BPI autonomiza actividade em África

Accionistas do BPI criam nova sociedade, que vai gerir as operações bancárias em Angola e Moçambique. Uma resposta às exigências do BCE de limitação aos riscos em Angola.

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A nova holding será detida numa fase inicial pelos actuais investidores do banco Ricardo Brito

O Banco Português de Investimento (BPI) vai avançar com um processo de separação simples, criando uma nova holding independente que concentrará as suas participações em África, e que será detida, numa fase inicial, pelos seus actuais accionistas.

Trata-se ainda de um projecto apresentado pelo BPI e que terá de ser submetido à aprovação da Assembleia-Geral do banco, mas também dos reguladores nacionais, portugueses, angolanos e moçambicanos, e dos europeus.

Se a proposta for aceite, os accionistas do BPI vão criar uma nova sociedade (que não é um banco), que será o chapéu que recebe 50,1% do Banco de Fomento de Angola (BFA), 30% do Banco Comercial e de Investimentos (BCI) e a unidade de banca de investimentos BPI — as duas últimas instituições são moçambicanas. No BFA, o BPI tem uma parceria com uma empresa, a Unitel, ligada a Isabel dos Santos, mas no BCI está associado à Caixa Geral de Depósitos.

A iniciativa de retirar os bancos africanos do balanço do BPI, e de os colocar numa estrutura separada, que os vais gerir, tem dois objectivos: permitir aos accionistas do BPI continuar com as operações em Angola e em Moçambique e não vender o BFA; e, sobretudo, garantir que o BPI cumpre com as exigências europeias de limite de exposição aos grandes riscos que, no caso do banco português, estão associadas à dimensão do investimento no Banco de Fomento de Angola.

Na fase inicial, quer o BPI, quer a nova sociedade vão partilhar o mesmo capital e ambos ficarão cotados na bolsa de Lisboa. Hoje, o banco liderado por Fernando Ulrich é detido em 44,6% pelo espanhol Caixabank, enquanto Isabel dos Santos, através da Santoro, possui quase 19% e a seguradora alemã Allianz detém 8%. A nova holding, designada em comunicado por Nova Sociedade, terá um capital de 46 milhões de euros, com os actuais investidores do BPI a receberem uma nova acção por cada detida no BPI.

No caso de se concretizar o projecto anunciado esta quarta-feira, então o BPI ficará limitado à actividade doméstica e às operações nos mercados de emigração. O que pode constituir um problema tendo em conta que, nos últimos dez anos, que foram de crescimentos em Angola, os resultados do BPI beneficiaram do contributo do BFA em 900 milhões de euros. Em 2014, o BFA lucrou 245,7 milhões de euros, dos quais 116,9 milhões reverteram para o BPI. O que não impediu o banco de fechar o ano com prejuízos de 161,1 milhões de euros. 

Em termos de activos, o BFA representa um quinto do BPI, ou seja, de acordo com os critérios europeus, é demasiado grande para o BPI consolidar. Uma disposição da Comissão Europeia, já em vigor, impõe que as instituições sob a alçada de Frankfurt contabilizem na totalidade (até agora, o requisito oscilava entre 0% e 20% dos activos) o impacto da sua exposição aos grandes riscos de unidades com actividade em mercados com supervisão não equiparável à europeia. No contexto do mecanismo único de supervisão bancária, Draghi declarou Angola (de um grupo de cerca de 200 Estados/territórios) com tendo um padrão de supervisão não comparável ao europeu (só aplicado em 17 países). Para Mario Draghi, o líder do BCE, o que está em causa não é tanto a qualidade do risco, mas a quantidade dos activos considerados.

Ainda que os novos requisitos do BCE tenham criado um problema a Fernando Ulrich, a autonomização do BFA, numa estrutura separada do banco e cotada (podem entrar e sair accionistas), pode facilitar a resolução do diferendo aberto pela OPA lançada no início deste ano pelo Caixabank sobre 100% do capital do BPI. Uma oferta não negociada, e que contou com a oposição do segundo maior accionista. Todavia, Isabel dos Santos podia, se tivesse entendido, ter-se articulado durante a OPA com o grupo espanhol, negociando, por exemplo, a sua saída do BPI a troco do controlo do BFA, de que já é accionista. Aparentemente, este caminho não foi o seguido. Sem o contributo do banco angolano (no pressuposto de que este se manterá rentável), com a economia portuguesa sem fôlego e a manter-se a divisão no capital, o futuro do BPI é, portanto, uma incógnita.

 

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