A “equipa de plástico” que voa na Bundesliga

A incrível ascensão do RB Leipzig, desde a base da pirâmide do futebol alemão até aos lugares que dão acesso à Liga dos Campeões.

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ODD ANDERSEN/AFP

As Alemanhas uniram-se em 1990, mas o futebol nunca foi uma junção de partes iguais. Na primeira Bundesliga unificada, apenas estavam duas equipas da República Democrática da Alemanha e, nos anos que se seguiram, um total de quatro andaram entre os grandes do futebol alemão – o Energie Cottbus, em 2009, foi a última. Leipzig foi uma cidade da RDA que teve alguns clubes na Obberliga e chegou a ter um clube na Bundesliga durante uma época (1993-94), o VfB. Em 2016-17, a cidade voltou a estar representada no topo do futebol alemão, mas a equipa que está a surpreender a Bundesliga apareceu em 2009. Chamam “equipa de plástico” ao RB Leipzig porque foi criada, não pelo associativismo popular, mas por uma empresa.

A empresa em causa é a Red Bull, que produz a bebida energética mais famosa no mundo e que tem uma presença forte no desporto, sobretudo nos desportos motorizados e radicais, mas também no futebol, controlando várias equipas em quatro continentes, os New York Red Bulls, os Red Bull Salzburg, os Red Bull Brasil, os Red Bull Gana e este RB Leipzig, que tem o nome da empresa em iniciais e não por extenso. O que a torna num “case study” no futebol mundial é que esta equipa, com a ajuda da carteira recheada da Red Bull, teve promoções consecutivas desde a sua fundação (em que começou na quinta divisão) até à Bundesliga, onde está em terceiro lugar, com os mesmos pontos do segundo (Colónia) e a dois pontos do líder (Bayern Munique), um desempenho que, em sete jornadas disputadas, a deixa em lugares de qualificação para a Liga dos Campeões.

Está a ser o melhor arranque de sempre para uma equipa estreante na Bundesliga, com quatro vitórias e três empates, resultados que incluem, por exemplo, triunfos sobre o Borussia Dortmund e o Wolfsburgo. Só que este RB Leipzig não é visto como uma espécie de Leicester City alemão e, por certo, não arrastará tanta simpatia como o inesperado campeão inglês da última época. Porque é um clube sem tradição cujas origens nem sequer estão na cidade que actualmente representa e porque tem o dinheiro que quer – gastou 50 milhões em reforços para esta época, o quarto maior valor entre os clubes da Bundesliga.

Depois de ter olhado para os clubes da cidade (e chegaram a falar com o St. Pauli, de Hamburgo, mas, dada a natureza do clube, era esperado que não desse em nada), a Red Bull acabou por decidir-se por um clube dos arredores, o SSV Markrandstad. Adquiriu os seus direitos desportivos, mudou-lhe o nome e o sucesso foi imediato, com quatro promoções em apenas sete anos. O clube tem mão empresarial total e os adeptos não têm qualquer voto em qualquer matéria relacionada com o clube. Mas isso não quer dizer que o RB Leipzig não tenha adeptos. Num campeonato em que os estádios têm o bom hábito de estarem cheios, o Red Bull Arena anda próximo de lotações esgotadas – média de 40 mil espectadores por jogo num estádio com capacidade para 42 mil.

Os adeptos dos outros clubes odeiam o RB Leipzig e as manifestações deste sentimento são frequentes. Num jogo da Taça da Alemanha com uma equipa da ex-RDA, o Dínamo de Dresden, os adeptos do Dresden atiraram uma cabeça de boi para o campo (e festejaram, depois, o apuramento nos penáltis). Os que apoiam o RB Leipzig defendem-se com o facto de não serem a única equipa do futebol alemão a ser abertamente dominada por empresas, apontando o Wolfsburgo (pelo construtor automóvel Volkswagen) e Bayer Leverkusen (pela farmacêutica Bayer) como exemplos. Indiferente às críticas, o RB Leipzig vai crescendo, o seu projecto desportivo vai dando frutos e vai continuar a ter asas enquanto o mundo continuar a beber Red Bull.

mvaza@publico.pt

* Planisférico é uma rubrica semanal sobre histórias de futebol e campeonatos periféricos

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