A selecção portuguesa já tem cognome e está prestes a ter um estilo: "Jogar bom futebol"

De partida para a África do Sul, Carlos Queiroz inspirou-se nos Descobrimentos e baptizou os seus jogadores de "navegadores"

Em 1487, Bartolomeu Dias e um pequeno grupo de aventureiros contornaram um cabo rochoso e ventoso na tentativa de encontrar um caminho marítimo até à Índia. Vasco da Gama segui-lhes as coordenadas em 1498. Ontem, cerca de 512 anos depois, Carlos Queiroz cumpriu uma tradição e baptizou a selecção nacional, evocando os Descobrimentos. Na África do Sul vão jogar "os navegadores".

No século XV os portugueses foram os primeiros a atingir o Sul de África e não mostraram muito interesse no território, meramente estratégico. Hoje, a viagem da selecção portuguesa de futebol será mais rápida, mais directa e igualmente interesseira. Conquistar o Mundial (ou algo parecido) e voltar.

Ontem, o próprio Carlos Queiroz lançou o cognome da comitiva, justificando-o assim: "Pelo tributo que temos de fazer aos nossos antepassados e à maior epopeia da história dos portugueses. Dividiram o mundo ao meio com a Espanha e chegaram ao Japão. Temos ali um simbolismo, mas acho que o termo navegadores adaptava-se mais a esta circunstância de jogarmos na África do Sul, num sitio onde dobrámos aquele cabo".

Na despedida de Portugal, Queiroz falou de "Boa Esperança", de "Adamastores", até de "Velhos do Restelo". "A nossa campanha permite falar mais em Cabo de Boa Esperança do que em Adamastores. Prefiro abordar o Cabo da Boa Esperança como símbolo de motivação, de atracção e de desafios". A seleccção partiu ao som de vuvuzelas e com a sensação de missão cumprida, mesmo no que diz respeito à cativação de adeptos para a aventura que começa dentro de dias - o jogo com a Costa do Marfim está marcado para o dia 15. "Há uns que estão. A grande maioria está com a selecção. Alguns poderão ter hesitações e há aqueles que, aconteça o que acontecer, nunca estão. A teoria dos Velhos do Restelo não fui eu que criei, vem do tempo dos Adamastores. Aqueles que não querem estar que não estejam, respeitamos isso. Não há problema. Temos a maioria connosco. Temos milhões de emigrantes que sabem o que é sofrer, temos milhões em Portugal".

Na despedida, nem tudo são rosas (Nani, por exemplo, sofreu um traumatismo no ombro e, por precaução, foi poupado aos exercícios), mas Carlos Queiroz, "muito satisfeito", "muito orgulhoso", falou de "profissionais fantásticos". "Foi fácil", disse. "Com os profissionais fantásticos que temos, é mais fácil trabalhar". Puxou a fita atrás e não se mostrou minimamente arrependido pelas opções tomadas. "Quando tomei a decisão de trazer estes 23 jogadores tinha toda a confiança e a certeza que era o grupo de trabalho certo para preparar esta competição. Hoje essa confiança elevou-se a um patamar diferente. O comportamento e empenho dos jogadores tem sido fantástico, sem competição entre eles, mas com um enorme respeito uns pelos outros", referiu a propósito.

Pormenores e Drogba

Hoje, já na África do Sul, começa "uma etapa completamente diferente": "preparação", "melhoria dos detalhes", "constituição da equipa final" e "análise pormenorizada do primeiro adversário", a Costa do Marfim, muito provavelmente órfã de Didier Drogba, ainda que essa não seja uma preocupação de Queiroz. "Quando grandes jogadores estão fora do maior espectáculo do futebol mundial, é sempre uma pena. Mas, neste momento, só pensamos na nossa equipa. Não me interessa se o Drogba joga ou não, é uma pena para o Mundial, mais importante é termos o nosso estilo".

E esse estilo já existe? Queiroz repetiu a expressão várias vezes. "Quanto mais impusermos o nosso estilo, mais eles vão ter problemas", disse. "O jogo é nosso e o estilo vai ser o nosso", prosseguiu. "Não quero jogar à inglesa, à alemã ou à brasileira, quero que se jogue como sempre jogaram as equipas portuguesas. Não quero que se abdique do nosso estilo". Que é... "jogar bom futebol".

"O trabalho", diz Queiroz, "está à vista". Cristiano, Simão, Nani, Deco... "Só pode surpreender aqueles que acham que a vida é feita de passes de mágica. Tudo resulta de trabalho, aplicação e de tempo". Se o Mundial começasse já amanhã, Portugal "não estaria preparado". Mas o Mundial não começa amanhã. "Temos três dias de adaptação à atmosfera. Dia 9 estarão todos aptos", assegurou.

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