Unidade hoteleira ou desportiva?

1. Fundamentalmente, nas minhas aulas no curso de Mestrado de Gestão do Desporto, na Faculdade de Motricidade Humana, colocam-se questões jurídicas bem diversificadas e que se prendem com um mundo do desporto que não ganha espaço comunicacional de relevo mas que, não obstante, é da maior importância prática para esses gestores – ou futuros gestores – e para o cidadão comum. Aos tribunais continuam a chegar litígios que se ocupam de reais situações desportivas do tipo das que agora configuramos. Hoje é dia de dar conta de uma delas.

2. Portugal conta com um assinalável registo normativo relativo às condições de funcionamento de instalações desportivas de utilização pública. Desse enquadramento legal resultam um conjunto de obrigações para as entidades que se dedicam à exploração dessas “unidades desportivas”. Entre esses deveres avulta a exigência de um director técnico responsável pelas instalações desportivas e a existência de um seguro. Passemos ao caso concreto, recentemente decidido por um Tribunal da Relação.

3.Uma dada unidade hoteleira apresenta, como oferta de serviços, a utilização de ginásio, piscina, sauna e banho turco. A ASAE, em acção de fiscalização, veio a aplicar uma medida de suspensão da actividade desportiva dessa unidade hoteleira, uma vez que esse “espaço desportivo” não se encontrava sob a responsabilidade de um director técnico de instalações desportivas, nem se comprovou a existência de seguro próprio, imposto por lei.

4. Sustentou a unidade hoteleira que a existência de menos de meia dúzia de máquinas — uma passadeira, uma elíptica, uma máquina de remo, uma bicicleta, um banco e cinco colchões — para utilização pelos clientes não faz do espaço uma instalação desportiva. Trata-se, exclusivamente, de uma unidade hoteleira. Aditou que o facto de denominar o espaço como Health Club não o transforma numa infra-estrutura verdadeiramente desportiva, sendo sobretudo um nome utilizado no meio hoteleiro.

5. A primeira instância decidiu manter a medida cautelar de suspensão. O que decidiu o tribunal de recurso? O seu raciocínio – aliás, em condordância com a anterior decisão judicial – é simples e directo. A lei sobre empreendimentos turísticos permite, de facto, que as instalações para a prática de actividade física com carácter recreativo e de bem-estar integradas nesse tipo de unidades, nomeadamente piscinas, ginásios, salas de musculação ou actividades afins, campos de jogos, salas de squash, ringues de patinagem, circuitos de passeio (bicicleta, caminhada, corrida, manutenção, entre outros), quando utilizadas exclusivamente pelos hóspedes e respectivos acompanhantes, funcionem sem responsável técnico. O conceito de utentes que para aqui importa é o de hóspedes do hotel e não também todos aqueles que utilizam as demais valências do estabelecimento.

6. Porém, quando tais equipamentos venham a ser utilizados para além desse restrito tipo de utilizadores, como que se verifica uma mutação na qualificação das instalações que passam a ser consideradas, nesse segmento, como de actividade física e desportiva. Ora, no processo, ficou provado o acesso a esses equipamentos por parte de utentes de demais valências da unidade hoteleira, como sejam o bar, o restaurante e o SPA.

7. Assim sendo, e nessa exacta medida, ganha todo o espaço de aplicação a legislação sobre a utilização pública de infra-estruturas desportivas, sendo assim exigível a presença de um director técnico e a celebração de um seguro desportivo. josemeirim@gmail.com

 

 

 

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