"As pessoas estão mais bem preparadas para mim do que estavam há dois anos"

O PÚBLICO termina nesta sexta-feira a publicação de uma série de entrevistas aos candidatos aos órgãos sociais do Sporting. A quarta é a Bruno de Carvalho, líder da Lista B ao Conselho Directivo.

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"As pessoas estão mais bem preparadas para mim do que estavam há dois anos" Paulo Curado e Ricardo Rezende, Ricardo Rezende

Bruno de Carvalho, de 41 anos, empresário e presidente da Fundação Aragão Pinto, uma entidade de solidariedade social, acredita que tem um projecto capaz de inverter a tendência de resultados negativos que o futebol do Sporting tem acumulado. Para a SAD, promete um grupo de investidores que falam português.

A experiência da última campanha eleitoral está a ser útil nestas eleições?
Sim, tem-me dado mais tranquilidade perante aquilo que são campanhas obscuras que estão a ser feitas aqui no Sporting. Já é algo que estava à espera, mas tenho conseguido passar aos sportinguistas aquilo que realmente sou. Nas últimas eleições, demonstrei algum nervosismo, porque não estava à espera daqueles ataques a nível pessoal e de carácter, que nunca me tinham acontecido.

Qual é o seu projecto financeiro e plano de gestão para o Sporting?
Para começar, quero garantir que todas as questões de tesouraria estão perfeitamente asseguradas. A reestruturação financeira tem a ver, em primeiro lugar, com um plano absolutamente credível e rigoroso a nível de gestão e de finanças e com objectivos muito concretos e bem definidos. Já fizemos a sua apresentação aos parceiros credores do Sporting, a nível da banca, que os aceitou muito bem. A partir daqui, conseguiram-se duas coisas: primeiro, a garantia de fazer face aos encargos que temos neste momento com salários e dívidas; em segundo, vamos conseguir uma reestruturação da dívida.

Em que moldes?
Os moldes que estão em cima da mesa são a fusão [entre a Sociedade Anónima Desportiva (SAD) e a Sociedade Património e Marketing (SPM), detentora do Estádio José de Alvalade], que irá resolver tanto a questão dos capitais negativos, como irá iniciar a possibilidade de nós começarmos a cumprir os requisitos do fair-play financeiro impostos pela UEFA.

Mas foi contra esta fusão quando a anterior direcção a propôs e fez aprovar em assembleia geral. Por que mudou de opinião?
Mudei num aspecto. Não concordava com a fusão nos moldes em que foi apresentada. Ela é um elemento apenas de uma necessidade de reestruturação da dívida. Em segundo lugar, pela forma como estava delineada, iria provocar um problema ao clube, porque o que se propunha era transpor da SPM o estádio para a SAD, mas mantendo no clube a dívida que estava associada a este activo, de 120 milhões de euros. Eu, o que critico são processos ad hoc, avulsos. Por isso é que nós apresentámos um processo de reestruturação vocacionado para resolver as questões do Sporting Clube de Portugal e da Sporting SAD. Assim, esta fusão já faz sentido, sem provocar um problema financeiro ao clube, deixando-o sem capacidade para o liquidar.

Que outras propostas implicam essa reestruturação?
Associada a esta fusão, pretendemos o alargamento do prazo para o pagamento da dívida para mais 40 a 60 anos. Com isto, teremos uma necessidade mais pequena mensal para fazer face aos nossos encargos, para assim cumprir com os mesmos, fazer o pagamento das nossas despesas correntes (salários e dívidas) e fazer crescer o clube e a SAD, o que não tem acontecido. Em terceiro lugar, temos de resolver a questão dos VMOC [Valores Mobiliários Obrigatoriamente Convertíveis]. São 55 milhões de euros [que foram lançados pela SAD e adquiridos pelo BES e BCP] que representam 67% da SAD. Nós não queremos perder a maioria de capital da SAD e não o vamos permitir.

Como o irão garantir?
Através de um aumento de capital, o que irá diminuir este peso percentual dos VMOC. Outra das nossas medidas será a entrada de parceiros financeiros no capital da SAD, com um investimento de 15 a 20 milhões de euros. Este plano de reestruturação tem de ser visto de forma integrada. Uma outra medida está relacionada com a própria reestruturação de custos, que terá muito enfoque na parte dos recursos humanos, e com o aumento de proveitos. Como nós sabemos, nos últimos dois anos, os salários na SAD passaram para 42 milhões de euros, quando os seus proveitos totais são de 38 milhões. Connosco, não haverá “vassouradas”, revoluções ou despedimentos colectivos, mas uma negociação funcionário a funcionário, departamento a departamento. O nosso objectivo é que, no primeiro ano de mandato, os custos não ultrapassem 90% dos proveitos e que sejam reduzidos a 60% ao fim de três anos. No primeiro ano, fizemos uma projecção conservadora e temos previstos 40 milhões de receita.

