“Se o que se passou em Mr. Robot acontecesse na vida real, seria o caos”

A rodagem da segunda temporada da série já arrancou e para já só há uma certeza: vai ser intenso, outra vez. Quem o diz é o actor Martin Wallström, o ambicioso e assustador Tyrell Wellick.

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Martin Wallström destaca o bom argumento da série e a preocupação com a aproximação à realidade DR

Ainda a digerir o final da primeira temporada de Mr. Robot, a série de televisão que surpreendeu tudo e todos no último ano e que agora se destaca nesta época de prémios, falámos com Martin Wallström. Ou seja, Tyrell Wellick, o homem que vai ganhando destaque ao longo da série de Sam Esmail e que tem tanto de assustador como de misterioso. Sobre o que aí vem, o actor sueco pouco pôde dizer mas a garantia é de que a loucura vai continuar, agora que o mundo ficou mais caótico.

Antes de mais, é preciso fazer um alerta aos leitores: se ainda não viu Mr. Robot, a série protagonizada por Rami Malek e Christian Slater, ou se ainda não chegou ao fim dos dez episódios, não quererá, provavelmente, ler o que aí vem. Não é possível escrever este texto sem que alguns spoilers sejam feitos, até porque Martin Wallström torna-se peça fulcral da trama, como perceberá quando acabar a primeira temporada. Na televisão portuguesa, o último episódio foi para o ar esta sexta-feira (TVSéries), pretexto para falarmos com o actor sueco que nos atendeu o telefone em Estocolmo, numa pausa entre temporadas.

A primeira pergunta é inevitável, depois do confuso e indesvendável fim do décimo episódio. Elliot Alderson (Malek), o engenheiro de segurança informática com uma vida dupla, trabalhando de dia numa grande empresa de segurança cibernética em Nova Iorque quando à noite se transforma num hacker implacável com sede de justiça e ansioso por derrubar o sistema financeiro, atinge o seu objectivo. Derruba a multinacional E Corp (ou Evil Corp, como lhe chama) e apaga as dívidas de todos os cidadãos – mas, infelizmente para nós, o rapaz não se lembra de nada, apenas de que não estava sozinho. Tyrell Wellick estava com ele, mas não só não está mais ali como ninguém sabe do seu paradeiro. Foi quanto bastou para que nas redes socias se criasse todo um movimento à procura de respostas. Mas o que é que aconteceu? Onde está Tyrell Wellick?

“A única coisa que posso dizer é que esta é uma série com muitos, muitos segredos e reviravoltas e este é mais um deles. Acho que é isso que a série tem de tão bom”, começa por dizer Wallström, garantindo que nada mais poderá adiantar. E não é por não saber, uma vez que o criador de Mr. Robot, Sam Esmail, já esclareceu que todos os seus actores estão informados sobre o futuro das suas personagens. É assim nos filmes, porque não seria na televisão? “Seria estranho mantê-los no escuro”, disse Esmail em Outubro num painel sobre a série em Nova Iorque, contando que para si Mr. Robot é um filme dividido em temporadas – espera conseguir contá-lo em quatro ou cinco.

Wallström diz ter percebido que esta se tratava de uma série diferente assim que fez a audição para o papel do jovem cego por poder, capaz de fazer qualquer coisa para subir na vida, até mesmo matar. “Achei logo que alguém tinha posto um grande pensamento nisto. Ao fim de dez episódios, o que podemos dizer é que a série está muito bem escrita e é tão imprevisível”, conta o actor, exemplificando com o seu papel. “Ele parece o vilão óbvio, mas as pessoas parecem gostar dele na mesma e isso é fruto de um bom argumento”, continua, destacando ainda “a interessante relação” que Wellick mantém com a sua mulher Joanna, interpretada pela actriz dinamarquesa Stephanie Corneliussen. “No início parece que é o Tyrell quem está no comando, mas à medida que a temporada avança percebe-se realmente que ela é que está no controlo e que ele começa até a vacilar.”

O fã Edward Snowden

Quando, há mais de um ano, o elenco se juntou para ver o episódio-piloto, as reacções foram entusiásticas, mas o sucesso que Mr. Robot alcançou  tem 98% de aprovação no agregador de críticas Rotten Tomatoes e entrou em quase todas as listas das melhores séries do ano – não era algo que imaginassem. “Toda a gente dizia que era excitante e que podia ser qualquer coisa, mas acho que ninguém alguma vez esperou que a série conseguisse este sucesso tremendo”, diz Martin Wallström. “Não que não acreditássemos que era bom, mas já havia tanta televisão por aí”, continua Martin Wallström, com a certeza de que Mr. Robot veio abanar os canais de televisão tradicionais.

Apostas em produções mais arrojadas, especialmente tratando-se de conteúdos originais, têm partido frequentemente de serviços de streaming como o Netflix ou a Amazon, por não estarem dependentes de receitas publicitárias. E por isso, destaca o actor, “linguagem, nudez ou cenas explícitas” não os preocupam como preocupam os canais comuns. “Foi uma mudança para o USA, que assumiu esta série mais obscura”, diz o actor, com a esperança de que outros canais sigam este caminho. Apesar de muito ousado, o statement resultou”, explica Wallström, defendendo que “parte da surpresa das pessoas surgiu por ser uma aposta do canal USA”. “Agrada-me que tenha quebrado as suas próprias regras.”

A aproximação à realidade, no que ao tema da pirataria diz respeito, tem sido também uma das críticas positivas a Mr. Robot, que já conquistou o título da melhor série no género. “O que eu acho que é extraordinário é que nada em Mr. Robot é falso. Tudo o que vemos acontecer é feito e existe. Não há um ecrã verde, nada disso. Isso foi uma parte muito importante para nos ligarmos ao público-alvo e às pessoas que estão dentro do assunto. Ver que para eles isto era real foi grande parte do sucesso que a série teve”, diz o actor. Lembra que Sam Esmail teve a preocupação de ter sempre na rodagem especialistas informáticos. “Mostravam-nos como fazer as coisas e explicavam-nos como é toda esta tecnologia funciona até realmente percebermos.”

Edward Snowden já fez saber que é fã. “Sentimo-nos obrigados a ser rigorosos. Começámos assim, ainda antes do sucesso da série, e por isso é importante continuar. Não dá para fazer de outra forma.”

E pode um hacker salvar o mundo, como Elliot tanto deseja? “Nós falámos sobre isso  se o que se passou em Mr. Robot acontecesse na vida real, seria o caos. Mas se tens alguém como os Anonymous a declarar guerra ao Estado Islâmico, então tenho a certeza de que conseguem fazer a diferença. Ainda assim, talvez não seja lá grande ideia fazer no mundo real o que Elliot fez na série”, aponta Wallström, para quem a personagem que valeu a Malek uma nomeação para os Globos de Ouro (Slater também foi nomeado, tal como a própria série, na categoria de Drama) é em “muito semelhante às histórias de vigilantes como o Batman”.

E o que se segue agora? O que podemos esperar dos novos episódios que chegarão novamente no Verão? “A primeira temporada foi tão imprevisível que eu gostava que essa imprevisibilidade continuasse. Esse é o meu desejo.”

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