Maior banco chinês negoceia compra de dez por cento do BCP

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Santos Ferreira está no centro da negociação com o ICBC PEDRO CUNHA

Estratégia para o BCP é um projecto que interessa a Portugal, à China e a Angola. Infra-estruturas são essenciais para a negociação relativa a Sines

O Banco Comercial Português (BCP) e o Industrial and Commercial Bank of China (ICBC) têm mantido contactos com vista à tomada de posição do maior banco chinês no capital do grupo português. O negócio deverá ser abordado entre as autoridades oficiais portuguesas e chinesas no quadro dos encontros bilaterais planeados para hoje e amanhã durante a visita do Presidente da China, Hu Jintao, a Portugal, e no próximo fim-de-semana, quando José Sócrates se deslocar a Macau.

A negociação promete ser um dos temas-chave da visita. São mais de 30 as entidades e empresas chinesas que acompanham o Presidente chinês, que chega a Portugal depois de uma visita a França, onde foram assinados protocolos superiores a 14 mil milhões de euros.

O porto de Sines é outro tema que estará em cima da mesa. Nas últimas semanas o Governo português tem estado a negociar com Governo chinês a possível entrada da China no parque logístico do porto de Sines, soube o PÚBLICO junto de fonte governamental. As negociações não estão fechadas e têm-se centrado nos últimos dias nas infra-estruturas, disse outra fonte governamental.

A contrapartida de investimentos seria a compra de dívida pública, como a China fez recentemente na Grécia. A vice-ministra dos Negócios Estrangeiros chinesa, Fu Ying, disse recentemente que a China estava disponível para comprar mais títulos do Tesouro nacional e "participar no esforço de recuperação económica e financeira de Portugal".

O PÚBLICO sabe, através de indicações do Instituto de Gestão do Crédito Público (a entidade que faz emissões de dívida nacionais), que o apetite dos investidores chineses pelas obrigações nacionais tem aumentado. Não é possível ter uma noção exacta do volume de investimento em dívida nacional, já que o grosso é feito através do mercado secundário. Numa emissão de obrigações a dez anos feita em Fevereiro, o peso dos investidores asiáticos (onde se destaca a China) era de cinco por cento, mas no mês seguinte, numa emissão a cinco anos, era de 19,5 por cento.

A entrada do maior banco chinês no maior banco privado português será uma das contrapartidas desses investimentos. O presidente do BCP, Carlos Santos Ferreira, e quadros de topo do ICBC, o megagrupo financeiro chinês, com capitais públicos, têm negociado essa aquisição. Admite-se que o ICBC possa vir a acompanhar a dimensão dos interesses angolanos, representados pela Sonangol. Detentora de mais de 10 por cento do BCP, a Sonangol já pediu autorização para reforçar essa posição até 20 por cento. E seria esta a quota que Santos Ferreira gostaria de ver o ICBC ter, para equilibrar o peso angolano. O ICBC é o maior banco comercial chinês, com 18 mil balcões, 400 mil empregados e 200 milhões de clientes.

Os contactos luso-chineses decorrem há mais de um ano. A 7 de Agosto de 2009 o PÚBLICO noticiou que as duas instituições tinham assinado "um acordo de parceria estratégica" que poderia levar à entrada do ICBC no BCP. Na altura o BCP negou os contactos. Ontem, não comentou os novos desenvolvimentos.

Caso este negócio se concretize, será a formalização de um projecto entre os três Estados: português (que está no BCP através da CGD); Angola (Sonangol) e China (ICBC). A eventual entrada do ICBC no BCP não é alheia ao crescente interesse que África tem para a China, enquanto fornecedor de matérias-primas necessárias à sua expansão económica.

Refira-se que em declarações à SIC Notícias, o presidente da Fundação Oriente, Carlos Monjardino, revelou que estavam em cima da mesa vários negócios, podendo um deles passar pela compra, por um banco chinês, de uma posição num banco português.

Um desses negócios poderá dizer respeito ao parque logístico do porto de Sines, que interessará à China depois de 2014, quando estiver concluído o alargamento do canal do Panamá, permitindo a passagem aos grandes navios porta-contentores. O PÚBLICO sabe que na próxima terça-feira uma delegação ligada ao porto de Tianjin visitará Sines, um dos raros portos na Europa (com Roterdão) preparados para receber os grandes porta-contentores. Além do terminal XXI, que está em obras de aumento da capacidade e é gerido pelas autoridades portuárias de Singapura (PSA), o porto tem também associada uma grande plataforma logística com 150 hectares que tem ainda um grande potencial de desenvolvimento.

Contactado ontem pelo PÚBLICO, o presidente da Câmara de Sines, Manuel Coelho Carvalho, lembrou que continuam a existir fortes constrangimentos no transporte de mercadorias. Em causa está a falta de uma ligação ferroviária com capacidade para transportar mercadorias em direcção à plataforma do Poceirão e daí em direcção a Espanha e à Europa.

O investimento em Sines prolongaria outros investimentos chineses em infra-estruturas de transportes. A empresa estatal chinesa Cosco tem o contrato de concessão do porto de Pireu e está a expandir o porto de Nápoles. Outro grupo chinês, a HNA, está em negociações para construir um terminal aéreo no Norte de Roma. O objectivo é criar bases logísticas de ligação da Europa à China para a sua indústria exportadora.

Para já, no quadro da visita, está prevista a assinatura de mais uma dezena de protocolos, a começar por um memorando de entendimento entre a AICEP (Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal) e a empresa chinesa de tecnologias Huawei, o maior fornecedor chinês de redes de comunicações, que já tem aliás uma empresa representante em Portugal. Em causa está a análise do aumento de investimento desta companhia, para a criação de um centro de engenharia e desenvolvimento com 50 engenheiros.

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