geral adjunto da DG Comércio, da Comissão Europeia, João Aguiar Machado.

O responsável, que falava num seminário sobre a Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP) realizado na manhã desta segunda-feira, em Lisboa, sublinhou que, embora a Europa considere fundamental “que os reguladores europeus e norte-americanos entrem em diálogo mais cedo, de modo a evitar abordagens regulamentares completamente contraditórias”, há que “resolver problemas em sectores específicos”, para “credibilizar todo o processo”. 

“É um trabalho que tem de ser feito sector a sector” e “rapidamente se queremos retirar benefícios económicos”, reconheceu o presidente para a Europa da Câmara do Comércio dos Estados Unidos, Peter Chase, defendendo, no entanto, que o objectivo deverá ser fazer “o acordo básico e depois deixar que os reguladores se aproximem”. O “acordo deve ser vivo e melhorado no futuro”, argumentou Chase. João Aguiar Machado concorda com o diálogo continuado, mas quer mais como ponto de partida: “As pessoas não compreenderiam se viéssemos só com propostas para o futuro”.

Num ponto todos parecem estar de acordo: é uma oportunidade única para construir pontes entre dois blocos económicos que em conjunto representam mais de metade do PIB mundial e até uma oportunidade para “relançar as negociações do comércio internacional”, como defendeu o professor de Direito Nuno Cunha Rodrigues. Segundo o docente, o acordo terá ainda o efeito de permitir “diluir a desvantagem competitiva que é para as empresas portuguesas a excessiva valorização o euro face ao dólar”. Isto porque as taxas aduaneiras praticadas pelos Estados Unidos ainda são bastante penalizadoras para as exportações portuguesas em sectores como o têxteis e o calçado, com taxas que andam em torno dos 40% a 50%, explicou. Com a eliminação das taxas essa desvantagem seria atenuada, explicou. Em causa estão as chamadas barreiras não tarifárias, sejam procedimentos burocráticos ou barreiras técnicas, como etiquetagem, sejam certificações ambientais, que muitas vezes são diferentes nas distintas autoridades federais e estaduais, que geram um elevado grau de complexidade e custos acrescidos que afastam muitas empresas de pequena e média dimensão do mercado norte-americano.

O acordo, que se prevê que seja assinado em 2015, deverá garantir que cerca de 97% do comércio seja totalmente liberalizado (ficando de fora da negociação apenas o sector audiovisual, por imposição francesa). “É um acordo que traz benefícios para todas as empresas, mas muito especialmente para as PME”, que são “as mais vulneráveis” à complexidade das questões regulatórias e burocráticas que envolvem as exportações para os Estados Unidos, disse ao PÚBLICO João Aguiar Machado.

Outra das questões que preocupa as empresas europeias nas relações comerciais com os Estados Unidos é a da mobilidade dos seus trabalhadores, nomeadamente a dificuldade em obter vistos de trabalho. João Aguiar Machado reconheceu que “questões que envolvam movimentações de pessoas são sempre particularmente complicadas junto do Congresso” norte-americano, mas disse esperar que, no caso das negociações com a Europa, “não haja as inquietudes” que existiram noutras negociações comerciais entre Estados Unidos e Ásia, por exemplo. “Não estamos a tentar enviar trabalhadores não qualificados, estamos a tentar facilitar a movimentação das pessoas dentro das empresas e por isso penso que também há um interesse dos EUA em negociar essas condições”, acrescentou o responsável europeu.

Sugerir correcção
Comentar