O dinossauro e o bebé

Hitchcock/Truffaut é o tributo a um livro que é imprescindível para uma aproximação à maneira de ver e pensar do tortuoso autor de Psico.

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Espectadores rodados e neófitos têm aqui motivos suficientes de satisfação
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O livro resultante do encontro entre François Truffaut e Alfred Hitchcock – que em Portugal, numa edição da Dom Quixote em 1987, se chamou Hitchcock – Diálogo com Truffaut – é um ponto absolutamente fundamental numa bibliografia de cinema, de que é por certo um dos cinco ou seis maiores livros alguma vez publicados (ao mesmo tempo é história, é crítica, é biografia), e por maioria de razão um documento imprescindível para uma aproximação à maneira de ver e pensar desse tortuoso indivíduo que foi o autor de Vertigo ou de Psico. O filme de Kent Jones, há décadas um dos mais relevantes críticos americanos, é um tributo ao livro, que foi originalmente publicado em 1966, e ao seu papel na formação de inúmeros cinéfilos e autores de cinema das gerações subsequentes. A representá-las aparece uma boa selecção de realizadores, sobretudo americanos, indivíduos a que se reconhece, goste-se mais ou menos dos filmes que fazem, uma prática e um pensamento próprios: entre outros David Ficher, Martin Scorsese, James Gray, e muito breve e simbolicamente Peter Bogdanovich (que foi, pelo seu trabalho com John Ford ou Orson Welles, uma espécie de “continuador” americano de Truffaut). Alguns dos melhores momentos de Hitchcock/Truffaut vêm das suas observações, sobretudo quando comentam cenas e momentos precisos dos filmes de Hitchcock e ao olhar de espectador que também é o deles se sobrepõe o olhar dos cineastas que são (e nesse sentido é mesmo muito bom o que James Gray diz de duas cenas de Vertigo, por exemplo).

Kent Jones deixa as coisas confundirem-se, o que não é necessariamente mau mas retira ao filme um centro forte – e às tantas não é claro se o seu trabalho é sobre o livro, ou sobre o cinema de Hitchcock em geral, ou sobre a relação pessoal entre o cineasta anglo-americano e crítico-cineasta francês. O que confere a Hitchcock-Truffaut, na maior pecha que lhe podemos apontar, uma vagueza estrutural que faz pensar nele como um super-extra de uma edição DVD (e a outra pecha, já agora, é o relativo subaproveitamento dos registos concretos do encontro entre Hitch e Truffaut, das fotos às gravações sonoras, ainda que se mostrem documentos escritos dos contactos entre os dois, quer prévios quer posteriores ao encontro, que são bem significativos). Nada que obste ao enorme interesse, nem que seja “didáctico”, que um filme como este representa, e que o torna imprescindível para os espectadores rodados como para os espectadores neófitos. Todos encontrarão motivos suficientes de satisfação.

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