O museu é um lugar onde coisas acontecem

Serralves acolhe este fim-de-semana a segunda edição da iniciativa O museu como performance. Dez criações de artistas de seis países mostram como um museu é, hoje, um lugar de muitas artes, em estado de fluxo permanente.

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Future friends/Ships DR
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Performance de Cally Spooner DR
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Ensemblez/i> DR
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Gentileza de um gigante DR
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Gramophone topologies DR
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Corda duracional DR
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Face of another DR

Os britânicos Sally Golding & Spatial (Matt Spendlove), uma cineasta e um músico, vão criar dois momentos “óptico-sónicos” de imersão sensorial e hipnótica (Face of an other). Ramiro Guerreiro propõe dois trabalhos: Portfolio – la Pubblicita e J.W. Thorning em Chamarande. O primeiro, criação pensada expressamente para a Biblioteca de Serralves, é um livro de pintura de grandes dimensões que o público é convidado a folhear; J.W. Thorning é um artista que não consta dos manuais da História da Arte, mas que terá deixado – ou talvez não – o seu nome inscrito num castelo nos arredores de Paris, hoje transformado em centro de artes.

Outro português, Pedro Lopes, músico experimental, pôs agora de lado o gira-discos e dá-nos a ouvir Gramaphone topologies, o histórico precursor dos actuais meios técnicos de gravação. A inglesa Cally Spooner, com a colaboração da soprano Veronika Bennin, analisa os discursos da cultura contemporânea, desde o recital clássico ao musical da Broadway, em Damning evidence illicit behaviour seemingly insurmountable great sadness terminated in any manner.

A dupla brasileira Quarto (Leandro Zappale & Anna Mesquita) testa a resistência de uma corda com o comprimento de mil metros (Corda duracional). Também vindo do Brasil, Gustavo Ciríaco, em colaboração com Ana Trincão & Tiago Barbosa, cruza as artes plásticas com o teatro transportando os espectadores para um mundo em miniatura (Gentileza de um gigante).

A australiana Mel O’Callaghan, radicada em Paris, apresenta Ensemble, uma performance sobre a reacção de um homem à violência exercida sobre o seu corpo, aqui expressa na luta contra três bombeiros empunhando uma mangueira de incêndio. Finalmente, Jassem Hindi (Arábia Saudita), Keith Hennessy (Canadá) e Eoghan Ryan (Irlanda), três “oráculos amadores”, enfrentam a loucura do mundo contemporâneo com poesia “anarco-queer” (Future friend/ships).

Todas estas coisas vão acontecer, este fim-de-semana, em Serralves, no Porto. Porque um museu é “cada vez mais um lugar onde coisas acontecem”, dizem Cristina Grande, Pedro Rocha e Ricardo Nicolau, os três comissários de O museu como performance, iniciativa lançada no ano passado com o objectivo de mostrar como a performance vem conquistando um lugar e uma importância cada vez maiores no contexto da arte contemporânea.

Ricardo Nicolau, curador que este ano se associa pela primeira vez à equipa responsável por este programa, explica ao PÚBLICO que o alinhamento deste ano, depois do sucesso da primeira edição, mostra como o museu do nosso tempo “continua a apostar em propostas híbridas” e, no caso de Serralves, a “activar os diferentes espaços do museu e do parque”, e a desafiar os artistas a responder ao contexto específico do lugar onde vão actuar.

Nesse sentido, muitos dos projectos que agora serão mostrados e que não são inéditos “ganham expressões e leituras diferentes porque são apresentados em contextos diferentes”, acrescenta Ricardo Nicolau, um crítico e comissário de artes plásticas cuja entrada na equipa responsável por O museu como performance significa também – sublinha o próprio – “que as artistas visuais estão a usar a performance nos seus programas”.

No texto em que apresentam e justificam o programa da segunda edição deste projecto – que sucede, mas sem o substituir, ao desaparecido festival Trama, cuja última edição ocorreu em 2011, e que para além de Serralves envolvia toda a cidade do Porto –, Ricardo Nicolau, Cristina Grande (dança) e Pedro Rocha (música) realçam precisamente o facto de os programas seleccionados se relacionarem “directamente com os espaços em que são experienciados, tendo em consideração o contexto do museu – os seus sentidos multiplicam-se consoante as particularidades das salas e lugares do parque onde são apresentados”.

É assim que, este sábado, a partir das 15h00, e até ao final do dia de amanhã, os visitantes da fundação – pagando apenas o bilhete normal de ingresso no museu – vão poder ser surpreendidos com performances mais ou menos inesperadas – e algumas delas apresentadas mesmo como “inquietantes” (Mel O’Callaghan) –, entre as salas de exposição do museu, a biblioteca, o auditório e o foyer, e ainda o parque. Espaços que, nestes dois dias, vão perder a sua aparência usual para serem “ocupados por trabalhos que apelam a outros sentidos, revelando arquitecturas invisíveis e abalando o normal fluxo do tempo da visita do museu”, prometem os curadores.

Um museu que, deixando de ser espaço de mera contemplação, se torna cada vez mais "um lugar onde coisas acontecem, espaço em estado de fluxo permanente”. Um museu em permanente performance.

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