O sentido da vida é o caos

Um filme menor do Monty Python Terry Gilliam, sátira negríssima fervilhante de ideias visuais e de misantropia niilista.

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O Teorema Zero parece demasiado uma releitura cerebral de um dos filmes anteriores de Terry Gilliam, Brazil

Terry Gilliam e o seu brique-a-braque surreal e bizarro é, já o sabemos há muito, um gosto adquirido — quem gosta gosta, quem não gosta não gosta, e o antigo animador dos Monty Python já se está a borrifar para conquistar novos adeptos. Prefere trilhar o seu próprio caminho de montanha-russa que lhe trouxe com o anterior Parnassus — O Homem que Queria Enganar o Diabo (2009) o seu melhor filme em muito tempo, mas que volta a dar um escorregão com este Teorema Zero, sátira escuríssima sobre o mundo moderno que parece demasiado uma releitura cerebral de Brazil (1985). É, outra vez, uma história de uma abelhinha obreira, rodinha numa engrenagem gigantesca, que o acaso dá por si a aceder por acidente ao “outro lado do sonho” (para citar o título português de Brazil): um programador misantropo, agorafóbico e provavelmente psicótico é encarregue de provar um teorema que pode demonstrar a futilidade da existência humana, a mando de um executivo com motivos ulteriores.

O Teorema Zero é um filme sobre o sentido da vida (para citar uma das obras seminais que Gilliam assinou com os Monty Python), e encontrou em Christoph Waltz o actor ideal para o seu homem-robô que reaprende a ser humano enquanto busca destruir as ilusões da humanidade. Mas a dimensão niilista, desesperada, que vem ao de cima neste mundo onde os sentimentos não são sinceros ejecta o lado fluorescente de conto de fadas que fez os melhores filmes do realizador, para ficar apenas um núcleo negro de escuridão e alienação. Tal como o teorema que lhe serve de centro, é um paradoxo feito filme — um exercício de fervilhante invenção visual low-budget onde (para citar um Lars von Trier que não é descabido lembrar aqui) “o caos” (narrativo e não só) “reina”, onde o sarcasmo e a desilusão do cineasta vêm ao de cima com uma virulência que chega a ser desagradável. É um Gilliam menor, onde continua a haver mais ideias por fotograma do que na maioria da concorrência, mas cujo travo ácido praticamente só convencerá os apreciadores do realizador.  

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