Saiu a sorte grande ao desporto português?

A sorte grande do país seria uma legislatura que apostasse na massificação da prática desportiva e na conquista de resultados olímpicos na média europeia.

O desporto nacional vive o limbo tradicional das vitórias europeias antes dos Jogos Olímpicos onde a competição ditará a valia mundial do desporto nacional. Alguém deveria dizer aos políticos nacionais que muitos futuros campeões olímpicos protegem-se e não vão à competição no período pré-olímpico. O actual momento de êxtase nacional, desencadeado pela merecida vitória do futebol, pode vir a ser, como outras vezes no passado, um pico inconsequente na habitual prestação dos atletas portugueses nos Jogos Olímpicos que começam dentro de dias.

A sorte grande do país seria uma legislatura que apostasse na massificação da prática desportiva e na conquista de resultados olímpicos na média europeia.

O economista Luciano Amaral no seu livro sobre o Grupo Espírito Santo refere o encantamento social pela marca, a par da incapacidade do Grupo em liderar com competência os seus activos ao longo das décadas e ter sempre fugido a resolver os seus desafios fundamentais. O desporto português tem o futebol que a opinião pública elogia e esconde as dificuldades que deveriam ser resolvidas com coragem e eficácia. Miguel Sousa Tavares terá referido que gostava de conhecer melhor as contas do seu Porto e há sócios do Benfica e do Sporting que aspiram o mesmo em relação aos seus clubes. Duvidam dos princípios de governação de que conhecem as dívidas sem fim e os negócios com jogadores, enredados em situações que a Europa combate. Outro desafio do futebol é o efeito sistémico dos grandes clubes que contamina e prejudica várias modalidades que deles aceitam depender. As instituições do desporto têm problemas de governação e o desafio que a comunicação social deveria promover era a aposta simultânea nos bons resultados desportivos e na boa governação que os países europeus promovem. No futebol há imenso trabalho a fazer e há que investir na sua dimensão desportiva melhorando as relações entre a universidade e o associativismo criando o Modelo de Futebol Português. Os sub-17, os sub-19, os sub-21 e os seniores em homens estão a ganhar campeonatos europeus e são um pilar para o nosso futebol do século XXI.

Onde estão os exemplos de coragem política sobre situações desportivas graves?

As praxes e as claques são desafios do desporto nacional ainda sem solução. Acerca das praxes, personalidades da direita à esquerda assinaram tardiamente, para os estudantes falecidos, um pedido de alternativas às universidades. A proposta do Parlamento não tem o golpe-de-asa e a coragem do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior Manuel Heitor que corta cerce, referindo que se trata de práticas fascizantes. A carta aberta "Integração no ensino superior: a democracia faz-se de alternativas", fala em alternativas e não aponta que são o desporto, a cultura, a ciência, ou outros, os sectores que geram valores sociais, éticos, civilizacionais, o saber-perder e saber-ganhar, a criação do amor-próprio e do querer nacional, e a melhoria do bem-estar e da produtividade.

Quais as necessidades do desporto?

O investimento em todo o desporto beneficia o futebol e o país. Investe-se mais no futebol e, por vezes, às escondidas porque o dinheiro não dá para tudo… dizem. O desporto necessita de investimento inovador direcionado aos jovens e segmentos da população carenciados. As estatísticas do desporto e a Conta Satélite do Desporto sugerem que a produção desportiva pode duplicar para atingir a média europeia. A Conta Satélite aponta que o associativismo desportivo é o produtor que gera 269 milhões de euros de Valor Acrescentado Bruto, os ginásios têm 72 milhões de euros, a produção informal chega aos 123 milhões de euros. As relações associadas aos sectores não-desportivos são da ordem dos 902 milhões de euros de VAB. As análises europeias sobre o impacto induzido do investimento em desporto apontam para retornos de 1,91 euros por cada euro investido ou, em termos equivalentes, o capital social gerado representará 60% a 80% da riqueza real gerada nos países desenvolvidos.

As convulsões sociais europeias, aliadas aos desafios sistémicos nacionais alertam para a emergência da intervenção no desporto nacional que seja esclarecida por parte de instituições como o Parlamento e a Presidência da República.

O Ministro Manuel Heitor destaca-se pela coragem dos grandes campeões. De quem não tem audição no desporto, deixo-lhe a sugestão de investir na criação de clubes de desporto, cultura e ciência nas universidades e que estes clubes tenham uma valoração no respectivo desempenho. Que dessa qualificação façam parte as boas infraestruturas desportivas e os índices de ocupação reais, a classificação nos campeonatos federados nacionais e internacionais, os campeões criados e os meios humanos envolvidos no desporto universitário. 2 Vectores do desporto universitário são fulcrais: a massificação da prática, incluindo alunos, professores e administrativos, e a especialização no alto rendimento. A criação de parcerias com clubes de base e federações desportivas qualificaria o desempenho universitário.

Economista, fjstenreiro@gmail.com

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