Banco de Portugal revê consumo em alta e diz que retoma é sustentável

Banco de Portugal reviu em alta as previsões de crescimento da economia para este ano. A aceleração do consumo privado é a principal razão.

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Consumo será fundamental para o crescimento José Manuel Ribeiro/Reuters

O FMI avisou que os sinais de retoma da economia portuguesa poderiam não ser sustentáveis, o Governo protestou e, agora, o Banco de Portugal entra no debate para dar razão ao Executivo e dizer que o crescimento recente tem características que permitem pensar que será sustentável. Ainda assim, para 2014, as suas previsões de variação positiva do PIB mostram que é uma aceleração surpreendente do consumo privado que está a levar a revisões em alta das estimativas de crescimento em Portugal.

"Algumas características da actual fase da economia portuguesa – capacidade líquida de financiamento externo, consolidação orçamental em curso, transferência do sector não transaccionável para o sector transaccionável– constituem elementos favoráveis a um processo de crescimento sustentável", afirma o Banco de Portugal no documento em que apresenta as suas novas projecções.

A entidade liderada por Carlos Costa diz agora que Portugal irá registar este ano um crescimento de 1,2%. Este número supera os 0,8% que tinham sido previstos no boletim de Inverno do banco central e é idêntico à estimativa do Governo e da troika que saiu da 11ª avaliação ao programa português.

Para 2015, o Banco de Portugal prevê agora um crescimento de 1,4%, contra os 1,3% anteriores e os 1,5% previstos pelo Governo e a troika. O banco apresenta pela primeira vez uma projecção para 2016, com um crescimento de 1,7%. Tanto para 2015 como para 2016, não foram consideradas eventuais medidas de austeridade que venham a ser aplicadas pelo Governo.

Mas se olhando para os valores globais do PIB as projecções são muito idênticas às do Governo, quando se analisa as diferentes componentes do PIB percebe-se que existem diferenças importantes, especialmente no que diz respeito ao contributo que o consumo privado está a ter para a actual retoma.

O Banco de Portugal diz que "ao longo do horizonte de projecção a recuperação da actividade económica deverá ser suportada por uma aceleração da procura interna privada e pela manutenção de um crescimento robusto das exportações", dois fenómenos que se começaram logo a fazer sentir na segunda metade do ano passado.

A diferença mais marcada em relação às previsões anteriores do Banco de Portugal é, contudo, a passagem da variação do consumo privado em 2014 de 0,3% para 1,3%, no espaço de apenas três meses. Esta aceleração do consumo acima das expectativas verificou-se já, como mostraram os números publicados recentemente pelo INE, na segunda metade do ano passado. E o Banco de Portugal acredita que a tendência se está a manter em 2014. Alguns indicadores apontam nesse sentido, como, por exemplo, os dados das compras de automóveis em Janeiro e Fevereiro. O Banco de Portugal também reviu em alta a sua previsão para o investimento, de 1% para 1,8%.

O Governo e a troika apresentaram no final da 11ª avaliação previsões de crescimento mais conservadoras para o consumo privado, de 0,7% em 2014, e mais optimistas para o investimento.

O problema destes números é que podem constituir um sinal de que Portugal está a voltar a crescer com base no consumo. Este tema marcou as discussões entre o FMI e o Governo na décima avaliação do programa, com o Fundo a alertar para a insustentabilidade de uma retoma desse tipo. Já depois da 11ª avaliação, a ministra das Finanças deu destaque ao facto de, nas novas previsões, o crescimento do PIB ser explicado em 0,6 pontos com a procura interna e 0,6 pontos com a procura externa líquida (exportações menos importações)

As previsões que o Banco de Portugal agora apresenta mostram outros números. Com a aceleração do consumo e, de forma mais moderada, do investimento, as importações também devem crescer a um maior ritmo. O banco antecipa uma variação de 5,4%, contra os 3,9% anteriores e os 4% previstos pelo Governo. Ao mesmo tempo, as exportações mantêm taxas de crescimento acima dos 5% entre 2014 e 2016.

O resultado é que o crescimento de 1,2% do PIB em 2014 é explicado pelo contributo de 1,2 pontos da procura interna e de zero da procura externa líquida (exportações menos importações). 

O Banco de Portugal, contudo, defende que este ritmo crescimento do consumo privado não é insustentável, já que “tem implícita a manutenção da taxa de poupança num nível superior aos valores médios observados desde o início da área do euro”. Isto é, as pessoas não estão a voltar a gastar com base no endividamento, mas sim porque têm rendimento suficiente para o fazer. Segundo as novas previsões, “o rendimento disponível real deverá apresentar um crescimento marginal em 2014 e uma recuperação moderada em 2015 e 2016”.

Outra razão dada pelo banco para acreditar que o actual processo de retoma é sustentável é a continuação da melhoria (embora de uma forma menos rápida do que antes previsto) da balança externa portuguesa, com o excedente a passar de 2,6% do PIB em 2013 para 3,3% em 2014.

Apesar de acreditar que é sustentável, o banco central alerta que a retoma não será tão rápida como no final de crises anteriores. Em 2016, aponta-se ainda para uma taxa de crescimento real de 1,7%, com o emprego a subir a um ritmo semelhante.

Em termos nominais, o crescimento da economia não deverá superar os 3%. Este número torna o desafio de garantir o cumprimento das metas do Pacto Orçamental europeu no que diz respeito à redução da dívida pública ainda mais difícil.

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