O Teatrão no Brasil para contar como é a crise em Portugal
Digressão da companhia de Coimbra começa nesta sexta-feira em São Paulo e inclui programa paralelo de debates e oficinas.
Sim, ainda há os jornais (e uma língua comum simplificada, Acordo Ortográfico oblige, para ver se finalmente nos entendemos), e as notícias sobre a crise que mesmo depois da saída limpa enchem páginas que amanhã servirão para embrulhar peixe acabado de pescar (ou então a rede propriamente dita, de clique em clique). Mas depois há o teatro, e os que acreditam no poder que os actores em cima do palco têm de fazer das palavras a carne viva do passado, do presente e do futuro. É precisamente disso que se trata no caso desta digressão que uma companhia de Coimbra, O Teatrão, leva a partir desta sexta-feira, 24, ao Brasil, traduzindo a crise que abalou o país em linguagem paritária, porque é também de crise (social, política) que falamos quando falamos do Brasil.
Razão mais do que suficiente, acredita O Teatrão, para ir fazer o 25 de Abril do outro lado do Atlântico, com um programa que inclui a apresentação do três-em-um Conta-me Como É, estreado em Portugal pelos 40 anos da Revolução dos Cravos. Retrato do país por três jovens dramaturgos premiados (Jorge Palinhos, Pedro Marques e Sandra Pinheiro), o espectáculo encenado pelo crítico do PÚBLICO Jorge Louraço Figueira fica no SESC Bom Retiro, em São Paulo, até dia 26, e apresenta-se depois no Espaço Cultural Escola SESC, do Rio de Janeiro, a 2 de Maio, integrando o Festival Palco Giratório.
Paralelamente, O Teatrão promove uma série de actividades paralelas na Oficina Cultural Oswald de Andrade, também em São Paulo, que incluem uma mesa-redonda sobre A Arte da Crise (dia 25), reflectindo sobre os modos diferenciados como as perturbações económicas, sociais e políticas afectam os espectáculos de teatro na Europa do Sul e na América Latina, em Portugal e no Brasil, e, aproveitando a presença do cineasta Sérgio Tréfaut pelo país, mostra o seu Outro País (1999), recentemente reestreado depois de restauro digital — o documentário inaugural de Tréfaut é, de resto, uma das assumidas inspirações de Conta-me Como É. Um seminário de discussão e intercâmbio entre dramaturgos portugueses e brasileiros (5 a 7 de Maio) e uma oficina de dramaturgia para produção de textos inspirados numa das cenas do Terror e Miséria no Terceiro Reich, de Bertolt Brecht (29 e 30 de Abril), completam o programa das festas d'O Teatrão em São Paulo.
Já no Rio, haverá também uma oficina de dança com uma companhia de São Luís do Maranhão, o Núcleo Atmosfera, a partir de matrizes das danças populares e das suas possibilidades de reconversão para os pés e os corpos de dois países irmãos em tudo, até na crise.