Tenor Carlo Bergonzi, um dos grandes intérpretes de Verdi, morre aos 90 anos

Passou por Lisboa várias vezes para cantar em diversas óperas no Teatro de São Carlos

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Bergonzi numa das suas interpretações de uma ópera de Verdi, no Met, em Nova Iorque Louis Mélançon/Metropolitan Opera

Morreu em Milão, aos 90 anos, o italiano Carlo Bergonzi, e o mais importante intérprete verdiano [das obras de Giuseppe Verdi] do século, nas palavras do diário La Repubblica.

Bergonzi, que nasceu em Vidalenzo, perto de Parma a 13 de Julho de 1924, iniciou os estudos como barítono no Conservatório de Parma, aos 14 anos. Durante a II Guerra Mundial, então com 19 anos, esteve detido num campo alemão, mas no final do conflito regressou a Itália e prosseguiu os seus estudos em Parma.

Estreou-se no final da década de 1940 como barítono, no papel de Figaro na ópera O Barbeiro de Sevilha, de Rossini. Depois de participar em várias outras óperas como barítono, estava convencido de que não conseguia fazer mais com a sua voz, mas durante uma récita de Madama Butterfly, em Livorno, consegue no camarim atingir o difícil Dó do final do primeiro acto, o que o faz concluir que o problema estava na abordagem vocal que tivera até então.

Assim, no início da década de 1950, inicia-se como tenor; em 1953 apresenta-se pela primeira vez no La Scala de Milão, e em 56 pisa o palco da Metropolitan Opera de Nova Iorque para cantar Aïda. Segue-se uma longa série de apresentações nos maiores palcos do mundo. Passa por Lisboa várias vezes durante a sua carreira, tendo cantado no Teatro de São Carlos diversas óperas. Em 1982, cantou La Traviata, numa apresentação que o jornal Sete na época classificou como “extraordinária” e de “maravilhosa de pureza”.

Terá sido também em Lisboa, mas anos antes, que, segundo contou numa entrevista, tomou a decisão de não voltar a cantar a ópera Don Carlo. Depois de vários anos em que “era o Don Carlo por excelência”, decidiu que não o cantaria mais “porque o tenor nunca recebia aplausos” e isso deixava-o “nervoso”.

Explicou que o público era importantíssimo para ele. “Quando o público era frio – mesmo que as críticas fossem boas – sabia que algo não estava bem”. Reconhecia, nessa conversa, que tinha tido “grandes noites, noites médias e outras más” e recordava um momento particularmente doloroso no Met de Nova Iorque, em 1959, quando um golpe de ar no camarim antes de entrar em cena o deixou sem voz. “Quando abri a boca para cantar saiu um som completamente rouco. Uma experiência como essa é como a morte que chega e te sufoca.”

Cantou com as grandes divas do seu tempo, de Maria Callas a Montserrat Caballé. E, embora se tenha destacado como um dos maiores intérpretes de Verdi (há quem o considere o maior), o seu repertório inclui mais de 60 papéis, muitos dos quais em óperas de outros autores como Rossini, Donizetti, Bellini e Puccini.

Disse um dia noutra entrevista que as óperas de Verdi são particularmente difíceis para os tenores porque têm quase sempre uma ária logo no início, o que não lhes dá tempo para aquecer a voz – esse é um trabalho tem que ser feito antes de entrar no palco, ainda no camarim.

Em Itália houve alguns desentendimentos, nomeadamente pela forma como foi recebida uma sua interpretação da Aïda no Teatro Regio de Parma. Conta o La Repubblica que Bergonzi só “fez as pazes com os seus concidadãos” em 2004, quando o Teatro Regio lhe dedicou uma noite para celebrar o seu 80.º aniversário.

Terminou a carreira artística em 1995, com uma série de concertos em Viena, Nova Iorque, Milão e Paris, e em 2000 surgiu a notícia de que ia apresentar Otello em Nova Iorque, mas acabou por não conseguir cantar até ao fim, tendo que ser substituído. Depois de se retirar passava a maior parte do tempo no seu hotel em Busseto, que baptizou como I due Foscari, em homenagem à ópera de Verdi com o mesmo nome, e onde funciona a Accademia Verdiana. 

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