A farsa de Mané Garrincha

Tenho para mim que tudo começou a correr mal quando alguém se esqueceu de explicar duas coisas simples no balneário da selecção portuguesa. Jogar futebol no Brasil é o nosso equivalente àquelas gigantes pirâmides humanas. Estamos lá, no topo, às costas de tantos. Se mesmo assim os “índices de suspeição lesional” persistissem, havia que mostrar por quem se jogava. Era fácil. No primeiro jogo Merkel estava na bancada.

O espírito de Mourinho não passou por Salvador, Manaus ou Brasília (a voz andou por aí, mas nem me lembro do que disse). Cedo ficámos à mercê de uma constituição clara, daquelas que agradam aos contabilistas. O princípio da igualdade era o goal average. Ficamos sempre com défice. “Saldo negativo”, escreveram os oráculos (uma bela metáfora) da TV, para nos consolar com a normalidade.

A moral desta história está num texto quase tão antigo como a nossa relação com o Brasil. Mais quero asno que me leve que cavalo que me derrube, conclui A Farsa de Inês Pereira. Antes lebre que leão. Antes (…) que (…).

Paulo Bento leu Gil Vicente. A federação leu-o também. Nós decorámos esta subtil ironia e transformámo-la em ética. Repetimos o gesto: o dedo indicador que puxa a pálpebra para baixo, de cada vez que temos de escolher. De outra forma, como explicar o País? 

Pois assim se fazem as coisas, não é? Pois assi se fazem as cousas, canta Inês, às cavalitas do marido, em coro com Pero, que na farsa não tem tempo (nem nos descontos) para perguntar, como Scolari, “e o burro sou eu?”. Daqui a quatro anos há Mundial, e para o Europeu faltam só dois. Para o ano há outra vez eleições. Em Setembro há primárias. Em Outubro há Orçamento. E amanhã, assim, as coisas…

Sugerir correcção
Comentar