Obama lamenta “erro” da Sony e promete responder “proporcionalmente” à Coreia do Norte

Presidente dos EUA confirma que norte-coreanos estiveram na origem do ataque informático à Sony.

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O Presidente Barack Obama responde às perguntas sobre a Sony REUTERS/Larry Downing
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Barack Obama REUTERS/Larry Downing

O Presidente dos EUA, Barack Obama, confirmou esta sexta-feira que a Coreia do Norte foi responsável pelo ataque informático à Sony Pictures e disse mesmo que o estúdio cometeu “um erro” ao suspender The Interview, a sátira no centro das ameaças dos hackers. E prometeu: “Responderemos proporcionalmente e num local e num momento que escolheremos.”

Numa conferência de imprensa que começou com um balanço do Presidente sobre o ano de 2014 para os EUA em vários quadrantes, do diplomático às questões internas, e que prosseguiu sobre as novas relações dos EUA com Cuba, a primeira pergunta para Obama foi sobre o ataque de hackers à Sony Pictures – um acto sem precedentes contra uma empresa nos EUA e que levou ao cancelamento do filme cuja estreia estava prevista para o dia de Natal nos EUA (e para 29 de Janeiro em Portugal). O ataque revelou conteúdos de dezenas de milhares de emails, libertou informações estratégicas da empresa, filmes e guiões para a Internet, bem como dados pessoais de milhares de funcionários — tudo com o objectivo de impedir que The Interview, sobre uma tentativa de assassinato do líder norte-coreano Kim Jong-un, fosse lançado. 

E Obama foi taxativo ao responder a uma pergunta sobre se a decisão do estúdio de retirar o filme foi correcta: “A Sony é uma empresa, sofreu danos significativos”, admitiu o Presidente norte-americano, que manifestou a sua solidariedade com o estúdio. “[Mas] sim, acho que cometeram um erro.” “Gostava que tivessem falado comigo primeiro. Ter-lhes-ia dito para não entrarem num padrão no qual são intimidados [num ataque deste tipo].”

“Não podemos ter uma sociedade em que um ditador algures começa a impor censura aqui nos EUA. Porque se alguém é capaz de intimidar as pessoas para impedir o lançamento de um filme satírico, imaginem o que farão quando for um documentário de que não gostam, ou de notícias de que não gostam”, disse Barack Obama na Casa Branca. Aludiu ainda ao risco adicional de este tipo de ciberterrorismo levar à “autocensura [por parte dos produtores e distribuidores], porque não querem ofender a sensibilidade de alguém cuja sensibilidade franca e provavelmente precisa de ser ofendida”.

Esta tarde, um diplomata norte-coreano negou à Reuters o envolvimento do país no ataque, depois de, no dia 6, a Comissão de Defesa Nacional norte-coreana ter negado também a autoria do ataque informático, que ainda assim classificava como um “acto justo”. The Interview fora descrita pelo regime norte-coreano, numa carta enviada ao secretário-geral da ONU em Junho, como “patrocínio não disfarçado de terrorismo, bem como um acto de guerra”.

O chefe de Estado norte-americano frisou: “Não podemos começar a mudar os nossos padrões de comportamento.” E lançou: “A Coreia do Norte perpetrou este ataque, o que diz algo de interessante sobre a Coreia do Norte.” E lembrou que na sua origem está “um filme satírico com... Seth Rogen e James Franco". "A noção de que era uma ameaça para eles dá-nos uma ideia de que tipo de regime estamos a falar. Causaram muitos estragos e responderemos. Responderemos proporcionalmente num local e num momento que escolheremos.”

Obama alertou ainda para uma realidade em que o mundo está ligado digitalmente e que este tipo de ataques pode afectar privados e o sector público, descrevendo a situação actual “tipo o Oeste selvagem". "E parte do problema é que temos Estados fracos que podem lançar este tipo de ataques [envolvidos também com agentes não associados a países], referiu o Presidente. 

Sony reage a Obama
O director executivo da Sony, Michael Lynton, já reagiu às palavras de Obama. Numa entrevista à CNN na noite desta sexta-feira, Lynton disse que “o Presidente, a imprensa e o público estão enganados sobre o que realmente aconteceu”.

“Não somos donos dos cinemas. Não podemos escolher se o filme é ou não exibido nas salas de cinema”, disse o director executivo da Sony, numa entrevista a Fareed Zakaria.

Lynton defendeu ainda que a Sony não “capitulou” e que sempre teve “o desejo de que público americano veja o filme”. E acrescentou, em sua defesa, que este “é o pior ataque informático alguma vez vistos nos Estados Unidos”. 

Já depois desta entrevista, um comunicado da Sony diz que a empresa começou “imediatamente à procura de vias alternativas para difundir o filme em plataformas diferentes”: "Esperamos que todos os que desejam ver o filme tenham essa possibilidade”, acrescenta o mesmo comunicado.

FBI confirma autoria norte-coreana
Na tarde desta sexta-feira, o FBI revelou as suas conclusões da investigação que desenvolvia desde dia 1 – o ataque iniciou-se a 24 de Novembro e identificou o Governo norte-coreano como autor do ataque. "A análise técnica ao malware [software malicioso] usado neste ataque revelou ligações a outro malware que o FBI sabe ter sido desenvolvido previamente por agentes norte-coreanos", foi dito. O FBI referiu ainda moradas IP, ferramentas e informações estruturais associadas anteriormente a outros ataques identificados com Pyongyang.

Classificando o ataque como "actos de intimidação" que visavam "suprimir o direito dos cidadãos americanos de se expressarem" e que causaram danos a uma empresa em solo americano, a agência de investigação federal diz que vai continuar a trabalhar num dos maiores ataques informáticos na história empresarial motivado por um filme sobre dois jornalistas que a CIA contrata para assassinar o líder norte-coreano Kim Jong-un. Esta sexta-feira, fontes governamentais citadas pela Reuters mencionavam possíveis ligações da China a este ataque, mas Obama negou a existência de provas nesse sentido.

A decisão que Obama agora identificou como "um erro", e que surgiu na esteira de muitos exibidores não difundirem o filme após ameaças aos espectadores que evocavam o 11 de Setembro, mereceu também muitas críticas de personalidades norte-americanas, da política às artes, sobre uma derrota da liberdade de expressão. Esta sexta-feira, o actor e realizador George Clooney revelou que fez circular uma petição de apoio à Sony pelos altos decisores de Hollywood e que “ninguém tomou essa posição” por “medo”. Vive-se num “novo paradigma e uma nova forma de gerir o negócio”, alertou em entrevista ao site Deadline.

Dias antes, a produtora New Regency e o estúdio Fox comunicaram que não vão distribuir o novo projecto do realizador Gore Verbinsky com o actor Steve Carell, que adapta a reportagem-BD Pyongyang, de Guy Delisle, na sequência deste caso.
 
Os hackers do grupo identificado como Guardians of Peace enviaram uma nova mensagem à Sony na noite de quinta-feira em que enalteciam a decisão de suspender o filme, tomada na quarta-feira, e na qual avisavam que os dados roubados seriam mantidos em segurança "a não ser que causem mais problemas”. Com Hugo Daniel Sousa 

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