BdP agiu no caso Espírito Santo após denúncias de Pedro Queiroz Pereira

A ESFG, que domina o BES, foi obrigada pelo supervisor bancário a criar uma provisão de 700 milhões de euros após queixas de Pedro Queiroz Pereira, de clientes e de instituições rivais.

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BES, liderado por Ricardo Salgado, garante que não há alteração nas contas de 2013 Rui Gaudêncio

O Espírito Santo Financial Group (ESFG), cujo activo mais relevante é a participação que detém no BES, vai criar uma provisão de 700 milhões de euros para enfrentar riscos potenciais que possam surgir na área não financeira do Grupo Espírito Santo (GES). Uma medida que resulta do processo de reestruturação que está em curso no grupo e que já obrigou o BES a assumir prejuízos em 2013 de 517,6 milhões de euros.

A criação de uma almofada de segurança de 700 milhões de euros, na ESFG foi uma imposição do Banco de Portugal, após várias denúncias a alertar para o facto de o BES, através da sua rede de retalho, estar a colocar dívida de sociedades familiares não financeiras, de que se desconheciam os riscos: ou seja, estava a usar os clientes para financiar as empresas do grupo.

As queixas (e perguntas de clientes), que chegaram ao BdP e à CMVM, partiram de entidades do universo financeiro, mas também do presidente da Semapa Pedro Queiroz Pereira ( o ex-accionista do GES foi levar ao BdP, no Verão de 2013, vários dossiers com informações das holdings, actuação que surgiu no quadro de um braço-de-ferro travado com Ricardo Salgado e que terminou, no final do ano, com uma divisão de interesses), e depois de, em Agosto de 2013, dois fundos de investimento (com aplicações de curto prazo, idênticas a depósitos à ordem) geridos pela ESAF - o ES Liquidez e o ES Rendimento - terem canalizado, via holdings dominantes, para a Espírito Santo International e a ES Irmãos, mais de 2,2 mil milhões de euros para empresas da Rio Forte (que agrega os interesses não financeiros do GES e, por não ser cotada, não está sujeita a escrutínio).

No final de 2013, o BdP ordenou uma auditoria externa à Espírito Santo Internacional (ESI), com o objectivo de avaliar o grau de exposição do BES à holding Rio Forte. A ESI é uma das holdings mais importantes do GES e aparece em segundo lugar (em termos de importância) na estrutura do grupo. Na sequência da acção do BdP, a ESAF foi obrigada a reduzir os movimentos dos fundos de investimento e o grupo passou a colocar parte da dívida (papel comercial) directamente.

A provisão na ESFG surge, assim, como uma garantia adicional de que os clientes do BES que subscreveram dívida de curto prazo (papel comercial) são reembolsados. Uma medida que se inscreve na reestruturação que está em curso, envolvendo a desalavancagem (venda de activos) do balanço do GES, uma decisão que foi adiada e que em 2013 obrigou o banco (e o GES) a reorganizarem-se, à semelhança do que a CGD, o BCP, o BPI e o Banif tinham feito em 2012, mas nestes quatro casos com recurso a fundos estatais.

Esta via não tem sido uma opção para o GES (daí as emissões de papel comercial), pois qualquer pedido de ajuda pública terá de partir da ESFG (a entidade que é submetida aos testes de stress europeus), que junta os interesses da família e tem sede no Luxemburgo. Por seu turno, o BES tem-se recapitalizado com fundos privados levantados, nomeadamente, nos mercados internacionais.

Até agora o GES já pagou mil milhões de euros aos subscritores das emissões de papel comercial de curto prazo de sociedades não bancárias do GES colocadas pela ESI junto dos clientes do banco, o que representa cerca de 60% da dívida (papel comercial) total. Os reembolsos aos restantes credores serão efectuados nos próximos tempos e à medida dos vencimentos. Mas a expectativa é a de que, a partir de Julho, 80% da dívida das empresas já esteja liquidada. Para saldar os compromissos remanescentes, o GES irá, por exemplo, emitir dívida de médio e longo prazo, agora a colocar junto de investidores institucionais.

Entretanto, o Deutsche Bank, o Nomura Bank e a Goldman Sachs estão a ultimar a arquitectura do programa de reorganização da parte não bancária do GES, que envolve a continuação da desalavancagem (redução de dívida) e medidas de recapitalização (venda de activos). Este plano irá alterar a organização em cascata do grupo, de modo a clarificar os actuais fluxos de financiamento entre holdings e sub-holdings do GES e permitir uma maior facilidade na passagem dos dividendos gerados na área financeira para as holdings do topo.

O projecto separará as águas entre os sectores financeiros e não financeiros, com o nome Espírito Santo (que deixará de ser usado por 30 empresas da família) a ser de uso exclusivo das operações bancárias nacionais e internacionais (BES/BESI).

Em paralelo, estão a ser adoptadas medidas ao nível da governação. Uma delas será a separação entre membros de órgãos sociais da banca e das empresas não financeiras. Ricardo Salgado, José Maria Ricciardi e José Manuel Espírito Santo, os três primos executivos no BES, vão abandonar a administração da holding ESI. Por seu turno, Manuel Fernando Espírito Santo, que está à frente da Rio Forte, sairá da administração não executiva do BES.

O BES comunicou ontem que existe um atraso na assembleia geral da ESFG, agendada para 25 de Abril, no Luxemburgo, mas a reunião realizar-se-á até 31 de Maio. O adiamento prende-se com os atrasos na publicação do relatório e contas de 2013 do BES, em resultado da necessidade de reflectir os impactos das avaliações do Banco de Portugal aos grandes devedores da banca. O BES irá divulgar a informação a 7 de Abril para ser levada à AG a 28 de Abril. O BES garantiu que, apesar dos atrasos, não haverá alterações nas contas do ano passado já comunicadas em Fevereiro.

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