“Não há quem manda ou não manda. Será um trabalho de equipa”

O novo treinador principal da selecção nacional de râguebi admite que ficou surpreendido pelo convite

Na primeira entrevista após ser nomeado treinador principal da selecção nacional de XV, João Luís Pinto admite que ficou surpreendido por ter sido escolhido por Tomaz Morais, Director Técnico Nacional (DTN), para o cargo. O ex-treinador da Agrária de Coimbra, de 42 anos, que já fazia parte da estrutura da Federação Portuguesa de Rugby (FPR), onde liderou as selecções de Sub-18 e Sub-19, diz ainda que após o Mundial 2007 alguns jogadores pensaram que “não era preciso trabalho”, mas mostra-se confiante nas novas gerações.

Após seis anos nos escalões de formação da FPR, foi nomeado treinador principal da selecção de XV. Foi uma surpresa?

Sim, não estava equacionado.

Foi uma escolha pessoal do Tomaz Morais. O que lhe pediu o DTN?

Pediu-me para fazermos um bom trabalho. Temos um ano para provar que podemos dar continuidade ao trabalho feito nos últimos seis anos. Juntamos uma equipa multidisciplinar e alargada para alcançar bons resultados.

Há cerca de um mês o presidente da FPR afirmou que o Tomaz Morais iria regressar ao relvado e o DTN confirmou que voltará ao terreno. Estas declarações não o fragilizam?

De maneira nenhuma. Como é que podemos ficar fragilizados quando trabalhamos com alguém que foi nomeado para melhor treinador do Mundo? Pelo contrário, até ajuda a nossa função e o nosso trabalho. O Tomaz vai trabalhar comigo como fez nos últimos quatro anos, onde tudo sempre foi discutido e planeado. Nos dias em que for necessário e ele achar por bem estar no campo para aplicar alguma técnica ou táctica estará. Os conselhos dele são sempre válidos e tidos em conta.

As convocatórias e o sistema de jogo serão responsabilidade do treinador ou do DTN?

Isso são questões internas. O DTN tem o papel de aprovar ou não o modelo de jogo que a equipa técnica delinear e mediante essa aprovação será colocado em prática. Não há quem manda ou não manda. Será um trabalho de equipa.

O contrato do Tomaz Morais termina dentro de um ano. Sensivelmente na mesma altura acaba o actual mandato da direcção da FPR. Isto faz de si um seleccionador a prazo? É um problema?

De maneira nenhuma. É um desafio que aceitei com essas condicionantes. Não vejo qualquer problema. A nova direcção que vier tem que ter a liberdade de escolher quem quer a treinar.

Após o Mundial 2007, aumentou o número de clubes, de jogadores e as condições de trabalho melhoraram, mas os resultados de Portugal pioraram. A que se deve este retrocesso?

Os outros países evoluíram. Olhamos só para dentro e esquecemo-nos do que se passa lá fora, onde a Roménia fechou os jogadores no seu campeonato profissionalizando-os e a Geórgia profissionalizou-os em França. Nós, devido ao país que temos, não os podemos profissionalizar e tentamos um semiprofissionalismo que não foi conseguido.

Foi uma aposta falhada?

Precisávamos de mais para alcançar esse patamar. Os clubes também não conseguiram dar o salto após o Mundial. Não havia estruturas e treinadores para dar atenção aos jogadores que surgiram. Aumentamos a qualidade, mas os outros aumentaram três vezes mais.

Há matéria-prima para iniciar uma renovação na selecção já a pensar no Mundial 2019?

Sim, há. Era esse o nosso objectivo: deixar já preparado o caminho para 2019. Hoje em dia os jogadores chegam à selecção melhor preparados física e tecnicamente. Isso fará com que se conseguiam integrar melhor no nível sénior e que produzam mais.

Alguns jogadores que estiverem no Mundial 2007 afirmam que falta espírito de sacrifício e alma às novas gerações…

Não vejo as coisas assim. Os tempos são outros. Hoje os miúdos têm muitas solicitações fora do râguebi e estamos a comparar o auge que atingimos com um princípio. Apenas um ano depois de o Tomaz Morais assumir a selecção é que começou a haver a vontade e o querer de representar Portugal. Depois do Mundial havia quem pensasse que o comboio já estava a andar e era só dar um passo para entrar e que depois não era preciso trabalho. Houve um período sem grande alma e chama para representar Portugal. Estes miúdos que estão a surgir já não têm a imagem de 2007 e sabem que é preciso trabalhar.

O último jogo da selecção foi em Março, contra a Espanha. Considera aceitável que jogadores fundamentais tenham ficado fora da convocatória e que nesse mesmo dia tenham alinhado pelos seus clubes, em França?

Não é obviamente aceitável, mas nem sempre temos força para impedir isso. Vamos tentar dialogar com os clubes franceses. Mas são profissionais e pode haver chantagem da entidade patronal...

Esse diálogo foi tentado no passado com pouco sucesso e não impediu, por exemplo, que jogadores abandonassem o estágio de preparação dessa partida frente à Espanha após receberem um telefonema dos seus clubes, a três ou quatro dias do jogo…

Não tenho conhecimento disso. O que posso dizer é que já trabalhei com alguns jogadores luso-descendentes que me disseram que por Portugal jogam sempre.

Alguns desses atletas que falharam a partida contra a Espanha não eram luso-descendentes. Nasceram em Portugal. Admitindo essa chantagem francesa, considera possível construir uma equipa mudando de XV jogo após jogo?

É impossível. Se os jogadores começarem a mudar a meio do campeonato por vontade deles ou dos clubes é difícil. Só se formos treinadores do RC Toulon, onde podemos ter um XV todas as semanas. É por isso que continuamos a apostar no Projecto Academia que, se for bem trabalhado, nos deixará menos dependentes dos jogadores que alinham no estrangeiro.

Em 2014 Portugal venceu apenas um jogo no Torneio Europeu das Nações. Qual é o objectivo para 2015?

O objectivo mínimo será vencer a Alemanha, a Espanha e a Rússia e vamos tentar criar alguma surpresa contra a Roménia e a Geórgia.

Vai assumir a selecção de XV num ano em que a prioridade será dada aos sevens…

Sim, isso é fundamental.

O Torneio Europeu das Nações voltará a coincidir com etapas do Circuito Mundial. Ao contrário do que aconteceu até agora, o XV será prejudicado…

O Projecto Olímpico ainda está a ser delineado, mas há um grupo de jogadores nucleares que, penso eu, nem vão jogar pelos seus clubes. Isto está bem definido e organizado. Estamos a estruturar tudo para separar o XV dos sevens.

Há condições para isso?

Temos que ir por isso caminho. Teremos o dobro do trabalho e teremos que procurar jogadores em mais clubes, para que subam de rendimento, fazendo-os trabalhar nas Academias de Lisboa, de Coimbra e do Porto. Não dará resultados amanhã, mas dará resultados. Os sevens estão a movimentar muito dinheiro e onde há movimentação de dinheiro há interesse. Se há interesse, há procura de jogadores e essa é uma nova realidade com que os clubes terão que se deparar.

Leia a entrevista completa em p3.publico.pt/raguebi

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