A política tem de começar a ser diferente da vigarice

A melhor notícia dos últimos dias foi ouvir António Costa dizer que a solução encontrada para o Banif iria ter um "custo muito elevado para os contribuintes".

1. Informações essenciais escondidas do Parlamento e do povo pelos partidos da direita para obter dividendos políticos e para evitar uma maior punição nas eleições. Falsas declarações prestadas por responsáveis políticos e por governantes com o objectivo de branquear a situação financeira. Mentiras em série produzidas activamente ou por omissão pelo governo PSD-CDS e pelo Banco de Portugal. Decisões urgentes adiadas por razões eleitorais apesar de isso causar graves prejuízos à banca, às finanças nacionais, ao Estado e a todos os portugueses. Pode-se dizer que é política, pode-se dizer que são as finanças, pode-se dizer que são os bancos, mas a verdade é que todas estas coisas parecem, cada vez mais, ser casos de polícia. Como se classifica um acto, praticado conscientemente, premeditadamente, por um grupo organizado de pessoas conhecedoras e com acesso a toda a informação, que se traduz na perda de milhares de milhões de euros para o Estado no desaparecimento de milhares de milhões de euros dos nossos bolsos (para não falar nos prováveis despedimentos)? Como se classifica a propagação sistemática de mentiras sobre o nosso património por parte daqueles que foram encarregados de o gerir com o máximo de prudência, de transparência, de sensatez e no mais rigoroso respeito da legalidade? Como se classifica o recurso a mentiras e a esquivas sistemáticas para obter um benefício político imerecido? Como se classifica uma negligência reincidente desta dimensão por parte de uma (duas? três?) das principais entidades reguladoras nacionais?

A verdade é que é difícil classificar tudo isto porque toda a história do Banif, como outras antes dela, nos parece inverosímil de tanta negligência, de tanto descaramento, de tanto sectarismo político, de tanta irresponsabilidade, de tanto fanatismo ideológico, de tanto desprezo pelos cidadãos e pela democracia.

A verdade é que, ao longo dos últimos anos, cada vez mais, a política e as finanças (em particular a banca) foram-se tornando cada vez mais parecidas com casos de polícia e tornou-se cada vez mais difícil distinguir entre um ministro e um vigarista ou entre um banqueiro e um gangster. E isso é grave porque, se a realidade recente e a história nos confirmam que existem mil razões para não confiar em ministros e em banqueiros, a verdade é que vamos precisar de ministros e de banqueiros honestos e competentes.

É por isso que a primeira prioridade do Governo de António Costa e da esquerda que o apoia no Parlamento tem de ser devolver a credibilidade à acção política (apesar da herança do consulado do PSD e do CDS), devolver a credibilidade à acção governativa (apesar da herança do governo de Passos Coelho), devolver a credibilidade ao sistema financeiro (apesar do BPN, do BPP, do BCP, do BES, do Banif, do Montepio e do que mais adiante se verá) e devolver a credibilidade ao regime de regulação (apesar da inacção do Banco de Portugal e da CMVM), o que significará necessariamente reformar de forma profunda os procedimentos dos reguladores.

É preciso que o Governo actual e a esquerda que o apoia faça diferente e que mostre como é possível, necessário e benéfico fazer diferente. É por isso que a melhor notícia que tive nos últimos dias foi ouvir António Costa dizer que a solução encontrada para o Banif iria ter um "custo muito elevado para os contribuintes". Porquê? Porque, depois de quatro anos de falsidades e propaganda, cheguei a um ponto onde o que quero ouvir da boca do Governo não são boas notícias, mas apenas a verdade. Se pudermos ter um Governo que fala verdade, essa será a melhor notícia possível.

2. Manda a tradição que, nestes dias que antecedem o Natal, se desejem Boas Festas aos amigos e a todos os homens e mulheres de boa vontade e se exprimam votos para o futuro. Faço-o, pela primeira vez desde há alguns anos, com uma esperança nova, porque penso que este Natal pode ser o início de um tempo mais justo e mais feliz para todos, um Natal de verdadeiro renascimento, como há muito não ousávamos sonhar.

Desejo e penso que é possível que o ano de 2016 marque o início de um trabalho de construção de felicidade e de bem-estar para todos de que nos possamos orgulhar durante toda a nossa vida e que possa ser um exemplo encorajador para o mundo.

Usei estas mesmas palavras há dias para exprimir os meus votos no Facebook e alguns amigos acharam exagerada a referência ao “exemplo para o mundo”. Mas é isso que penso. Sei que não há nada mais mobilizador do que um desafio e não vejo nenhuma razão para que não nos disponhamos a vencer o maior desafio de todos. Ao contrário daquela visão pequenina que considera que os portugueses se devem contentar em servir bem os poderosos, não há nenhuma razão para que Portugal não se torne um exemplo na construção de uma sociedade melhor.

jvmalheiros@gmail.com

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