“O Mundial só nos demonstrou que estamos no caminho certo”

Se 2014 ensinou uma coisa aos responsáveis pelos Jogos Rio 2016, foi aquilo que não se devia fazer. O vice-director geral do comité organizador, Leonardo Gryner, garante que está tudo “dentro do prazo e do orçamento”.

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A lagoa Rodrigo de Freitas vai receber provas de canoagem e remo Ricardo Moraes/Reuters

Mais do que uma aprendizagem, o Mundial 2014 serviu de exemplo para os responsáveis pelos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro — a experiência do ano passado mostrou sobretudo o que não fazer. Os dois eventos só são comparáveis nas audiências televisivas, sublinhou ao PÚBLICO o vice-director geral do comité organizador dos Jogos Rio 2016, Leonardo Gryner: "Em tudo o resto, a escala dos Jogos é muito superior". Apesar disso, frisou, "conseguimos chegar a este ponto dentro do prazo e dentro do orçamento, o que exigiu muita disciplina". O Rio de Janeiro prepara-se para ser palco do maior evento desportivo do planeta e os preparativos correm aparentemente sem sobressaltos.

"A fase mais crítica das obras está a terminar. E as infra-estruturas urbanas estão já na recta final ou em processo de entrega. O prazo mais apertado é o da extensão da linha nova do metro, que vai entrar em operação para a população em Junho do ano que vem. Para nós vai ser muito tarde, mas ainda são dois meses antes do início dos Jogos", sublinhou Leonardo Gryner, prometendo que "não haverá" obras a decorrer durante a competição.

O aparente controlo da situação reflecte o método de trabalho do Comité Olímpico Internacional (COI), apontou: "Na fase de candidatura exige-se um projecto concreto, suportado por garantias para tudo o que se promete fazer. Pelo contrário, a FIFA não exige muito de um país candidato à organização do Mundial. O Brasil foi escolhido em 2007 para organizar o Mundial 2014 e só em 2009, dois anos depois, seleccionou as cidades-sede. Perderam-se dois anos da preparação".

A organização dos Jogos 2016 evitou fazer igual. Tudo começou com um projecto cuidadosamente elaborado. "O Rio candidatou-se aos Jogos 2004 e fomos eliminados. Na altura, o Comité Olímpico do Brasil decidiu que não se candidataria a 2008, e que era mais importante candidatar-se aos Jogos Pan-Americanos [de 2007], para criar infra-estruturas, aprender a lidar com um evento desta complexidade, e depois sim qualificar-se para uma candidatura olímpica. Foi um projecto de mais de 16 anos. Começou em 1999, quando houve essa decisão de não concorrer a 2008", recordou.

"Há obras que levam muito tempo: cinco anos não dão para fazer um metropolitano, começando do zero. Essa é uma diferença importante do COI, que exige um projecto bem detalhado. Todas as nossas instalações já têm proprietário para depois dos Jogos e um uso destinado. O Mundial só nos demonstrou que esse é o caminho certo. Mas não é que tenhamos aprendido com eles, é porque o COI tem exigências diferentes", frisou Leonardo Gryner.

A contestação popular que antecedeu o Mundial 2014 chegou a preocupar os responsáveis pelos Jogos 2016, mas Gryner realçou que "mesmo no meio daquela convulsão, não havia oposição aos Jogos". "Há dois factores que explicam isso: os Jogos estavam longe e as pessoas ainda não pensavam nisso. Por outro lado, a população entendia claramente quais os benefícios que os Jogos iam trazer. E, já naquela época, em Junho de 2013, estávamos a entregar legado. Não era uma promessa, as coisas já estavam a acontecer. Hoje temos um apoio da população de 67% e uma oposição de 12%, o que é muito baixo para um evento deste tipo, em comparação com edições anteriores", vincou.

Pensar o legado foi a forma de evitar deixar "elefantes brancos" para trás. "Todos os projectos foram pensados para ter uso posterior. Onde não havia essa possibilidade ou interesse, estamos a fazer recintos temporários", explicou Leonardo Gryner. A este junta-se outro tipo de legado: "Queremos mostrar que é possível fazer os Jogos cumprindo o que estava no orçamento de candidatura. A tendência é sempre fazer as coisas um pouco maiores do que o necessário, porque isso mexe com a imagem do país. Nós não nos deixámos levar e mantivemos uma disciplina rígida ao longo de todo o processo", explicou o responsável. Por uma questão de racionalidade: "Se os Jogos continuassem na tendência de ficar cada vez mais caros, poucos países poderiam executá-los. Todos entenderam isso e dispuseram-se a ajudar nesta redução de custos. O nosso orçamento é metade do de Londres 2012".

Outra herança que os Jogos 2016 deixarão ao Rio de Janeiro é uma baía de Guanabara (onde vão decorrer as provas de vela) mais limpa. "Em 2007, quando estávamos a montar o projecto, só 11% dos esgotos lançados na baía eram tratados. E nós comprometemo-nos a que, até 2016, 80% dos esgotos seriam tratados antes do lançamento na baía. Segundo dados do mês passado, hoje 51% tem tratamento. Este esforço só está a ser feito por causa dos Jogos. O lado mau é que ainda vamos ter 20% de resíduos por tratar. Mas chamou-se a atenção para um problema no qual ninguém queria tocar, porque era muito complexo", notou Gryner.

Parte dos custos serão assumidos por privados, destacou ainda o vice-director geral do comité organizador. "Temos uma relação de recursos públicos e privados de 43%-57%", apontou Leonardo Gryner, destacando a importância das parcerias público-privadas para a construção de alguns recintos e infra-estruturas urbanas. "A razão deste sucesso é que foi pensado o legado, e o sector privado só está onde tem interesse no legado."

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