A troika entre os cartazes da revolução e os últimos acenos no Parlamento

Missão externa e partidos estiveram reunidos à porta fechada. PSD e o CDS saúdam fim do resgate, a oposição questiona o silêncio sobre as negociações com o Governo.

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A última avaliação da troika começou nesta terça-feira Nuno Ferreira Santos
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Antes da reunião com os partidos, a missão externa foi recebida por Assunção Esteves Nuno Ferreira Santos
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À frente, Isabel Vansteenkiste (BCE) e Jonh Berrigan (Comissão Europeia) com Vieira da Silva. Atrás à esquerda, Subir Lall (FMI) Nuno Ferreira Santos
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A troika não prestou declarações aos jornalistas na visita ao Parlamento Nuno Ferreira Santos
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Vieira da Silva, presidente da comissão de acompanhamento do programa de resgate, com a missão externa Nuno Ferreira Santos
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A reunião na comissão parlamentar durou cerca de 1h30 Nuno Ferreira Santos

O protocolo cumpriu-se sem atrasos. Pontualmente à hora marcada, assim que os relógios do Parlamento batiam as três da tarde, os representantes da troika percorriam os últimos metros da passadeira vermelha que os levaria ao cumprimento formal da Presidente da Assembleia da República no início de mais uma avaliação do programa de resgate financeiro. Desta vez, a última visita regular.

Um encontro rápido a que se seguiria outro, mais demorado, com os deputados da comissão de acompanhamento do resgate, do qual os dos chefes de missão do Fundo Monetário Internacional (FMI), Comissão Europeia e Banco Central Europeu (BCE) sairiam ao fim de 1h30 em silêncio, sem declarações aos jornalistas. Se os partidos da maioria saíram do encontro a enfatizar o facto de este ser o último dos 12 exames regulares previstos no papel, a oposição diz ter ficado sem resposta sobre as medidas negociadas para o pós-resgate, nomeadamente em relação aos cortes de 2015.

Às 15h, os chefes de missão percorrem o andar nobre da Assembleia ao encontro de Assunção Esteves: à frente, o irlandês Jonh Berrigan, representante da Comissão Europeia, atrás, lado a lado, Subir Lall, do FMI, e a belga Isabel Vansteenkiste, do BCE, novata nas andanças da troika na Assembleia.

Ao encontro dos partidos, para a reunião da comissão parlamentar, seguiriam pouco mais de 20 minutos depois, no mesmo corredor, agora com uns metros mais para percorrer. Nas paredes brancas, o apelo dos cartazes da revolução, com os slogans e as imagens que marcaram o pós-25 de Abril, agora reunidos nos corredores da AR numa exposição comissariada pelo historiador José Pacheco Pereira (“O nascimento de uma democracia (1974-1976”).

A troika no meio dos cartazes da revolução: o tempo do percurso é curto, faltam ainda alguns minutos para o início da reunião com os partidos, mas os chefes da missão seguem em frente, atravessando o corredor em passos largos. Não se desviam do caminho, a expressão que tantas vezes utilizada para apelar ao cumprimento das metas do programa.

A exposição fica para trás. E ali tão perto: encaixilhado, o programa do Movimento das Forças Armadas; o cartaz do PS com o apelo sobre fundo vermelho – “Construir o socialismo em liberdade”; o laranja forte de um outro, do partido que hoje lidera a coligação de Governo – “Social Democracia para Portugal”, do PPD; “Unidade do povo contra o fascismo, pelo poder popular”, do extinto Movimento de Esquerda Socialista (MES); a vermelho e amarelo, o —slogan ainda em voga “PCP – por uma vida melhor”; ou a série de cartazes coloridos, com fotos da época a preto e branco, “Queremos responder”, do CDS.

Às 17h, terminado o encontro, atravessam os Passos Perdidos, onde os partidos reagiriam de imediato. Saem em silêncio, mas as posições do FMI ficavam clarificadas na véspera no relatório da 11.ª avaliação: apelos ao consenso, para que a disciplina orçamental seja cumprida e para alargar as reformas no mercado de trabalho, de forma a facilitar os despedimentos e aumentar a flexibilidade salarial. Posições que motivariam uma reacção do Presidente da República, durante uma visita a Guimarães. “Os relatórios das instituições internacionais devem ser lidos com cuidado mas, depois, o que vai ocorrer é uma negociação entre as autoridades portuguesas e essas instituições”, afirmou Cavaco Silva, citado pela Lusa.

Dia de reuniões
No Parlamento, os partidos da oposição queixaram-se de a troika nada dizer sobre as negociações com o Governo, que se prepara para aprovar até ao final do mês o Documento de Estratégia Orçamental. Ainda de manhã, a missão externa esteve reunido com o PS no Largo do Rato, numa reunião com António José Seguro. E a certeza com que os socialistas saíram da reunião — a de que “a política de austeridade vai continuar”, diria Eurico Brilhante Dias, membro do Secretariado Nacional — foi a mesma com que saíram da reunião à tarde, na comissão parlamentar.

Aos jornalistas, o deputado socialista Pedro Marques adiantou que os representantes da missão externa, quando questionados pelo PS; “não quiseram responder directamente à questão da natureza” das propostas negociadas com o Governo de Pedro Passos Coelho para 2015. Isto, argumentou, “para empurrar para depois das eleições [europeias] as más notícias”. Também João Oliveira, líder parlamentar do PCP, disse que Jonh Berrigan, Subir Lall e Isabel Vansteenkiste “não quiseram detalhar” as medidas acordadas com o executivo.

O deputado do PSD Miguel Frasquilho disse que os sociais-democratas defenderam junto da troika que o Memorando de Entendimento poderia ter sofrido “adaptações durante o período em que vigorou”. Mas “isso agora pertence ao passado”, embora deva servir de aprendizagem para os próximos anos, acrescentou.

Sobre o conteúdo da reunião, a deputada do CDS Cecília Meireles pouco adiantou, centrando o discurso no fim da presença regular da equipas do FMI, Comissão Europeia e BCE. A conclusão do resgate “só por si” é um facto importante, considerou.

Pelo Bloco de Esquerda, o deputado Luís Fazenda adiantou que a troika fez uma “pressão muito forte neste sprint final” para que os cortes nas pensões, em salários e noutras despesas orçamentais serem “não só garantidos, como serem agravados”.

Mas como noutras reuniões, disse, este foi um “encontro mais formal do que realmente produtivo do ponto de vista do debate, de opiniões políticas, de informações – qualquer coisa que pudesse alterar, minimamente que fosse, o curso” da estratégia da troika.

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