Enquanto estiver a ler este artigo, ele já ganhou 320 euros*

É o jogador de futebol mais bem pago do mundo e, a cada segundo, uma pessoa, algures no planeta, segue-o nas redes sociais. No dia 9 estreia o filme Ronaldo.

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É o arquétipo moderno do deus Apolo e personifica, como mais ninguém no futebol actual, o lema olímpico “mais rápido, mais alto, mais forte”. Para os fãs, é também o mais belo, um boneco Ken de carne e osso. Aos 30 anos, Cristiano Ronaldo, o jogador de futebol de origem humilde e a quem só falta um grande título com a selecção nacional, escreve um novo capítulo na sua vida, lançando-se no mundo dos negócios por conta própria. O avançado do Real Madrid não esperou, como vaticina o ditado, pela vida que começa aos 40 ou pela reforma que inevitavelmente condena, a essa idade, a carreira da maior parte dos desportistas. Ronaldo está um passo à frente de todos nós, comuns mortais: ele é mais rico, mais poderoso e mais famoso do que qualquer outro futebolista e do que muitas celebridades de Hollywood e este é, provavelmente, o momento na sua vida pessoal e profissional em que se sente mais confortável com o estatuto que alcançou em 20 anos a dar chutos na bola.

Há muitas pistas que o comprovam. No último Verão, Ronaldo começou a partilhar fotos da sua vida privada no Instagram: as brincadeiras com o filho de cinco anos, Cristiano Jr., a iguaria que comeu ao jantar, selfies na cama antes de dormir, fotos no jacto privado ou em frente a um dos seus bólides e o convívio com amigos. “Com o nascimento do primeiro filho e com a conquista da terceira Bola de Ouro, prémio que ambicionava e que lhe fugia há alguns anos, Ronaldo ficou mais tranquilo. A idade e a experiência trazem também outra maturidade, apesar de o Cristiano ser ainda uma pessoa muito expressiva e até polémica”, analisa Daniel Sá, director-executivo da escola de marketing IPAM, que, desde 2011, faz um estudo anual sobre o valor da marca Ronaldo.

Na sua carreira de duas décadas (assinou aos dez, em 1995, pelo Nacional da Madeira), o funchalense sempre se associou a dezenas de marcas e patrocinadores, nos quais se destacam a Nike, que lhe paga anualmente nove milhões de euros pelos direitos de imagem e pelo uso do nome “CR7” numa colecção de chuteiras e vestuário desportivo. Até há dois anos, a marca “Ronaldo” ou CR7, em resultado do investimento a solo do jogador, não existia. Hoje em dia, está presente em mais de 160 países e em diferentes ramos de actividade. “É um passo muito arriscado e arrojado por parte do Cristiano lançar as suas próprias marcas. Eu acho que só é possível seguir sozinho porque o nome CR7 é muito forte”, afirma Daniel Sá.

Na semana passada, a revista Forbes divulgou o ranking de desportistas com a marca pessoal mais valiosa. Ronaldo é o primeiro futebolista da lista e o oitavo entre todos os desportistas do mundo (atrás dos jogadores de golfe Tiger Woods e Phil Mickelson, do mago da NBA LeBron James, do tenista Roger Federer, do jogador de críquete Mahendra Singh Dhoni, do recordista mundial dos 100 e 200 metros Usain Bolt e do basquetebolista Kevin Durant).

Em praticamente todos os estudos que analisam a performance dos “homens da bola” dentro e fora dos relvados, o internacional português bate recordes. Num trabalho divulgado em Junho, a Repucom, empresa de estudos de mercado, conclui que 92% das pessoas em todo o mundo sabem quem é Ronaldo e 68% gostam do melhor marcador da história “merengue”. Em sete países — Portugal, Espanha, Brasil, México, Turquia, Argentina e Itália — mais de 96% da população reconhece CR7. A Forbes coloca-o ainda no 10.º lugar no seu Top 100 Celebridades, logo abaixo de Robert Downey Jr e Taylor Swift.

Sendo “Ronaldo o português mais conhecido no mundo e a marca portuguesa mais valiosa”, na perspectiva de Daniel Sá, não é surpreendente esta sua faceta empreendedora, que resultou no lançamento de cinco marcas próprias — CR7 Underwear, CR7 Footwear, CR7 Shirts (camisas e roupa formal), a linha de perfumes Legacy e os auscultadores criados em parceria com a Monster. Em simultâneo, o jogador reduz o número de patrocinadores, de 15, em 2014, para os seis actuais: Nike, TAG Heuer, Pokerstars, Herbalife, Sacoor e Clear Champô. “Sem ter ainda os cálculos para este ano, o valor da marca Ronaldo vai, com certeza, continuar a aumentar. Só em 2015, ele lançou várias marcas próprias, ganhou a Bota de Ouro, tornou-se o maior marcador de sempre do Real Madrid e vai ter um filme sobre a sua vida. O princípio é simples: quanto maior a visibilidade, maior o impacto e o valor da marca”, explica o director do IPAM.

