Bruxelas duvida das metas de combate à fraude fiscal do Governo português

Comissão Europeia diz ser mais "realista" nas previsões para 2015

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O comissário Pierre Moscovici na apresentação de hoje das previsões económicas da Comissão Europeia REUTERS/Yves Herman

As previsões económicas da Comissão Europeia para Portugal são menos optimistas do que as do Governo porque Bruxelas é mais “realista” relativamente ao impacto de medidas como o combate à fraude fiscal, disse esta terça-feira o novo comissário dos Assuntos Económicos.

Na conferência de imprensa de apresentação das previsões económicas de outono, divulgadas nesta terça-feira em Bruxelas pelo “novo” executivo comunitário liderado por Jean-Claude Juncker, o comissário Pierre Moscovici, questionado sobre as projecções para Portugal, admitiu que “é verdade que o défice (para 2015) previsto pela Comissão é mais elevado, e de maneira bastante significativa, do que aquele apresentado pelas autoridades portuguesas”, já que “excede em 0,6 pontos a projecção do Governo”.

Segundo o novo comissário dos Assuntos Económicos, a projecção mais pessimista de Bruxelas deve-se ao facto de a previsão de défice para 2014 (4,9%) já ser pior do que a das autoridades nacionais, e às expectativas da Comissão quanto ao impacto de “um certo número de medidas de redução do défice que foram anunciadas” pelo Governo.

“Na realidade, a maior diferença (entre as projecções da Comissão e do Governo) deve-se a uma abordagem menos optimista e, quanto a nós, mais realista, do impacto sobre o défice da retoma económica, e também talvez uma visão menos optimista sobre as medidas tomadas contra a fraude fiscal”, declarou.

Questionado sobre se a Comissão perdeu a confiança em Portugal desde a saída da troika e se irá pedir novas medidas orçamentais ao Governo português, Moscovici, antigo ministro das Finanças francês, limitou-se a dizer que “hoje é tempo de previsões, não de recomendações”.

A Comissão deverá emitir, até final de Novembro, o seu parecer sobre a proposta de Orçamento de Estado para 2015 apresentada pelo Governo a 15 de Outubro passado.

O Governo tem enfatizado o resultado das medidas de combate à evasão fiscal, nomeadamente com o programa e-factura, no aumento da receita fiscal, que até Setembro apresentou um crescimento de 7,3%. Para este ano, prevê que para os cofres do Estado entrem 37.118 milhões de euros da cobrança de impostos, contando que o montante a arrecadar em 2015 chegue 38.873,9 milhões de euros. No caso do IVA, o imposto que mais entrada de receita garante ao Estado, a expectativa do Governo é que o crescimento seja suportado pelo aumento do consumo privado e que beneficie ainda “do efeito esperado da estratégia de reforço do combate à fraude e à evasão fiscais”, como refere o executivo no relatório do Orçamento do Estado.

Nas dúvidas levantadas sobre o resultado do combate à fraude, a Comissão Europeia é acompanhada pelo Conselho Económico e Social (CES), que no projecto de parecer sobre o OE reconhece os “esforços e os resultados obtidos” pelo Governo neste campo, mas avisa que “a previsão dos efeitos deste combate sobre as receitas é extremamente difícil de quantificar e que, portanto, contar com um aumento significativo das receitas baseado neste facto pode revelar-se desajustado”.

O Governo estima que, em 2013, 20% do aumento da receita em relação a 2012 tenha resultado directamente do combate à fraude e à economia paralela. A 17 de Setembro, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, foi questionado numa audição parlamentar sobre como tinha chegado a este valor, mas não respondeu directamente à pergunta. No entanto, um dos argumentos do executivo é que, tendo em conta a aplicação de “elasticidades” e das variáveis macroeconómicas que influenciam o comportamento da receita, há uma fatia que se explica com o aumento da receita.

Incentivos ao pedido de facturas
O montante das receitas do IVA e do IRS que superar as previsões do OE, caso a meta seja ultrapassada, será alocado para o reembolso (total ou parcial) da sobretaxa do IRS de 3,5%. Uma medida que está assim dependente do nível de crescimento das receitas e, indirectamente, do efeito do combate à evasão fiscal no aumento dessa entrada de receita.

Na reforma do IRS, são introduzidas várias mudanças na forma como o contribuinte se relaciona com o imposto, aumentando os incentivos ao pedido de facturas com Número de Identificação Fiscal (NIF). Para as deduções de gastos de saúde (15%, com um limite de mil euros), contam as facturas emitidas com número de contribuinte (e que têm de ser comunicadas ao fisco pelas entidades emitentes).

Ao mesmo tempo, no grupo de deduções de “despesas gerais familiares”, qualquer factura com NIF conta para dedução (40%), havendo um tecto de 300 euros por sujeito passivo. Qualquer despesa conta, desde compras numa loja, despesas de supermercado, um café, ou as facturas do gás e telecomunicações. Para ter direito ao valor máximo desta dedução, basta ao contribuinte realizar despesas no valor de 750 euros anuais, mas só são elegíveis as facturas com NIF.

Ao mesmo tempo, o Governo mantém, o benefício fiscal (em sede de IRS) do valor equivalente a 15 IVA suportado em serviços de cabeleireiro, oficinas de automóveis, hotelaria e restauração.

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