O mundo mudou, Sócrates não

O plano de austeridade de José Sócrates foi feito para responder às mudanças do mundo na semana de 7 de Maio, para defender a Europa e para suster os ataques sistémicos ao euro que se iniciaram na Grécia e ameaçavam varrer o continente. Quem ouviu ontem o primeiro-ministro ficou mais sábio e feliz por viver num país assim, sem os problemas "gravíssimos" de países como a Irlanda, que sabe responder aos desafios do mundo com generosidade e abnegação. Se o país vai pagar mais impostos, não é por causa da ruína das contas públicas. Na sua visão pessoalíssima, José Sócrates disse-nos que a crise só é nossa apenas porque é da Europa.

Quem esperava Sócrates combalido com os recentes avanços e recuos, enganou-se. Sócrates não pede desculpa pelo que fez e aqui esteve bem, mas não revela a verdadeira razão que o levou a fazer o que fez, e aqui esteve mal. Quem o ouviu ficou com a ideia que Portugal tem os mesmos problemas da França e está a reagir como a Alemanha ou a Holanda. O conselho europeu que lhe impôs medidas mais severas contra o défice foi "um momento de verdade", não porque aí se cristalizaram todas as dúvidas sobre a capacidade de Portugal em pagar a dívida, mas porque todos "deram conta que o euro estava a ser vítima de um ataque sistémico".

Ao relativizar o problema dizendo-o comum à Europa, Sócrates insiste na cassete do país idílico e convida-nos à ilusão. Se crescemos mais no trimestre e quebrámos menos em 2009, o que temos a recear? Ah, sim, os impostos que nos vão tornar mais pobres. Mas esse é apenas um detalhe. Na primeira entrevista depois de se ter provado que o rei vai nu, o monarca continua a pavonear-se com lantejoulas. Um problema dele que também é nosso.

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