Agência de rating DBRS preocupada com Governo à esquerda

Analistas da agência presentes em Portugal dizem que ritmo do ajustamento orçamental seria incerto e defendem mais reformas estruturais.

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Agência de notação diz que um Governo que inclua o BE a CDU "seria provavelmente negativo” Rui Gaudêncio

A única das quatro principais agências de rating internacionais que não coloca Portugal num nível “lixo” está preocupada com a concretização de um governo à esquerda e com a falta de capacidade que um futuro Governo, seja ele qual for, poderá ter em colocar em prática mais reformas estruturais.

De visita a Lisboa para realizar uma avaliação à situação económica e financeira ao país, dois analistas da agência de notação financeira DBRS falaram com o PÚBLICO e mostraram estar a centrar as suas atenções nos desenvolvimentos políticos e no impacto que estes podem ter para a condução da política económica e orçamental.

Embora salientem que “a maior parte dos votos continua em forças políticas favoráveis ao euro” e acreditem que “o PS pode chegar a um acordo em relação a medidas económicas como a coligação de centro direita”, os responsáveis da DBRS vêem-se forçados a contemplar um novo cenário que não assumiam em anteriores análises. “Não podemos excluir a possibilidade de um Governo liderado pelo PS e apoiado pela esquerda radical”, afirma Adriana Alvarado, a nova analista principal da DBRS para Portugal, avançando desde logo que “um Governo que inclua o Bloco de Esquerda e a CDU seria provavelmente negativo”.

E qual a explicação para esta avaliação logo à partida a um executivo que ainda não está formado? “Embora o Bloco de Esquerda tenha suavizado a sua retórica recentemente, é um partido anti-euro. Por isso, um governo desse tipo aumentaria as preocupações acerca do ritmo de ajustamento orçamental e da previsibilidade da política económica. Além disso, uma aliança entre o Partido Socialista e o Bloco de Esquerda poderia mostrar-se instável e conduzir a eleições antecipadas durante o próximo ano”, diz Adriana Alvarado, uma analista venezuelana, residente em Londres e que faz agora a sua primeira visita a Portugal para analisar a sua situação económica e política.

Outra preocupação expressa pelos analistas da DBRS está na dificuldade de concretização de reformas estruturais num cenário que, seja qual for o próximo governo, será de pouca solidez a nível político. "As actuais circunstâncias aumentam as dúvidas em relação à durabilidade do próximo Governo e, por isso, também em relação à sua capacidade para continuar a pôr em marcha as reformas estruturais que são necessárias”, afirma Michael Heydt, o outro analista da DBRS presente na visita a Portugal." O que foi feito nos últimos anos tem sido impressionante, mas consideramos que mais pode ser feito. Certamente que gostaríamos de ouvir o futuro Governo a dizer que está totalmente comprometido com as reformas já realizadas e que pretende avançar para reformas adicionais”, disse.

Apesar do discurso elogioso em relação às políticas adoptadas em Portugal nos últimos anos, os responsáveis da DBRS temem que, no Programa de Estabilidade, “exista optimismo nas previsões de crescimento de longo prazo, o que também pode colocar em causa o rumo de ajustamento orçamental”.

A DBRS tem sede em Toronto e origem canadiana, mas foi recentemente adquirida pelas gestoras de fundos Carlyle e Warburg Pincus. Os valores da operação não foram tornados públicos, mas podem ascender aos 500 milhões de dólares, de acordo com vários órgãos de comunicação social.

Geralmente com menos notoriedade do que as três grandes agências – a Standard & Poor’s, a Fitch e a Moody’s – a DBRS tornou-se mais importante durante a crise do euro quando as suas análises passaram a ser consideradas pelo BCE quando este faz uma avaliação da qualidade dos títulos de dívida pública de um país. Para Portugal, em particular, o facto de a DBRS ter mantido o seu rating acima do nível “lixo” (ao contrário do que acontece com as outras três) é bastante relevante, já que permite que o BCE continue a aceitar a dívida portuguesa como garantia nos empréstimos que concede aos bancos, sem exigir que o país esteja sujeito a um programa da troika.

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