Já tem assegurados esses parceiros financeiros para entrar no capital da SAD?
Estamos a falar de um grupo de investidores e, neste caso, provêm de um país que fala português, mas não posso adiantar mais nada.

Afasta qualquer cenário que envolva um PER [Processo Especial de Revitalização] ou insolvência?
Afasto, porque qualquer destas hipóteses colocaria o Sporting numa situação quase catastrófica. As entidades bancárias com quem estive reunido nunca abordaram a questão do PER. A dívida acumulada do Sporting é de 430 milhões de euros (aproximadamente 200 milhões do clube e 230 milhões da SAD) e o que os nossos credores pretendem é ser ressarcidos e, para tal, precisam de um clube que cresça e tenha sucesso desportivo para poder honrar esses compromissos.

José Couceiro encara essas possibilidades?
O José Couceiro diz que o problema do Sporting não é dinheiro, mas apenas um problema de gestão desportiva. Isso é não ter noção nenhuma daquilo que se está a passar e de quem não está preparado para ser presidente. Se não houver dinheiro, não há gestão desportiva. A impreparação de José Couceiro fica evidente quando faz a sua lista pressionado, em 48 horas, não apresentando um responsável financeiro. É evidente que há alguém que está na sombra a dizer-lhe, e mal, aquilo que ele deve fazer em termos financeiros. Ele é testa-de-ferro dessas pessoas, que têm contribuído para que o Sporting passasse de um passivo de 40 milhões para 430 milhões de euros.

Está a falar da banca?
Não vamos confundir banca com pessoas que podem estar ligadas à banca, auditores ou consultores. Pessoas que têm sido o poder-sombra no Sporting nestes últimos anos. É esta continuidade que os sportinguistas não querem.

As sondagens indicam que ainda não convenceu os sócios mais antigos, com maior número de votos…
Acho que as sondagens que foram publicadas querem provocar um pouco a sensação que isto está tudo equilibrado [as intenções de voto em Bruno de Carvalho e José Couceiro], mas, não sendo hipócrita, não sinto este equilíbrio em lado nenhum. Admito que há uma faixa de sócios que ainda não me conhece, que é reticente à minha candidatura, mas temos sentido um grande apoio.

Como vai inverter a tradição de resultados negativos associada à SAD?
Com o meu projecto, a SAD irá distribuir dividendos no ano 2022-23 e não será preciso uma revolução, mas uma reestruturação e uma implementação de um modelo desportivo. Com estas medidas, será possível ter uma SAD equilibrada, com resultados positivos e que seja forte desportivamente. É a nossa missão.

Vai promover uma auditoria de gestão?
Sim. Até agora, foi só feita uma auditoria financeira. Vou tentar explicar a diferença aos sportinguistas. Imagine que me vendem uma garrafa de água por um milhão de euros, existindo factura, recibo e cheque da transacção. Para uma auditoria financeira, este processo está totalmente correcto. Mas imagine que a garrafa tinha apenas um valor de 50 cêntimos e não de um milhão. Nesse caso, queremos perceber o que é que se passou. Pode haver casos de gestão danosa e acredito que, num passivo que aumentou de 40 milhões de euros para 430 milhões, eles possam mesmo existir. Isto só será revelado com uma auditoria de gestão, que irá permitir fazer as pazes com o passado. Os culpados, se os houver, terão de ser responsabilizados por todas as vias legais até às últimas consequências.

Está hoje melhor preparado do que há dois anos para ser presidente do Sporting?
Estou perfeitamente elucidado daquilo que é o Sporting, como o estava na primeira candidatura. Já sabia qual era a realidade financeira do clube. As pessoas é que estão hoje mais bem preparadas para mim. Muita gente teve noção que eu caí aqui de repente, mas não caí. Há anos que colaboro com o Sporting e de forma muito activa. O que consegui agora fazer é demonstrar a paixão e o conhecimento profundo que tenho do clube.     

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