A equipa de designers, produtores e gestores que trabalha com o actual detentor do FIFA Ballon d’Or garante que a criação dos produtos CR7, nesta altura da carreira do atleta, não é uma jogada mirabolante mas apenas a concretização do desejo antigo do atleta em criar marcas que reflectem os seus gostos pessoais, sobretudo na moda.

Michael Alstrup, o CEO da dinamarquesa JBS, que possui as licenças, fabrica e distribui todos os produtos da linha CR7 de roupa interior e de vestuário, recorda por email: “Ronaldo e a sua equipa contactaram-nos depois do lançamento da colecção e da campanha que criámos para [a tenista] Caroline Wozniacki. Achou os produtos muito bonitos e pouco tempo depois assinámos contrato.” No primeiro ano com Ronaldo (2013), a JBS teve um aumento gigantesco nas vendas. “Éramos uma ‘grande’ [as aspas são do entrevistado] empresa escandinava que chegava a seis mercados e, de repente, tornámo-nos uma firma global com distribuidores em mais de 50 países”, adianta Alstrup. O volume de negócios cresceu de tal forma que a empresa desistiu de Wozniacki para “se focar na linha de Ronaldo”, que é também vendida pelo site oficial para 160 países. O antigo jogador do Sporting e do Manchester United aprova todas as colecções e participa na criação do design dos produtos.

Entre treinos e jogos, Ronaldo está ainda “envolvido a 100 por cento” na concepção da sua linha de sapatos masculina, desenhada e distribuída pela Portugal Footwear e produzida em fábricas da região norte. “Cada modelo comercializado tem o seu ‘dedo’. Ele faz questão de escolher e opinar sobre todos os produtos. E como patriota que é quis que as colecções tivessem o selo exclusivo de Portugal”, diz Sandra Guimarães, directora de comunicação da CR7 Footwear. A iniciativa de lançar em 2015 uma marca de calçado não partiu do jogador, mas de uma proposta feita pela Portugal Footwear à Gestifute, empresa que gere a sua imagem e carreira. Com preços entre os 75 e os 600 euros, os sapatos CR7 são vendidos em quatro lojas exclusivas da marca no Irão, Egipto, Coreia do Sul e Finlândia, no site e em lojas multimarca em mais de 30 países, Portugal incluído.

Vários media nacionais e internacionais noticiaram que a entrada de Ronaldo na indústria do calçado terá enfurecido a Nike, sobretudo porque o avançado português pretendia desenvolver uma colecção de sapatilhas, o que o colocaria em directa competição com um dos seus mais antigos patrocinadores. O gigante dos equipamentos desportivos, classificado pela Forbes como a marca mais valiosa do mundo neste ramo, numa curta declaração que enviou na terça-feira à Revista 2, diz somente que “Ronaldo é um atleta fenomenal”, que sente “orgulho” pela parceria de 12 anos com o galáctico do Real Madrid e que “aguarda com expectativa as futuras colaborações” com o jogador português.

Só esta semana, na sua conta de Instagram, Ronaldo promoveu, em meia dúzia de fotos, a sua nova colecção Outono-Inverno de calçado, a sua marca de camisas e a de auscultadores, os produtos da Nike e o seu patrocinador mais recente, a Pokerstars. Desde que começou a partilhar imagens captadas com o seu telemóvel e a participar mais activamente na rede social das fotos (assumindo, por vontade própria, a tarefa que estava a cargo da Gestifute), o capitão da selecção nacional conquistou, num abrir e fechar de olhos, milhões de seguidores, ultrapassando Neymar, que era, até 17 de Outubro, o desportista mais popular. As fotos favoritas dos 34,5 milhões de fãs são as de pai e filho, Cristiano sénior e júnior, com números sempre muito próximos de 1,5 a dois milhões de “gostos”. No Facebook, ultrapassam os 4 milhões.

Com mais esta proeza, o companheiro de equipa de Gareth Bale e James Rodríguez torna-se o rei absoluto das redes sociais. É a pessoa mais popular do mundo no Facebook com 107 milhões de fãs e, no Twitter, é o desportista com mais seguidores — 38,5 milhões. Uma audiência planetária de 180 milhões de pessoas que lhe permite passar uma factura de 230 mil euros por cada tweet patrocinado e de 130 mil por cada post no Facebook em que menciona um dos seus sponsors.

