Presidente do Uruguai denuncia "ataque contra os pobres" no castigo a Suárez

José Mujica diz a FIFA não perdoa as pessoas que vivem "naturalmente as rebeldias e as dores dos que vêm de baixo". Diego Maradona afirma que só falta enviarem o avançado para a prisão de Guantánamo.

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Adeptos uruguaios esperaram Luis Suárez no aeroporto em Montevideu Carlos Pazos/Reuters
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Suárez é um herói nacional no Uruguai Miguel Rojo/AFP
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Adeptos aproveitam um cartaz com a imagem de Suárez para brincar com o incidente YASUYOSHI CHIBA/AFP
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O italiano Giorgio Chiellini mostrou a marca da dentada Tony Gentile/Reuters

A mordidela mais famosa do momento vai desaparecer rapidamente das conversas de café em quase todo o mundo, mas há um país em que o caso assumiu importância de Estado e está a suscitar debates sobre hipocrisia e moral. Numa reacção ao castigo aplicado ao avançado Luis Suárez, o Presidente do Uruguai, José Mujica, acusou a FIFA de estar a perseguir um símbolo dos pobres, um jovem que "cresceu no campo, que é um rebelde e que expressa a sua raiva de forma natural".

O comentário do chefe de Estado uruguaio foi feito durante o programa de televisão de Diego Armando Maradona, o "De Zurda", em que o antigo astro argentino e o locutor e apresentador Víctor Hugo Morales também teceram duras críticas à sanção decretada pela FIFA.

Por ter mordido o ombro do defesa italiano Giorgio Chiellini, o avançado uruguaio foi proibido de representar a sua selecção durante os próximos nove jogos e foi suspenso de todas as actividades relacionadas com o futebol profissional até Novembro. Por outras palavras, Luis Suárez está proibido de treinar e de jogar pela sua selecção e pelo seu actual clube (o Liverpool) ou por qualquer outro clube, e também de entrar em estádios de futebol durante os próximos quatros meses.

A questão já não é se Luis Suárez deveria ou não ser castigado – ao contrário do que defendiam até ao anúncio da FIFA, personalidades como o Presidente do Uruguai e o antigo futebolista Diego Maradona admitem agora que o jogador poderia até ter sido expulso no jogo contra a Itália e afastado do jogo dos oitavos-de-final contra a Colômbia, mas a dimensão do castigo deu origem a toda uma nova discussão.

Quando Maradona defendeu que houve casos mais graves em outros jogos deste Mundial de futebol sem que a FIFA tenha agido disciplinarmente (salientando a cotovelada de Neymar no croata Luka Modric, que valeu ao brasileiro apenas um cartão amarelo), o Presidente do Uruguai concordou e avançou uma explicação.

"Não há dúvidas sobre isso, porque vimos todos os jogos e este castigo é diferente. E isso é o que causa mais indignação e o que mais dói", lamentou José Mujica.

Para o Presidente do Uruguai, o castigo aplicado a Luis Suárez resulta de um afastamento em relação à vida dos mais desfavorecidos, porque foi aplicada por pessoas que "nasceram noutra sociedade e que têm outros recursos".

"Sentimos que isto é um ataque contra os pobres, porque estes golpistas não lhe perdoam [a Luis Suárez] o facto de ele não ter frequentado uma universidade, de não ter tirado um curso, e de viver naturalmente as rebeldias e as dores dos que vêm de baixo. Não entendem nada, não perdoam."

"Muitos dos jogadores geniais nascem nas entranhas da pobreza. Eles não percebem e não querem perceber, porque nasceram noutra sociedade, têm outros recursos. Mas sejamos leiais com os nossos até ao fim", concluiu o Presidente José Mujica, enquanto esperava a chegada do avançado uruguaio no Aeroporto Internacional de Carrasco, em Montevideu.

O castigo aplicado pela FIFA foi também muito criticado por Maradona e pelo anfitrião do seu programa "De Zurda", o locutor e apresentador Víctor Hugo Morales.

"O que dói é que cortam a carreira a um jovem que cometeu um erro. Que o castiguem, mas que não exagerem e que não se armem em moralistas", disse Maradona. "Quem é que ele matou?", questionou o antigo jogador. "Só falta algemá-lo e levá-lo para Guantánamo, para junto dos terroristas."

"Se as mordidelas da FIFA contassem, muitos deles estariam na Sibéria", concluiu Víctor Hugo Morales.

Jogador italiano apela a redução do castigo
Para além da defesa feita pelo Presidente do Uruguai e por Maradona, Luis Suárez recebeu nesta sexta-feira um apoio totalmente insuspeito: a própria vítima da mordidela, o italiano Giorgio Chiellini, criticou a punição decretada pela FIFA.

"Não tenho em mim quaisquer sentimentos de felicidade, de vingança ou de raiva contra Suárez por causa de um incidente que aconteceu no decorrer do jogo. Apenas persiste a raiva e a desilusão por causa do jogo [que os italianos perderam 1-0]", escreveu Chiellini.

"Neste momento, o meu único pensamento vai para o Luis e para a sua família, porque vão enfrentar um período muito difícil", salientou o jogador.

Apesar de considerar as medidas disciplinares da FIFA "inequívocas", o italiano que foi mordido por Luis Suárez defende que "a fórmula proposta é excessiva".

"Espero sinceramente que ele seja autorizado, pelo menos, a ficar junto dos seus colegas de equipa durante os jogos, porque uma suspensão desse tipo é realmente alienadora para um jogador", concluiu o defesa italiano, referindo-se ao facto de Suárez ter sido proibido de entrar em estádios de futebol durante os próximos quatro meses.

Esta é a terceira vez que Luis Suárez morde adversários em jogos de futebol: em 2010 mordeu o médio holandês Otman Bakkal no ombro (sete jogos de suspensão), e em 2013 mordeu o sérvio Branislav Ivanovic no braço (dez jogos de suspensão). Foi também suspenso por oito jogos e multado em 40.000 libras (50.000 euros) por insultos racistas proferidos contra o jogador francês Patrice Evra.

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