SIC e TVI em guerra com RTP devido a jogos de Portugal no Mundial

Canal público recusa partilhar jogos da selecção nacional na prova que decorre no Brasil. Operadores privados acusam RTP de despesismo.

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A transmissão dos jogos da selecção portuguesa no Mundial do Brasil está envolta em polémica Erik Martensson/AFP

A SIC e a TVI romperam as negociações com a RTP sobre os direitos dos jogos do Mundial de futebol do Brasil, porque o operador público recusa que os operadores privados possam ficar com qualquer jogo da selecção nacional durante toda a prova. De acordo com os operadores privados, a RTP só está disponível para negociar, por leilão, os direitos de jogos de outras selecções, parte dos quais também já vendeu à Sport TV.

Perante este cenário, a SIC, do grupo Impresa, de Francisco Pinto Balsemão, e a TVI, da Media Capital, lamentam que a RTP “rejeite uma repartição equitativa dos encargos” com o Mundial pelos três operadores e acusam a TV pública de forçar os contribuintes a pagarem a factura. E rejeitaram fazer qualquer proposta nos moldes em que a RTP pretendia. Esta, por seu turno, “rejeitou liminarmente qualquer proposta da SIC e da TVI”, contam as duas televisões em comunicado.

“Ao não incluir esses jogos de Portugal, a RTP prescinde dos montantes financeiros que poderiam ser pagos pelos operadores privados e que terão, assim, de ser pagos por todos os contribuintes. Face à actual situação de mercado e numa altura em que é pedida contenção nos gastos públicos, a SIC e a TVI não compreendem como pode a RTP querer assumir, sozinha, o elevado custo dos direitos de transmissão de um Campeonato Mundial de futebol em sinal aberto”, afirmam as operadoras privadas.

A administração liderada por Alberto da Ponte enviou, na terça-feira passada, uma proposta à SIC e à TVI para o sublicenciamento dos jogos do Mundial que se realiza no Brasil em Junho e Julho que implicava um modelo de leilão entre as duas operadoras privadas e excluía, logo à partida, desse procedimento, todos os jogos da selecção nacional em qualquer etapa da prova.

Ambas as televisões rejeitaram “liminarmente” este processo porque defendem uma “repartição, em igualdade de circunstâncias, entre os três operadores”. Lembram que a RTP já vendeu parte dos direitos à cadeia de televisão paga e “parece agora estar mais interessada em controlar a concorrência dos privados do que em proporcionar o acesso livre da integralidade dos jogos do Mundial a todos os portugueses”.

 
RTP argumenta com missão e perfil de serviço público
Em resposta, a RTP emitiu um comunicado em que argumenta com a sua missão e perfil de serviço público e defende que a transmissão dos jogos da selecção é “estratégica na sua programação”, garantindo que “não abdica desse princípio”. Aliás, diz mesmo que já assegurou os direitos dos jogos da equipa nacional até 2022.

A administração liderada por Alberto da Ponte conta que a empresa disponibilizou 14 jogos do Mundial às privadas para serem adjudicados “à proposta mais elevada” e critica a resposta que obteve.

“Contrariamente ao que acontecera anteriormente, este ano e para esta competição, a SIC e a TVI juntaram-se para, em resposta a um processo transparente de concurso, reclamarem uma partilha igualitária pelos três operadores dos direitos que pertencem à RTP. Direitos que foram por esta adquiridos em sede própria e dos quais não abdicaremos, porque entendemos que, em especial, a selecção nacional tem de ser vista na televisão pública de Portugal.”

A RTP afirma que faz o sublicenciamento dos direitos com outros operadores para rentabilizar “de forma transparente” o seu investimento – mas não diz qual o montante – e salienta que o processo com a Sport TV “decorreu com total transparência e com a maior cordialidade”, numa clara crítica ao barulho feito agora pelas duas privadas.

Às críticas à sua gestão financeira, a equipa de Alberto da Ponte diz que “não aceita ingerências na gestão dos seus activos nem na forma como zela os recursos públicos vindas dos operadores privados de televisão que se movem exclusivamente por interesses comerciais”. E assegura que o Mundial de Futebol será visto “pelo maior número de portugueses ao menor custo possível”. Num comunicado com referências sentimentais à ligação entre a RTP e a selecção, o operador público fala na “ligação umbilical à selecção de todos nós” e vinca que “a nossa selecção nacional é para ser vista na RTP”.

O PÚBLICO pediu um comentário ao ministro da tutela, Miguel Poiares Maduro, sobre a questão financeira do caso, nomeadamente se a partilha dos direitos não seria o cenário mais indicado num cenário de contenção de custos do operador público, mas não obteve resposta.
 

Ou tudo ou nada
A postura da RTP contraria, realçam ainda as operadoras privadas, o modo como as televisões têm funcionado em recentes competições desta envergadura, como foi o caso do Europeu de futebol de 2012. E argumentam com a questão financeira: o esquema de distribuir os jogos por leilão poderia funcionar quando o mercado de televisão de sinal aberto movimentava 305 milhões de euros por ano, mas torna-se impossível agora, quando o mesmo mercado vale 189 milhões de euros. E também deita por terra uma espécie de acordo de cavalheiros entre os operadores que se traduziu num “esforço de convergência” e partilha dos direitos no Europeu de há dois anos.

Numa atitude de “ou tudo ou nada”, a SIC e a TVI responderam à RTP que não estão disponíveis para apresentar “qualquer proposta de sublicenciamento dos jogos do Mundial” do Brasil “enquanto esta não abdicasse da postura de leilão que queria promover entre a SIC e a TVI e enquanto não incluísse jogos da selecção portuguesa, em igualdade de circunstâncias entre os três operadores.A RTP rejeitou liminarmente qualquer proposta da SIC e da TVI.”

Ora, perante esta “intransigência da RTP” em mudar o que quer que fosse no modelo de negociação que propôs, “a SIC e TVI decidiram romper todas as negociações com a RTP com vista a uma partilha de custos do Mundial de futebol de 2014”, anunciam as privadas.

E deixam a crítica: “A RTP parece querer ignorar a dramática situação financeira que o país vive desde a intervenção da troika em 2011 e revela, mais uma vez, a sua actual vocação comercial, com prejuízo de todos, especialmente do erário público.”
 
 
 

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