Empreendedorismo social ganha novas formas de financiamento

O recém-criado Laboratório de Investimento Social quer introduzir instrumentos inovadores no financiamento dos negócios que visam resolver problemas sociais.

Foto
Filipe Santos, professor de empreendedorismo no INSEAD e fundador do Instituto de Empreendedorismo Social Nuno Ferreira Santos

Há boas ideias para resolver problemas sociais que correm o risco de não passar disso mesmo. A falta de financiamento ou o défice de formação de quem tem uma ideia, mas não os conhecimentos necessários para torná-la bem-sucedida, são fatais quando se fala em projectos que visam o impacto social e não o lucro. Por isso, quando se fala em inovação social, esta tem também de aplicar-se aos instrumentos de financiamento do Empreendedorismo Social (ES).

O Laboratório de Investimento Social (LIS), lançado em Fevereiro com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian e da Social Finance UK, surge com a ambição de “casar” bons projectos de ES com investidores que valorizam o impacto social, mas que querem ter a certeza de que os seus recursos são aplicados em negócios nos quais se podem medir “a qualidade, a eficiência e a inovação”. É nesse contexto que surgem os títulos de impacto social (as social impact bonds), um mecanismo lançado pela primeira vez no Reino Unido pela Social Finance UK, que Filipe Santos, que lidera o LIS, define como “umas parcerias público-privadas [PPP] ao contrário, em que o risco fica com o privado e o benefício com o público”.

Revelando que já há “reuniões marcadas em dois ministérios” e que “existe vontade política de perceber” como funcionam estes instrumentos, Filipe Santos dá o exemplo da sua aplicação aos casos de reincidência na criminalidade de ex-presidiários. Esta probabilidade em Portugal “é de 50% e pode ter um custo para o Estado entre 40 a 50 mil euros por ano”. Se houver uma instituição que apoie esse tipo de população e aposte na reinserção e na formação, diminuindo o risco de reincidência, “a poupança para a sociedade será enorme”.

O que o LIS propõe então é a criação de um mecanismo financeiro em que o Estado celebrasse um contrato com uma entidade gestora, cujos accionistas seriam os investidores sociais. Com base nesse contrato, os accionistas financiariam (durante três a sete anos) um serviço desenvolvido por uma organização social, cuja eficiência seria medida através de parâmetros bem definidos. Se os indicadores fossem cumpridos, o Estado remuneraria os investidores (através da entidade gestora dos títulos), devolvendo-lhes o investimento inicial e uma remuneração ajustada ao risco do projecto e aos resultados. Se as metas definidas no contrato não fossem alcançadas, os investidores assumiriam o risco de perder o investimento.

A utilização destes títulos permitiria então aplicar ao financiamento público de serviços sociais uma óptica preventiva, “que evitasse um custo muito maior para a sociedade” quando se tivesse de accionar a resposta ao problema, explica Filipe Santos.

Mais fundos europeus
O objectivo deste professor de empreendedorismo da escola de negócios francesa INSEAD (e fundador do Instituto de Empreendedorismo Social, de onde emana o LIS) é “trabalhar com entidades relevantes e ter um a dois projectos-piloto dentro de um ano”, nas áreas do apoio a ex-reclusos e da empregabilidade jovem. “Há vontade política e também há fundos europeus” para desenvolver este tipo de projectos, garante o responsável do LIS, uma iniciativa a três anos, que quer ser um centro de conhecimento sobre investimento social.

Opinião idêntica tem Luís Jerónimo, que acompanha vários projectos de empreendedorismo e inovação social no âmbito do Programa Gulbenkian de Desenvolvimento Humano (PGDH). “Tudo indica que haverá mais verbas para este sector” no âmbito dos quadros comunitários de apoio, afirma. Até porque o apoio às áreas do ES e inovação Social “faz parte das directrizes da Comissão Europeia”, em linha com a estratégia Europa 2020 (que defende um crescimento sustentável e inclusivo), recorda. A Gulbenkian, que também apoia iniciativas de ES através do projecto Ideias de Origem Portuguesa (que visa envolver a diáspora em projectos nas áreas do envelhecimento activo, da inclusão social, do ambiente e sustentabilidade e diálogo intercultural), acredita que, “tão importante como o dinheiro, é a formação e o acompanhamento dos projectos ao longo das várias fases”.

É também a pensar nesta lógica de crescimento das organizações que o LIS quer lançar as sementes para outro tipo de financiamentos: “Achamos que os projectos mais comerciais, que envolvem a venda de produtos ou serviços, podem beneficiar do investimento dos chamados business angels”. Nesse sentido, o LIS está já a trabalhar com a associação do sector para encontrar um grupo de investidores “mais motivado pelo impacto social”.

Outra via é a da filantropia estratégica. “Quando falamos em associações, não podemos falar em investimento e sim em donativos, mas o que queremos criar é um compromisso de futuro”, refere. O objectivo é que grandes empresas, famílias ricas ou fundações se comprometam com as organizações empreendedoras com montantes mais elevados, num período temporal de dois, três anos, que lhes permita crescer e gerar recursos que garantam a auto-sustentabilidade. “Não como se estivessem a fazer um donativo, mas sim um empréstimo de longo prazo”, esclarece Filipe Santos.

Um grande desafio seria o de convencer as fundações em Portugal a juntarem-se para a “criação de um fundo comum de filantropia estratégica”. Ideias em cima da mesa há muitas, garante o professor de Empreendedorismo, que acredita que unir esforços é a melhor maneira de “fazer este sector acontecer”.
 
Patrocínio: BIS-Banco de Inovação Social
Os artigos sobre inovação social foram feitos segundo os critérios editoriais do PÚBLICO. O seu conteúdo é da inteira responsabilidade do jornal.

Sugerir correcção
Comentar