O efeito de uma janela nas “chicotadas” psicológicas

Sepp Blatter chegou a sugerir um período de “transferências” para treinadores, mas a ideia nunca saiu ?da gaveta, com técnicos e clubes a assinarem cláusulas de rescisão e a decidirem o melhor timing.

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AFP

A rescisão de José Peseiro, no Sp. Braga, a oitava “chicotada” da época só na I Liga, e a sua substituição por Jorge Simão, responsável técnico do Desp. Chaves, recupera uma sugestão polémica do antigo presidente da FIFA, Joseph Blatter, de criar uma “janela” de mercado para treinadores, tal como existe para os jogadores de futebol.

A ideia de limitar a um período específico, previamente definido, a possibilidade de trocar de “timoneiro” não parece ter recolhido muitos simpatizantes na altura. A inversa foi bem mais notória, com Sam Allardyce — recentemente destituído no cargo de seleccionador de Inglaterra — a opor-se veementemente a um cenário que, no entender de “Big Sam”, só contribuiria para aumentar a instabilidade e o caos no futebol, fragilizando ainda mais a posição dos técnicos.

Sem garantias de que tal medida viesse a contribuir para uma redução dos despedimentos, “educando” os dirigentes e inibindo-os de ceder ao impulso de fazer estalar o “chicote” a quente, depois de um resultado frustrante, a tentativa de concentrar a valsa de técnicos num determinado intervalo de tempo nunca passou de um esboço.

Actualmente, clubes e treinadores encontraram na figura da cláusula de rescisão um mecanismo eficaz para resolver crises como a que rebentou na “Pedreira” e que desencadeou uma onda que atingiu o Desp. Chaves. O acordo entre todas as partes é sempre uma possibilidade, desde que os interesses de cada um sejam salvaguardados. Mas isso não trava o efeito dominó que ameaça deitar por terra todo o projecto desenvolvido em Chaves, clube recém-chegado à elite e que agora se vê na contingência de ter de descortinar um plano B.

Nada que não tenha acontecido no passado recente com outros protagonistas e emblemas. Quando um clube de maior dimensão atravessa uma crise, cede não raras vezes à tentação de seduzir o treinador que naquele momento se destaca, ou que por um trajecto mais ou menos meteórico desperta a cobiça do mercado.

Aconteceu, por exemplo, com Álvaro Magalhães, há 16 anos, quando o actual treinador do Gil Vicente tinha 39 anos. Depois de na época de 1999-2000 ter alcançado, naquela que foi a sua primeira passagem por Barcelos, um surpreendente quinto lugar (igualmente num clube que nesse ano regressava ao primeiro escalão), o antigo internacional português foi catapultado para o mediatismo enquanto treinador principal em início de carreira. Algo que não passou despercebido a Pimenta Machado, então presidente do Vitória. Em Novembro, Álvaro Magalhães mudava-se para Guimarães, para substituir Paulo Autuori, herdando um plantel que tentou moldar, sem sucesso, e acabando por dar um passo maior do que a perna.

Hoje, Álvaro Magalhães reconhece que se precipitou na decisão e que acabou por cometer o maior erro da carreira de treinador. “Era jovem e ambicioso e pedi ao presidente para me libertar do compromisso que tinha com o Gil Vicente. O Vitória era um clube de grande dimensão, inclusive a nível europeu. O problema foi o momento e a escolha do plantel, que não foi minha. A ambição acabou por trair-me”, recorda ao PÚBLICO, imaginando um percurso diferente.
Arrependimento que uma eventual janela de mercado poderia ter evitado, caso tivesse imposto um timing diferente.

Uma ideia que deixa Álvaro Magalhães a reflectir. “Não sei. É discutível. Teria que ser muito bem analisado. Hoje em dia existem as cláusulas, que prevêem um cenário de saída a troco de uma compensação financeira. Há uns anos não era uma preocupação comum. É sempre um passo importante e tem que ser dado pela certa e não por instinto. Mesmo no caso dos jogadores, os períodos de transferência causam sempre constrangimentos. Hoje não teria feito o mesmo”, assume.

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