“As marcas estão muito atentas à presença online e a muitos outros parâmetros. Cristiano Ronaldo gera 102 milhões de referências nas pesquisas do Google e tem mais seguidores no Facebook do que a Coca-Cola. As marcas usam os seus patrocínios nos desportos massificados para chegar facilmente a muita gente”, refere o especialista de marketing do IPAM.

A London School of Marketing, também contactada pela Revista 2, adianta que as empresas gastam anualmente quase 500 milhões de euros para patrocinar os 100 atletas mais bem pagos do mundo. “Há quatro motivos que tornam apelativo o investimento nas estrelas do desporto: “A audiência massificada que segue os atletas; os valores que lhes são atribuídos — honestidade, dedicação, trabalho árduo; a validação da marca enquanto produto real e autêntico, sobretudo para as etiquetas desportivas; e a possibilidade de conquistar o público mais exigente — os homens na faixa etária entre os 16 e os 30 anos.”

É precisamente esta franja de mercado que a TAG Heuer quer atrair com o seu patrocínio ao dianteiro com mais hat-tricks na história da Liga espanhola. “Quando o novo presidente da TAG, Jean-Claude Biver, chegou à empresa em 2014 estabeleceu como nova estratégia a conquista de um público mais jovem. Para além de ser o melhor jogador da actualidade, o Cristiano Ronaldo é um líder muito poderoso entre os jovens e um ícone de moda. É uma pessoa muito simpática e acessível, que traz espontaneidade, frescura e alguma loucura, no bom sentido, à marca. A sua personalidade e o seu alcance nas redes sociais estão em sintonia com o que a TAG procura”, explicou, numa conversa pelo telefone, Valérie Servageon, directora de marketing da empresa e do grupo onde se integra, a LVMH — Louis Vuitton Möet Hennessy.

Em homenagem ao craque madeirense, o relojoeiro suíço baptizou um relógio da linha “Fórmula 1” com o seu nome. É uma edição limitada com um custo de 1200 euros, preço muito acessível para os padrões de uma marca dita de luxo. “O relógio do Ronaldo é uma tentativa de reposicionamento da TAG. É uma porta de entrada no mundo do luxo para os jovens de 20 ou 25 anos que não podem comprar relógios de cinco mil euros mas que gostam de produtos que sejam vistos como luxuosos.”

Ronaldo gosta de relógios de outro nível: “Com diamantes, turbilhão e grandes complicações mecânicas.” A marca já lhe ofereceu várias peças por obrigação contratual e presenteia-o com um relógio nas ocasiões especiais: aniversários, entregas de prémios (recebeu um Carrera Heuer 01 na recente cerimónia da Bota de Ouro). E, sempre que participa em eventos mediáticos, a TAG disponibiliza-se para emprestar relógios que combinem com a indumentária do jogador.

Apesar das mordomias e da sua fortuna, Ronaldo não esquece as raízes humildes. No capítulo da solidariedade, o internacional português é também recordista, contrastando com a percepção negativa que muitas pessoas ainda têm do português. De acordo com a ONG norte-americana Do Something, é o desportista mais solidário do mundo, não só pelo seu potencial na angariação de fundos através das redes sociais, como também pelos seus donativos (entregou, por exemplo, 150 mil euros ao centro de investigação do cancro que tratou a mãe, Dolores Aveiro).

A organização Save The Children, tendo conhecimento do interesse de CR7 pelas causas humanitárias, integrou o atleta na sua lista de embaixadores. “Ele é pai e um defensor entusiasta dos direitos das crianças. Sabe que precisam de crescer num ambiente saudável, forte e protector. Por isso, usa a sua voz e visibilidade para ajudar na luta contra a fome infantil e obesidade e para chamar a atenção para as crianças afectadas por desastres naturais e crises humanitárias. Ronaldo tem uma das maiores audiências do planeta e, quando fala, as pessoas correspondem”, assinala Ajla Grozdanic, directora de comunicação da organização nos EUA.

O jogador merengue — salienta a representante — “arranja tempo na sua apertada agenda desportiva para se encontrar com crianças inseridas nos programas da Save The Children. Ouve as suas histórias inspiradoras e torna realidade um dos sonhos destes meninos e meninas: conhecer o seu herói”.

* 32 euros por minuto para dez minutos de leitura deste artigo, calculados a partir do salário-base de 17 milhões de euros pago anualmente pelo Real Madrid, ainda sem bónus. O jogador ganha obviamente mais de 32 euros por minuto mas não é possível determinar exactamente quanto porque todos os outros rendimentos são variáveis. 

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