"Numa época de crise, não revigorar a democracia é abrir brechas perigosas"

No prefácio ao livro está presente a sua crítica à mediatização da política e à falta de credibilidade dos políticos. Há mais de uma década deu a cara por uma proposta de sistema eleitoral que pretendia aproximar os eleitores dos eleitos. Como é que hoje se resolve o problema da credibilidade dos políticos?

Há muitos anos que penso, e a minha experiência autárquica só o tem confirmado, que uma das condições essenciais da credibilização da política e do reforço da confiança entre os eleitos e os eleitores é uma relação cada vez mais directa entre os eleitos e os eleitores. É essa proximidade que permite às pessoas ganhar confiança, porque têm um instrumento de responsabilização mais directo e individualizado. Isso é fundamental para revitalizar a democracia. O grau de descrença normalmente verbalizado pelas pessoas em relação ao sistema e aos políticos tem de ser combatido.

E a comunicação social?

O problema da comunicação social não tem solução, porque há uma incompatibilidade estrutural que é a seguinte: o discurso divulgado pela comunicação social tem de ser necessariamente simplificado para poder caber nas x linhas e nos x caracteres da página do jornal. As realidades políticas são cada vez mais complexas e, portanto, cada vez mais exigem a complexificação da análise, da solução e da sua explanação.

E como se restabelece a comunicação entre partidos e eleitores?

É cada vez mais cruzar os políticos e os cidadãos directamente. Multiplicar os pontos de contacto e os momentos de esclarecer e responder, de explicar, de propor e de ouvir o que as pessoas têm a dizer.

Em relação à proximidade, não considera estranho que não haja contacto entre os grupos e os movimentos sociais saídos da manifestação de há um no do 12 de Março e os partidos, nomeadamente com o PS? São pessoas que têm uma agenda política clara, querem ser representados pelos partidos, mas os estes não os ouvem.

Desde o princípio do século XX que os estudiosos apontavam para o risco de os partidos, enquanto instrumento de mediatização dos cidadãos com o sistema político, serem sucessivamente capturados por estruturas internas e irem deixando de ser espaços de cidadania. Os partidos têm feito um esforço para se tentarem reorientar, criando fundações, think tanks, introduzindo eleições primárias, introduzindo eleições directas. Têm consciência de que há um problema de representação.

Segundo o Observatório da Democracia, só 10% dos portugueses se sentem representados pelos partidos políticos.

Tenho também tido a experiência de que há também uma desconformidade entre o que é a declaração geral das pessoas em relação à política e aquilo que é o relacionamento efectivo e concreto de cada um com a política. Mas que é preciso fazer um esforço grande, é.

Portanto, os políticos têm de voltar a sair das sedes do poder, descer à cidade, ao espaço de cidadania?

Tem de se fazer um esforço de aproximação. É evidente que as novas tecnologias também criam novas possibilidades de comunicação, que têm que ser usadas. Mas temos de ter consciência de que se não fizermos um esforço de aproximação, nós não conseguiremos revigorar a democracia. E, numa época de crise, não revigorar a democracia é abrir brechas que podem ser perigosas.

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