Mentes brilhantes

Certo dia, um camarada que passou pela imprensa desportiva contou-me que era comum, naquela época pré-Internet, receberem chamadas para a redacção de leitores com dúvidas futebolísticas. Entre quem venceu a Taça de Portugal na época 1982-83 e qual foi o melhor marcador da II Divisão em 1979-80, os jornalistas lá tinham de satisfazer a curiosidade alheia. Mergulhavam então em jornais antigos, em anuários perdidos num arquivo poeirento ou em cassetes VHS com a vã esperança de não terem sido regravadas.

Tudo mudou com a base de dados virtualmente infinita hoje à nossa disposição. Mas por isso mesmo é com crescente assombro que olho para os adeptos de futebol que dispõem de uma memória prodigiosa para factos que alguns hereges apelidam de “inúteis”.

Há inutilidade em saber a composição da linha avançada da selecção brasileira campeã mundial em 1970 ou a marcha do marcador do Portugal-Inglaterra no Euro 2000? Ou saber quem era o treinador do Celtic na final da Taça dos Campeões de Lisboa, em 1967, ou quem marcou o golo que deu a única Taça de Portugal ao Beira-Mar?

Talvez sim, seja algo inútil. Se pudéssemos gerir o nosso cérebro como se de um computador se tratasse, poderíamos apagar essas memórias ditas inúteis e gravar conhecimentos realmente importantes: aprender centenas de receitas económicas; dominar o mandarim ou o hindi; preparar os melhores gins da actualidade.

Talvez haja alguma equipa de cientistas a preparar este admirável mundo novo, em que o saber futebolístico que não serve a ninguém é substituído por gigabytes de informação útil para nos tornarmos pessoas melhores. Para já, que nos contentemos em saber fazer uma omelete e recordemos aquele golo mítico do Ricardo Sousa.

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